A CORPORATOCRACIA EM AÇÃO
por André Luz
Depois de ler essa reportagem e tomar consciência desse fato, o filme “O Que Você Faria?” não parece assim tão absurdo. Embora algumas situações retratadas na obra sejam realmente exageradas (como o sexo no banheiro e as agressões físicas) e os personagens beirem o estereótipo, não existe ali compromisso com a realidade, mas sim com a construção de uma metáfora à loucura que tomou conta hoje do meio empresarial, especialmente das grandes corporações, onde a busca pelo lucro a qualquer preço e a exploração da mão de obra virou obsessão, com raríssimas e nobres exceções.
A verdade é que vivemos hoje numa ditadura do mercado, que alguns chamam ironicamente de “corporatocracia”, na qual a ordem mundial é dominada por meia dúzia de mega-empresas transnacionais que pairam acima de governos e estados democráticos, restando à grande maioria dos cidadãos alugarem suas forças de trabalho a elas em troca da sobrevivência diária.
“O Que Você Faria?”, uma co-produção entre Espanha, Argentina e Itália, mostra exatamente o processo de seleção para um alto cargo de direção de uma dessas multinacionais. Sete candidatos à vaga são reunidos em uma mesma sala para participarem da última etapa do processo, do qual apenas um restará. Neste ambiente inóspito, serão submetidos a um certo “método Grönholm”, que basicamente incitará os piores instintos de cada candidato na tentativa de eliminar os concorrentes.
O clima de paranóia é dobrado com a possibilidade de um deles ser um impostor, ou seja, alguém da empresa infiltrado na sala para observar mais de perto e manipular a ação dos outros. E tudo ainda pode estar sendo gravado com câmeras e microfones ocultos, numa assertiva alusão à sociedade “Big Brother” para a qual caminhamos cada dia mais, onde tudo e todos são constantemente monitorados e vigiados, e aos grotescos programas do tipo "O Aprendiz".
A intenção do roteiro de Mateo Gil e Marcelo Piñeyro, que é baseado em peça teatral de Jordi Galcerán, vai se tornando óbvia a partir que a trama avança e as primeiras vítimas do processo absurdo e degradante vão sendo feitas.
Quem já possui uma visão crítica acerca da atuação desumana das transnacionais e do auto-destrutivo modelo neoliberal certamente vai se deleitar com a abordagem extremamente ácida e demolidora da obra, que melhora ainda mais com uma segunda leitura, quando já conhecemos melhor os personagens e o que cada um deles representa dentro do contexto em que estão inseridos.
Ironicamente, em paralelo à ação principal do filme, acontece uma grande manifestação nas ruas de Barcelona contra a atuação nefasta do FMI e do Banco Mundial sobre a economia global, sob o jargão de que "um outro mundo é possível". Por enquanto ainda é. Não se sabe até quando...
Cotação: * * * *
por André Lux - fonte: Blog Tudo em Cima
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