quinta-feira, 17 de abril de 2008

Entre o udenismo e o adesismo

Por Alon Feuerwerker - alon.feuerwerker@correioweb.com.br

Coluna (Nas entrelinhas) publicada hoje (15/04/2008) no Correio Braziliense.

Com o esgotamento do udenismo, o adesismo pode até parecer uma rima atraente. Mas (com a licença de Drummond) dificilmente conseguirá ser solução.


A fraqueza dos líderes, os maus conselhos e os maus sentimentos levaram a oposição brasileira ao atual estado de debilidade, hoje já admitido por ela própria. Os partidos que lutam contra o governo de Luiz Inácio Lula da Silva parecem ter decidido dar um tempo para discutir sua relação com o eleitor. Estão premidos por uma realidade incontestável: a cada dia que passa o governo fica mais forte e os adversários, mais fracos.

Há muitas razões para a anemia atual do PSDB e do Democratas. Várias delas vêm sendo expostas neste espaço nos últimos anos. Ganha um doce quem conseguir explicar, em poucas palavras, no que um Brasil governado por democratas e tucanos seria essencialmente diferente do atual. Para melhor, é claro. Se nem os líderes da oposição conseguem responder a essa simples indagação, muito menos o eleitor comum.

Outro problema é a dependência excessiva dos escândalos. Como tudo é motivo para escândalo, o feitiço acaba se voltando contra o feiticeiro. Se o escândalo passa a ser rotina, deixa de representar novidade, deixa de ser assim tão escandaloso. Com o tempo, a situação se inverte, e a oposição debilitada por sucessivas batalhas deixa de ter forças para responder adequadamente aos escândalos mais dignos desse nome. Um bom exemplo é o caso do dossiê ilegalmente produzido no Palácio do Planalto com informações sigilosas sobre gastos do então presidente Fernando Henrique Cardoso.

O vetor principal, entretanto, é mesmo o programático. A ausência de alternativas programáticas leva a oposição a deixar passar todas as boas oportunidades. Na reforma agrária, por exemplo, o governo Lula é um fiasco. Mas você não ouviu falar de um único discurso de algum membro da oposição para cobrar resultados nessa área. Nem de qualquer esforço de tucanos ou democratas para buscar diálogo com os movimentos sociais no campo.

Ainda na questão fundiária, é ensurdecedor o silêncio da oposição diante da irracional demarcação contínua da reserva indígena Raposa/Serra do Sol. Nesse caso, o vácuo político é tão absoluto que a voz mais importante a se levantar contra a renúncia do país ao controle de suas próprias fronteiras foi a do comandante militar da Amazônia. Que o fez por dever de ofício. E também porque não há senador ou deputado oposicionista que se digne a tomar um avião para Roraima para, pelo menos, saber do que ocorre por lá.

Qual é a contribuição da oposição ao debate sobre a deterioração das contas externas do país? O que pensa ela sobre as críticas cada vez mais intensas e planetárias contra o sonho delirante de Lula de usar as terras agricultáveis do Brasil para ajudar abastecer a frota americana de carros de passeio, enquanto o preço da comida explode em todo o mundo graças, como admitiu o próprio presidente, à insuficiente oferta de alimentos? Novamente o silêncio.

Pior. A oposição às vezes se enrosca quando decide sair de seu sono sepulcral para dar o sinal da graça. Foi o que se passou na votação da prorrogação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). Com a vitória nas mãos, com a possibilidade de apadrinhar o maior investimento em saúde pública jamais visto no país, Democratas e PSDB preferiram a vitória de pirro. Optaram por derrubar a CPMF, na suposição de que a perda de receitas criaria grandes dificuldades ao governo. Erraram, pela enésima vez...

Escrevi no começo desta coluna sobre a fraqueza dos líderes, os maus marqueteiros e os maus sentimentos. Falta falar do último aspecto. A oposição não se conforma com o fato de o governo Lula apresentar belos resultados na economia e no combate à pobreza. O ressentimento fica nítido cada vez que alguém da oposição abre a boca para “explicar” que nessas áreas o PT “apenas copiou” os governos anteriores. Simplesmente não é verdade. Lula aplicou um ajuste fiscal estrutural que FHC jamais quis — ou pôde- fazer. E não há como comparar monetariamente os programas sociais do tucano com os atuais. Na economia, diferenças quantitativas são também qualitativas. Toda dona-de-casa e todo trabalhador sabem disso.

Eis o cenário. O risco agora parece vir de uma direção nova. Esgotada por anos de discurseira monótona e derrotas, a oposição pode ficar tentada a simplesmente reconhecer que o governo Lula é mesmo bom e a cair nos braços do ex-sindicalista. Uma parte dela já fez isso na transição do primeiro para o segundo mandato. Será uma pena, porém, se as coisas acabarem assim. Esgotado o udenismo, o adesismo pode até parecer uma rima atraente. Mas (com a licença de Drummond) dificilmente conseguirá ser solução.

Fonte: Blog do Alon

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