quinta-feira, 24 de abril de 2008

A adesão incondicional

por Mino Carta

Os índices de aprovação do governo fermentam, mas, diria Ibrahim Sued, os cães ainda ladram. Diminui o fervor midiático em torno do famoso dossiê e logo não falta quem informe, qual fosse verdade factual, que Lula está a ser tentado pela idéia do terceiro mandato.

Não há, a bem da verdade, uma única, escassa razão para acreditar que a “informação”, mesmo como hipótese, seja viável. Trata-se de insinuações atiradas ao vento, na inesgotável pretensão de abalar o prestígio do ex-metalúrgico que virou presidente da República.

Algo aconteceu, porém, e mudou a crença popular de que o supremo manda-chuva tem de ser bacharel e usar gravata até de pijama. Não faz muito tempo. Foi quando o Sapo Barbudo, na definição de Leonel Brizola, foi eleito pela primeira vez. A identificação com a maioria dos brasileiros deu-se como a manga nasce da mangueira, favorecida por alguns fatos que a mídia, tadinha, não pode negar. O homem é bom, muito bom de comunicação, e está longe de carecer de carisma.

A minoria privilegiada repete as frases feitas que os jornalistas e seus patrões lhe põem na boca, enquanto a maioria dos brasileiros forma a caravana, e passa ao largo, indiferente. Se os canhões de Francis Drake fossem tão eficazes quanto as nossas baterias midiáticas, ele não passaria de pescador de arrastão.

A caravana percorre seu caminho sem dar ouvidos e olhos ao jornalismo nativo, e também sem questionar se o governo cuida a contento dos seus interesses. Há qualquer coisa de automático nesta adesão incondicional, nesta aceitação robótica.

Do ponto de vista de CartaCapital, a atuação governista merece críticas profundas e reparos constantes. O próprio Lula, impávido, não pratica inúteis hipocrisias e não vende fumaça. Declara-se presidente dos pobres, reconhece, contudo, que seu governo foi melhor para os ricos.

Com Bolsa Família e tudo. Provoca as críticas de quem acredita ser o Bolsa Família adequado para comprar mais arroz e mais feijão em lugar de eletrodomésticos, mas não é solução para o monstruoso desequilíbrio social que assola o País. E isto é do conhecimento até do mundo mineral.

Está claro que a mídia não conseguiu até agora entender como ocorre esta identificação orgânica entre Lula e seu povo, sempre paciente demais, resignado demais, é bom sublinhar. O que pergunto aos meus perplexos botões é se o presidente se dá conta do fenômeno. Caso se desse, não resultaria desta percepção uma política social mais ousada, mais corajosa?

Fonte: Carta Capital
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