quarta-feira, 30 de abril de 2008

PASTOR TENTA TRAZER DE VOLTA "BLACK POWER" E COLOCA BARACK OBAMA NA ENCRUZILHADA

por Luiz Carlos Azenha

WASHINGTON - Os americanos nos "venderam", culturalmente, uma série de bobagens. Muitas foram entregues no pacote do politicamente correto, que aqui está sendo, graças aos céus, destruído pela turma do South Park, pelo comediante (negro) Chris Rock e pela turma cética em relação ao moralismo da patrulha comportamental.

Nós somos compradores da "auto-estima". Qualquer coisa no Brasil, hoje, é reduzida a um problema de auto-estima. Câncer? Auto-estima. Não passou no vestibular? Auto-estima. Atropelado no trânsito? Auto-estima. Essa enganação é uma forma de atribuir, ao indivíduo, a responsabilidade pela resolução de problemas que são sociais e que ele, sozinho, jamais vai conseguir resolver. É uma forma perversa de desmobilizar a sociedade, como se os indivíduos pudessem tudo, como se a força deles não estivesse na organização que se pretende esvaziar.

Não devemos, porém, confundir o self-service, o self-esteem e o self-help com o que as igrejas negras americanas chamam de self-reliance. Essa palavra é chave para entender o renascimento, nos Estados Unidos, da Teologia da Libertação Negra, a vertente do cristianismo que foi trazida de volta ao debate depois do escândalo envolvendo o reverendo Jeremiah Wright e a igreja da qual faz parte o candidato Barack Obama.

Podemos dizer que, dentro do protestantismo americano, as igrejas negras hoje estão divididas entre aquelas que propõem respostas pessoais para problemas comunitários e outras que promovem a organização social, a exemplo do que fez a Teologia da Libertação na América Latina. Essas igrejam adotam a Teologia da Libertação Negra.

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NAS OLIMPÍADAS DE 1968, NO MÉXICO, OS ATLETAS AMERICANOS TOMMIE SMITH E JOHN CARLOS FIZERAM UM PROTESTO SILENCIOSO, GESTO QUE SE TORNOU SÍMBOLO DO BLACK POWER

Self-reliance, nesse contexto, é a responsabilidade que cada fiel tem de assumir para transformar o mundo em que vive, através de ações políticas e sociais. É a independência do governo, o cuidado com os seus e com a comunidade. O pastor Wright decidiu que não vai mais ficar calado. Abandonou a aposentadoria para dar uma série de entrevistas nos últimos dias. É, de longe, o assunto com o maior potencial para afetar a campanha presidencial de Barack Obama.

Posando ao lado de dirigentes da Nação do Islã - num ecumenismo que os brancos foram incapazes de promover - o reverendo Wright defendeu a afirmação que fez de que os atentados de 11 de setembro de 2001 foram "a volta das galinhas para ciscar em casa", ou seja, uma resposta terrorista à violência terrorista praticada pelo estado americano em outros países.

Os colunistas americanos - inclusive os negros - logo correram para sentar a pua no reverendo, que taxaram de extremista. Jeremiah Wright foi além: disse que Obama só assumiu a postura que assumiu por ser político, ou seja, fez o que todo político faria em campanha eleitoral. Isso é um golpe pesado em um candidato que diz fazer política "diferente" dos outros.

Obama ficou (sem intenção de trocadilho) entre a cruz e a calderinha. Ele tem pela frente, no dia 6 de maio, duas prévias em estados bastante distintos. Na Carolina do Norte, depende de apoio maciço dos negros para vencer. Em Indiana, não pode embarcar na polarização racial. Se Obama atacar o reverendo que oficiou seu casamento e batizou suas filhas perde votos na Carolina. Mas, se não se distanciar de Wright, corre sério risco de perder votos de eleitores brancos, sem os quais não consegue vencer em Indiana.

Wright parece convencido de que o mais importante agora é reviver o movimento negro americano, apostar no Black Power do século 21. Desde o episódio do Katrina a classe média negra americana está em ebulição. Foi a "descoberta" concreta de que as leis mudaram, sim, os negros avançaram como nunca, mas ainda hoje são a grande maioria entre os pobres, os presos, os assassinos e os assassinados.

Fonte: Vi o Mundo


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