segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Recesso de fim de ano! Deixo com vocês duas frases da série Benditas Palavras!

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Férias é não ter nada o que fazer e ter todo o dia para fazer isso.
(Robert Orben)


O bom é não fazer nada e descansar depois.
(Provérbio Espanhol)


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domingo, 21 de dezembro de 2008

O FALSO ARGUMENTO NA QUESTÃO DAS COTAS

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por Luiz Carlos Azenha


Eu passei a me interessar pela África graças à Conceição Oliveira, uma das editoras-itinerantes deste site. Desde então mergulhei nos assuntos africanos. Com grande prazer acabo de ler "A Manilha e o Libambo", de Alberto da Costa e Silva.

No Brasil, neste momento, trava-se um debate sobre as cotas para negros. Há os que querem que elas sejam impostas pelo governo federal. E os que as rejeitam completamente, argumentando que as cotas deveriam ser sociais, não raciais, e que não devemos "racializar" o debate, que essa "racialização" é um importação indevida de modismos dos Estados Unidos e que só vai aprofundar a cisão racial no Brasil.

Eu diria a vocês que essa "racialização" já existe. E que muitos dos que se opõem a qualquer tipo de ação afirmativa na verdade acabam defendendo a manutenção de um status quo injusto, em que a mulher negra está na escala mais baixa da pirâmide que tem no topo os homens brancos.

Pessoalmente acho que as cotas não devem ser impostas de cima para baixo, pelo governo federal, como se fossem a cura para todos os males. Acredito em ações afirmativas de baixo para cima, adotadas por instituições públicas e privadas, no feitio do que já fazem diversas universidades brasileiras.

Elas enfrentam um combate duro patrocinado pelos neocons brasileiros, que se reúnem em torno da revista Veja e da TV Globo -- de Ali Kamel a Reinaldo Azevedo, de Demétrio Magnoli a Diogo Mainardi. É um país curioso, o Brasil. Na matriz, os neocons são um fenômeno dos anos 80. Mas aqui, na filial, só ganharam algum status já no século 21. É mais uma demonstração do atraso de nossa elite.

Aliás, não é de hoje que os intelectuais prestam serviço a causas pouco nobres, fornecendo os argumentos para a manutenção de injustiças sociais como a escravidão. O próprio Alberto da Costa e Silva encerra o seu livro com um capítulo que deveria ser leitura obrigatória. Segue um trecho:

No fim do século 17, ao se falar de escravo, pensava-se em negro. Ficara para trás o tempo em que nas listas da escravaria do sol da Europa tinham destaque árabes, armênios, berberes, búlgaros, circassianos, eslavos, gregos e turcos, e em que os negros eram minoria nas populações escravas das Américas. Quase duzentos anos antes, já se tornara incomum encontrar-se nos espaços dominados pela Europa um escravo branco que tivesse vindo de terras cristãs ou, melhor, que fosse europeu.

[...]

Além de negros, não era invulgar, no Portugal quinhentista, encontrarem-se em cativeiro árabes, berberes e turcos. Havia também, ainda que em número bem menor, indianos, malaios, chineses e ameríndios. Estes últimos eram poucos, porque adoeciam com facilidade ou, deprimidos, se suicidavam. Quanto aos asiáticos, a Coroa lhes limitava a importação, para não ocuparem um espaço que seria melhor empregado, nas naus da Índia, com pimenta, canela, cravos, sedas, lacas e outras mercadorias mais valiosas.

[...]

Tal qual sucedera, a partir do século 10, no mundo islâmico, o negro foi-se tornando, ao avançar o Seiscentos, no sul da Europa e na maior parte das Américas, o escravo por excelência. De um "outro" entre os "outros", passou a ser considerado uma espécia humana distinta, inferior à branca e predestinada a serví-la. Repetiram-se entre os europeus -- e não como enredo de farsa, mas novamente como urdidura de tragédia -- todos os argumentos que os árabes haviam esgrimido para justificar a escravidão dos pretos. Ressuscitou-se, possivelmente a partir da versão muçulmana, o falso anátema de Noé contra os filhos de Cam -- falso porque lançado claramente contra apenas um deles, Canaã, e não contra Cuxe, de quem descenderiam os africanos. Noé os amaldiçoara: os seus descendentes seriam escravos e negros -- e escravos porque negros.

Foram reforçando-se, um a um, os estereótipos a partir dos quais se construiria toda uma ideologia racista: os pretos eram curtos de inteligência, indolentes, canibais, idólatras e supersticiosos por natureza, só podendo ascender à plena humanidade pelo aprendizado na servidão.

[...]

Esse tecido ideológico vestia a necessidade que tinha a expansão européia de mão-de-obra abundante. Já no começo do Quinhentos, em muitas partes da América, os aborígenes diminuíam rapidamente de número, vítimados pelas guerras e razias, pelo excesso de trabalho e pelas doenças trazidas pelos conquistadores, e se mostravam difíceis de escravizar, ou porque podiam facilmente refugiar-se nas funduras dos sertões e ali resistir pelas armas, ou porque se abrigavam sob a proteção dos jesuítas e de outras ordens da Igreja. As regiões balcânicas e à volta do mar Negro, até então a maior fonte de escravaria para a Europa e o mundo islâmico, tinham sido fechadas aos europeus pelos otomanos, na metade do Quatrocentos.

[...]

Em contraste, as costas da África subsaariana apareciam como uma fonte quase inesgotável de escravos.

*****

Pelo que escreve o autor do livro, não houve falta de gente a fornecer os argumentos necessários para justificar a escravidão. Assim como não faltam, hoje, aqueles que acreditam que basta investir na educação para superar o verdadeiro abismo de renda que existe entre os homens brancos e as mulheres negras na sociedade brasileira.

Quando eles dizem que é um risco "racializar" o debate estão brandindo um argumento falso. Por mais que a gente disfarce a sociedade brasileira é "racializada", com os homens brancos no topo e as mulheres negras na base da pirâmide de renda, de acordo com números do IPEA. Estou entre os que acreditam que o estado brasileiro deve fazer algo a respeito.

Fonte: Vi o Mundo

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Quem Lula deve escolher para substituir Ellen Gracie?

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Teixeira e Machado: o Supremo não pode dispensar o saber jurídico deles

Teixeira e Machado: o Supremo não pode dispensar o saber jurídico deles


por Paulo Henrique Amorim

. A ministra Ellen Gracie do Supremo Tribunal Federal vai para a Organização Mundial do Comércio, a OMC.

. Ela queria mais.

. Tentou ser ministra da Corte Internacional de Haia, mas não passou no exame da Ordem.

. Provavelmente, porque, hoje, se exige dos juízes que saibam deslacrar Discos Rígidos – ingrediente essencial no combate ao crime organizado.

. É indispensável deter um conhecimento mínimo sobre o Windows.

. (O Presidente Supremo Gilmar Mendes, por exemplo, não acredita na internet. Pensa que é coisa de Lúcifer.)

. E, como se sabe, a Ministra se recusou a abrir o Disco Rígido que a Polícia Federal (nos tempos do ínclito delegado Paulo Lacerda) achou no Banco Opportunity, na Operação Chacal.

. A Ministra de feições suaves e lábios diminutos, com a delicadeza que a caracteriza, defendeu tese singular: não podia abrir os discos de Daniel Dantas, porque Daniel Dantas não é Daniel Dantas, mas, sim, Daniel Dantas.

. (No momento, a Polícia Federal que passou a proteger Daniel Dantas e o PT tem 12 HDs encontrados na parede falsa do apartamento de Daniel Dantas; um HD do provedor do Banco Opportunity; e o conteúdo da mochila que estava em cima da mesa da sala de jantar, quando Daniel Dantas se preparava para fugir. E a nova, renovada Polícia Federal do Ministro Abelardo Jurema também não consegue deslacrar os discos rígidos. Uma questão, também, de tecnofobia …)

. A Ministra teve que se contentar com a OMC.

. Vai tratar de suco de laranja, cota de exportação de banana da América Central e amianto (não, desculpe, caro leitor, amianto é com o Supremo Presidente Gilmar Mendes.)

. A carreira de Ministro do Supremo no Brasil transformou-se, com a degradação dos costumes, num pit-stop.

. Francisco Rezek, como Ministro do Supremo, presidiu a eleição de Fernando Collor, que o fez Ministro das Relações Exteriores(?), voltou ao Supremo (?) e, como Ministro do Supremo, saiu a correr para a Corte Internacional de Haia.

. Nelson Jobim, o Ministro serrista que plantou a prova contra Paulo Lacerda, saiu do Supremo a correr para qualquer cargo próximo de um (qualquer) Presidente da República.

. Conseguiu no Governo Lula o cargo de Ministro de Tudo.

. Gilmar Mendes usou a sua máquina de propaganda e o PiG para se tornar o Supremo Presidente, o Grande Inquisidor, Presidente da República, Presidente do Legislativo, Governador de Mato Grosso ou Prefeito de Diamantino.

. (Quem paga a agência de relações públicas, o image builder de Gilmar Mendes e convoca a imprensa sempre que ele vem a São Paulo? Existe uma Agência Especial de Propaganda para servir o Ministro? Se existe, quem paga? Quem paga as ligações? Você, contribuinte?)

. Ellen Gracie quer ser Ministra – fora do Brasil.

. Uma aspiração provinciana que se deve respeitar numa senhora tão suave e de lábios tão diminutos.

. Portanto, Lula vai ter a oportunidade de escolher o oitavo ministro de uma Corte de onze.

. Ele já tem sete em onze e conseguiu construir a Corte mais conservadora do Brasil, desde os anos militares.

. Márcio Thomaz Bastos e Nelson Jobim é que nomearam os ministros de Lula. .

. O PT chegou ao poder sem ministro da Fazenda, presidente do Banco Central, chefe de Polícia, ministro da Justiça ou ministros do Supremo …

. Só podia dar no que deu …

. A Bancada Jobim no Supremo só perde para a de Lula: Gilmar Mendes, Ellen Gracie e Carlos Alberto Direito.

. Direito também tem uma aspiração pós-Supremo: ser o Chefe da Congregação para a Doutrina da Fé e promulgar o Índex.

. E, quem sabe, suceder Bento XVI.

. Jobim é amigo do ex-cunhado e sócio de Dantas, o “Dr” Carlinhos Rodemburg.

. Jobim chamou o líder da Bancada Dantas no Congresso, o Senador Heráclito Fortes, e pediu a Fortes que avisasse ao “Dr” Carlinhos que os investimentos de Dantas na Amazônia poderiam causar problemas.

. Marcio Fortes participou de um histórico jantar na casa de Fortes – sempre Fortes, em Brasília.

. A Veja, a última flor do Fáscio, publicou reportagem escrita a quatro mãos – duas de Dantas e duas de Marcio Aith – para provar que o Presidente Lula e o ínclito delegado Paulo Lacerda tinham conta secreta no exterior.

. A Veja chegou às bancas de Brasília na segunda.

. Na quarta feira à noite, na casa de Fortes, em torno de pratos da culinária árabe, reuniram-se Fortes, Dantas, os deputados petistas Sigmaringa Seixas e José Eduardo Cardozo.

. E quem mais?

. O então Ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos.

. Thomaz Bastos foi lá para ouvir de Dantas que não era o autor da “reportagem” encontrada na vala negra que corta a redação da Veja.

. Depois, a Veja disse que os autores eram ele, sim: ele, Dantas, e Aith.

. É do escritório de Bastos um dos advogados que processa Mino Carta em nome de Dantas.

. Quer dizer, está tudo em casa: Jobim, Dantas e Bastos.

. E Lula.

. Assim sendo, o Conversa Afiada, por sugestão de um caro amigo leitor, resolveu fazer uma lista de insignes juristas que Lula, Bastos e Jobim poderiam escolher para substituir Ellen Grace:

. Nélio Machado;

. Chico Müsnich;

. Sérgio Bermudez;

. Luis Cantidiano;

. O “Gomes”;

. Otavio da Motta Veiga;

. Alberto Zacharias Toron;

. José Dirceu (ou ele, cassado, não pode?);

. Wilson Mirza (esse tem a vantagem de falar direto com Ali Kamel, o homem forte da Globo);

. Arnold Wald;

. e Roberto Teixeira, o amigo do Presidente, “o homem certo no lugar certo na hora certa”, a quem o autor dessas modestas linhas conhece desde os tempos em que trabalhou na TV Bandeirantes (ele e o Presidente Lula sabem por que …).

Fonte: Conversa Afiada

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Presidente Serra vai revogar a CLT por Medida Provisória

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Afif e Agnelli: eles são apenas a vitrine. Serra é quem quer...

Afif e Agnelli: eles são apenas a vitrine. Serra é quem quer...


por Paulo Henrique Amorim

Em nenhuma democracia séria do mundo, jornais conservadores, de baixa qualidade técnica e até sensacionalistas, e uma única rede de televisão têm a importância que têm no Brasil. Eles se transformaram num partido político – o PiG, Partido da Imprensa Golpista

. Um amigo leitor do Conversa Afiada chamou a atenção para uma interessante notícia, que, segundo ele, não mereceu a devida atenção do PiG.

. O projeto de Afif Domingues, ministro do Emprego (?) do Presidente Eleito José Serrágio (de pedágio, os mais altos do Brasil) de acabar com a CLT, por Medida Provisória.

. (Isso me faz lembrar da proposta de outro campeão do PiG, Roberto Campos: na fase mais equivocada da sua vida, quando tentou ser político, pregou num palanque a extinção do 13º. Salário. Depois, se arrependeu e pediu a cabeça do repórter do Jornal do Brasil que cobriu o comício. O Serrágio costuma fazer o mesmo…)

. Conta um ex-deputado federal que, um dia, enquanto esperava um taxi na saída subterrânea da Câmara, viu aproximar-se um taxi vazio.

. Isso, um taxi vazio, que inexplicavelmente se dirigia ao ponto em que ele estava.

. Qual não foi a surpresa desse deputado quando viu sair do taxi vazio, quem?

. O Guilherme Afif.

. Afif é isso.

. Passageiro de um taxi vazio.

. E ser Ministro do Emprego diz muita coisa sobre o Governo do Presidente José Serrágio.

. É como nomear o Daniel Dantas para Ministro da Justiça.

. Ou Marcelo Itagiba para Diretor Geral da Polícia Federal …

. Ou Marcio Fortes (o do Rio) para a Imprensa Nacional …

. Ou Naji Nahas para diretor de câmbio do Banco Central.

. A estratégia de Serrágio para revogar a CLT por Medida Provisória é simples: acabar com a indenização.

. Durante dez meses, o trabalhador que fosse mandado embora seria remunerado pelo Fundo de Amparo ao Trabalhador – esse que, no Governo Lula, pagou o cala-aboca de US$ 1 bilhão a Daniel Dantas.

. Daí a dez meses, outra Medida Provisória manda o trabalhador ir se queixar à Corte Internacional de Haia.

. Por um fim à “Era Vargas” era um dos objetivos explícitos do Farol de Alexandria.

. Era uma das metas explícitas de seu iluminado Governo.

. Como Carlos Menem pretendia acabar com os males do “peronismo”.

. (Provavelmente com a ajuda do dinheiro da Siemens…)

. O presidente que tem medo, o Presidente Lula, fez de tudo para tratar os tucanos de São Paulo com luvas de pelica.

. Mas, revogar a CLT por Medida Provisória era ir longe.

. E isso, pelo menos, ele não topou.

. Agora, o que parece muito interessante também que é um dos paladinos da idéia de revogar a CLT é exatamente o empregado da Vale do Rio Doce, Roger Agnelli, um espécie de quindim de Iaiá do PiG.

. O Agnelli se esquece de que os donos da Vale – ele não é dono, embora, às vezes, se esqueça disso – podem perfeitamente aproveitar a idéia e mandar ele embora sem indenização.

. Afinal, quem mandou o Agnelli atrelar o futuro da Vale a China, mais do que a rede Wal-Mart?

. A Wal-Mart trocou a diretoria…

. Ou o Agnelli já começou a “fazer posição” no Governo Serrágio?

. O Presidente eleito José Serrágio não engana ninguém.

. Ele é um “desenvolvimentista de boca” – clique aqui para ler a entrevista de Maria da Conceição Tavares à Carta Maior

. Porque, de corpo e alma ele é o verdadeira Afif.

. Outro que pensa que vai enterrar Vargas.

. Ou dar um tiro no peito dele…

. Siga o noticiário que tratou da revogação da CLT por José Serrágio:

Empresas sugerem suspensão do contrato de trabalho por 10 meses

Publicada em 17/12/2008 às 22h43m
O Globo, Diário de SP e Agência Brasil
SÃO PAULO, BRASÍLIA e RIO - Empresários e o Governo de São Paulo elaboraram estudo sugerindo a flexibilização de direitos trabalhistas, com mudanças na CLT. A proposta foi apresentada quarta-feira, em reunião do Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo de Trabalho (Codefat), que liberaria parcelas extras do seguro-desemprego, e também foi encaminhada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O objetivo é enfrentar a crise em 2009.
Eles defendem a possibilidade de suspensão temporária do contrato de trabalho pelo prazo máximo de dez meses. Após esse período, a empresa recontrataria os trabalhadores temporariamente afastados ou então promoveria a rescisão definitiva. Segundo a proposta, o trabalhador cujo contrato fosse suspenso teria direito a receber o benefício do seguro-desemprego
Na terça-feira, no entanto, o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, descartou por completo adotar medidas que flexibilizem as leis trabalhistas para enfrentar este momento de crise.
A realidade, porém, é que trabalhadores já abrem mão de direitos para evitar demissões. Conforme mostrou reportagem publicada nesta quarta-feira pelo jornal O GLOBO, empresários e trabalhadores começam a fechar os primeiros acordos para flexibilizar direitos trabalhistas, dentro das possibilidades já permitidas por lei, para tentar amenizar os efeitos da crise financeira. Estudo da Fundação Institutos de Pesquisas Econômicas (Fipe), feito a pedido da Secretaria do Emprego e Relações do Trabalho de São Paulo, avalia que o custo da medida seria de R$ 6 bilhões.
A proposta levada ao Codefat foi elaborada pela equipe do secretário do Emprego e Relações do Trabalho do governo paulista, Guilherme Afif Domingos, como medida de emergência “para atenuar o impacto da crise no emprego formal”. A idéia é criar no país a suspensão temporária do contrato de trabalho (medida conhecida como layoff). Para tanto, seria necessária uma alternação na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), por meio de lei ordinária. A equipe sugere o uso de uma medida provisória (MP) para fazer as mudanças.
“A MP estabeleceria entre nós a figura da suspensão temporária do contrato de trabalho. Os trabalhadores seriam então temporariamente afastados, mas seu vínculo de emprego continuaria a existir. Não haveria para a empresa necessidade de desembolso de verbas rescisórias. O trabalhador cujo contrato fosse suspenso seria considerado tecnicamente como desempregado, teria direito a receber o benefício do seguro-desemprego”, diz o texto do documento distribuído pelo governo paulista que detalha a medida.
A proposta sugere que a possibilidade de suspensão do contrato de trabalho seja instituída em caráter transitório, valendo apenas para o exercício de 2009. “Ao longo do ano, os impactos da criação do novo instituto seriam avaliados e as autoridades poderiam examinar a conveniência da sua manutenção para períodos subseqüentes”, diz o texto.
A proposta prevê também que o trabalhador terá a possibilidade de participar de programas de treinamento específico ou de educação geral, com o objetivo de aprimorar sua qualificação para o trabalho enquanto seu contrato estiver suspenso. O setor público e as instituições privadas ofereceriam os recursos para a disponibilização dos programas de capacitação.
- Durante o prazo, o funcionário receberia o seguro-desemprego e poderia se qualificar profissionalmente com cursos - detalha o secretário Guilherme Afif Domingos.
A mudança na lei trabalhista, segundo o estudo, com a ampliação do lay-off viria por meio de Medida Provisória. Hoje, o sistema existe, mas deve ser negociado entre sindicatos e empresas. Já o treinamento pode ser feito por apenas cinco meses, pelo Bolsa Qualificação.
A empresa que quiser utilizar a nova norma, obrigatoriamente terá de negociar com o sindicato dos trabalhadores. “A suspensão temporária do contrato de trabalho seria então introduzida por meio de um acordo coletivo, específico para a respectiva empresa. Não poderia ser instituída por meio de convenção coletiva”, afirma o texto da proposta.
- A grande idéia é que isso não possa ser feito só pela empresa. Ela tem que chamar o sindicato e combinar com o sindicato. E nessa combinação uma das coisas que se pode exigir da empresa é que ela complemente o seguro-desemprego. A empresa pode ajudar também mantendo os benefícios, por exemplo o seguro-saúde, durante o tempo de afastamento. Pode ajudar dando um complemento de renda e, ainda assim, será um bom negócio para a empresa porque ela não tem que demitir e pagar todas as verbas rescisórias - opina o professor da Faculdade de Economia e Administração (FEA) da Universidade de São Paulo (USP), Hélio Zilberstein.

Clique aqui, se você for assinate, para ler a coluna do sempre bem informado Celso Ming, na segunda página da Economia, do Estadão…

Fonte: Conversa Afiada

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sábado, 20 de dezembro de 2008

FIM DA ERA BUSH - Sapatadas de fim de ano

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Por Alberto Dines

Antes do Natal costuma-se falar em botas, as botas de Papai Noel carregadas de presentes. Neste ano, as botas foram substituídas por um par de sapatos convertidos em projéteis por um jornalista iraquiano e instantaneamente transformados em objetos de culto em todo o mundo.

Na história mundial da sapataria jamais um calçado ganhou tal notoriedade. É bizantina a discussão sobre o comportamento ético do jornalista da TV Muntadhar al-Zaidi que investiu contra o seu entrevistado, o presidente George W. Bush, numa entrevista coletiva em Bagdá.

Como escreveu na quinta-feira Eugênio Bucci, no Estado de S.Paulo [ver "A liberdade vale um par de sapatos"], aquela não era uma situação normal, a entrevista coletiva era uma farsa, não se pode exigir do jornalista uma postura respeitosa se tudo ali era desrespeitoso.

Preferência pela piada

Por outro lado, é imperioso lembrar que na maioria absoluta dos países islâmicos seus dirigentes não concedem entrevistas coletivas nem a imprensa tem liberdade para o desempenho de suas funções. Se, por um acaso, um jornalista jogasse uma sandália no presidente iraniano Mahmoud Ahmadinejad seria imediatamente enforcado.

Os sapatos de al-Zaidi deram uma grande exposição aos problemas da mídia. E os problemas da mídia de repente ganharam dimensões planetárias, não porque o Chicago Tribune pediu concordata, mas porque um jornalista sentiu-se violentado e protestou publicamente.

O presidente Lula, como sempre, preferiu fazer piada na cúpula da América do Sul e Caribe. Conviria perguntar aos seus assessores quantas entrevistas coletivas concedeu neste ano.

Fonte: Observatório da Imprensa

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A liberdade vale um par de sapatos

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por Eugênio Bucci*

Comecemos pelo aspecto formal. Na ética de imprensa não há sustentação para o ato do jornalista iraquiano Muntadhar al-Zaidi, que atirou seus sapatos contra George W. Bush durante uma entrevista coletiva em Bagdá, no domingo passado. Zaidi não rompeu apenas com as boas maneiras, indispensáveis no relacionamento com qualquer fonte. Ao desvestir o papel de entrevistador para virar protagonista de protesto político, ele deixou de lado os cânones da profissão. Mandou às favas a credencial que lhe garantia acesso ao recinto. O seu gesto, que seria compreensível se praticado por um homem comum, é inadequado para um repórter no exercício do ofício - e, por mais que os padrões de comportamento do jornalista se aproximem daqueles que valem para o homem comum, nem sempre o primeiro pode fazer ou dizer tudo aquilo que estaria autorizado ao segundo. As restrições que ele precisa observar são proporcionais aos privilégios de que ele desfruta para melhor cumprir seu dever. O homem comum não é convidado para uma coletiva com um chefe de Estado. A prerrogativa cabe apenas a jornalistas. Por isso, ao aceitar ser parte de uma coletiva, o profissional assume compromisso com as regras que a ocasião requer. Por decorrência lógica e prática, ele se obriga a abrir mão de condutas que inviabilizem a própria realização da coletiva. A sua credencial depende da manutenção desse pacto tácito, implícito a toda atividade de imprensa.

Portanto, do ponto de vista formal, Zaidi rasgou a cartilha. Aberta e ruidosamente: enquanto praticava o seu "tiro ao alvo", xingou o presidente americano de cachorro, ofensa gravíssima na tradição muçulmana (agredir alguém a sapatadas também consta como insulto na mesma cultura). Ele sabia o que estava fazendo, não resta a menor dúvida. Certamente, viu justificativas para a exceção que abriu em seu código de conduta. Exceção - eis a palavra-chave. À exceção praticada pelo jornalista corresponde uma outra: a exceção em que vive o Estado iraquiano. Embora tenha lá um governo formalmente constituído, o Iraque se encontra ocupado por forças comandadas por ninguém menos que aquele que por pouco não levou uma sola na testa (Bush conseguiu esquivar-se). Diante disso, há que se perguntar: pode haver imprensa livre num país que, no fim das contas, não é livre? Se não pode haver, é razoável exigir razoabilidade dos jornalistas desse país?

À luz dessas interrogações, a questão se apresenta com um pouco mais de clareza. Mais do que um destempero gratuito, o ato do jornalista iraquiano irrompeu na imprensa mundial como a denúncia desesperada de um teatro vazio. Aquela entrevista coletiva não seria exatamente uma entrevista, mas um jogo de aparências para esconder o vínculo opressivo entre o comandante da ocupação e a sociedade ocupada. O "atentado dos pisantes" despertou intenso debate no mundo inteiro e colheu apoios veementes entre os árabes. A partir disso, o ponto não é saber se Zaidi agiu ou não agiu segundo as formalidades da ética jornalística. Ele sabe que não agiu. Todo mundo sabe. O ponto é compreender o contexto profundo do seu gesto - o que nos remete a outra discussão.

Assim como uma coletiva não transcorre normalmente se os perguntadores começam a atirar peças de sua indumentária contra o entrevistado, a instituição da imprensa não pode vicejar num país que não conta com a possibilidade de deliberar soberanamente sobre seu próprio destino. Aí, falar em ética jornalística é falar de salamaleques. Se os pré-requisitos para o livre trânsito das notícias e das opiniões não estão garantidos, só o que resta é o teatro vazio, um formalismo sem conteúdo.

Lembremos que George W. Bush angariou adesões para a invasão do Iraque à custa de falsidades artificialmente difundidas nos jornais, segundo as quais Saddam Hussein, com o apoio da Al-Qaeda, manteria em seu país algumas fábricas de armas de destruição em massa. Era mentira. Antes de investir seus mísseis contra Bagdá, seu governo investiu contra a verdade. A invencionice que precedeu a guerra na qual os americanos hoje se encontram enredados constitui uma das mais torpes agressões ao direito à informação de que se tem notícia na história recente. Perto disso, o episódio de domingo passado é uma traquinagem inconseqüente. A guerra do Iraque foi produto de manipulações de má-fé, o que nos deveria fazer pensar com mais cuidado.

Antes, costumava-se dizer que, quando uma guerra começa, a primeira vítima é a verdade. Agora, temos visto que para tornar possível uma guerra injusta é preciso que se vitime, antes, a verdade. Isso significa que, atualmente, zelar pela verificação dos fatos e pela independência da imprensa é, muitas vezes, zelar pelas chances da paz. Simples assim. Não por acaso, os que querem a violência não querem saber nem da verdade nem da liberdade de imprensa. Definitivamente, não pode haver escudos morais que protejam George W. Bush de sapatadas de iraquianos. São sapatadas justas, ainda que destrambelhadas.

Eu, de minha parte, penso que, nessa profissão, sapatos servem para que se caminhe atrás da notícia, não para alvejá-la. Não conheço Muntadhar al-Zaidi. Não sei que apito ideológico ele costuma tocar. Os jornais dão conta de que tem 29 anos, é um nacionalista, opositor tanto dos Estados Unidos quanto do Irã, além de admirador de Che Guevara. Não posso nem devo julgá-lo. Sei apenas que ele se insurgiu contra uma farsa e, quanto a isso, tinha legitimidade. Foi preso. Há denúncias de que sofreu maus-tratos. Agora pesa sobre ele a ameaça de anos de cadeia. Seria uma pena truculenta demais para dois sapatos que voaram e para um iraquiano que ficou descalço.

*Eugênio Bucci, jornalista, é professor da Escola de Comunicações e Artes da USP e pesquisador do Instituto de Estudos Avançados da mesma universidade.

Fonte: Estadão

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A simbologia de um sapato

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Por Lejeune Mirhan**


Al Zaide é jovem mesmo. Tem apenas 29 anos. Foi, ainda sob o governo de Saddam Hussein, presidente de uma entidade estudantil. Segundo a emissora Al Jazeera, é membro do partido Comunista Iraquiano. Tem muitos irmãos e alguns deles mortos em combate na resistência contra a ocupação do Iraque por tropas estrangeiras desde 2003. Zaide é jornalista da emissora de TV Al Baghdadiya (cuja central fica no Cairo). Todas as reportagens da TV que ele faz na cidade de Bagdá ele conclui, dizendo, “da Bagdá ocupada”. A própria emissora que o emprega exigiu a sua imediata libertação, assim como o Sindicato dos Jornalistas do Iraque.

Al Zaide virou instantaneamente um herói nacional. E usou a sua arma mais potente, tanto física como simbólica: seus sapatos de sola de borracha pesados. Foi ficando cada vez mais irritado com a entrevista coletiva que Bush vinha dando, com suas mentiras habituais, ao lado do primeiro Ministro fantoche do Iraque, Nuri Al Maliki. Num determinado momento, decidiu arremessar os seus dois sapatos contra Bush. A catatonia dos presentes e mesmo da segurança presidencial foi tamanha, que ele conseguiu inclusive tempo para atirar o segundo sapato.

A frase que ele proferiu, gravada ao vivo por todas as emissoras presentes foi: “É o seu beijo de despedida do povo iraquiano, seu cachorro. Isso é pelas viúvas, órfãos e pelos que foram mortos no Iraque”. E não precisava dizer mais nada. Al Zaide mostrava-se ao mundo como o vingador dos mais de 200 mil iraquianos mortos, representava o sentimento de uma nação destruída, desmontada, aviltada, vendida, entregue à sanha imperialista e com quase toda a sua infra-estrutura destruída e vendida ao setor privado (doadas, na verdade).

Sua fama foi instantânea. Foi saudado no mundo inteiro. Passeatas saíram às ruas para exigir a sua imediata libertação. Circulou a informação de que um empresário saudita estaria oferecendo dez milhões de dólares por um dos sapatos que foram arremessados contra Bush. A foto de Al Zaide não saia de todas as TVs árabes e os jornais americanos publicaram o sapato “voador” passando rente à cabeça de Bush. Claro, os americanos procuraram minimizar o fato, dizendo que o mesmo não tinha importância alguma e que o jornalista não agiu em nome de nenhuma organização e não expressava a vontade do povo. Pura balela. Só se falava do ato de bravura praticado por um árabe contra o chefe do império mais odiado da história.

Os policiais que o prenderam, o espancaram brutalmente. Seu irmão, Maitham Al Zaide, afirma que diversas de suas costelas foram quebradas e seu olho foi atingido por coronhadas de fuzil. Continua preso sem que nenhuma acusação lhe tenha sido feita e que nenhum comunicado tivesse sido enviado formalmente à justiça por sua detenção. Fala-se que poderia pegar de sete até quinze anos de cadeia por ter tentado agredir chefe de estado estrangeiro em visita ao Iraque.

Imediatamente, uma rede de advogados formou-se para defendê-lo e exigir a sua libertação. A imprensa noticiou mais de cem advogados dispostos a prestar seus serviços gratuitamente para que ele possa ser libertado. O chefe da defesa de Saddam Hussein, Dr. Jalil Al Duleimi, será o provável defensor central de Al Zaide. Ainda continua sem nenhum contato tanto com seus familiares, como amigos e advogados, num claro desrespeito às tais normas mínimas de direitos humanos que os Estados Unidos tanto, e hipocritamente, pregam pelo mundo afora sem respeitá-las em lugar nenhum onde têm hegemonia.

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A simbologia do sapato

Atirar um sapato em alguém, no mundo muçulmano é uma das maiores ofensas que se pode imaginar. É sabido que para adentrar a uma mesquita todos os seguires do Islã devem tirar seus sapatos na porta da Mesquita. Sapatos são os protetores dos pés contra as impurezas da terra. Boa parte das coisas ruins, várias doenças, adentram em nosso corpo pelos nossos pés. As solas dos sapatos retém grande parte dessas impurezas. Assim, a simbologia não poderia ser melhor. Uma imensa ofensa ao chefe do império. Além do que chamá-lo ainda por cima de “cachorro”, foi duplamente ofensivo.

Esse contexto é toda a simbologia que se poderia ter, de um final mais do que melancólico e dramático do governo mais impopular da história dos Estados Unidos. Que deixa o maior rombo de caixa na maior economia do planeta. Que deixa de legado para todo o planeta o modelo neoliberal, que foi devidamente enterrado com a maior crise da história financeira do mundo. O presidente mais odiado do mundo, que encerra seu mandato em mais 30 dias apenas, mas que ninguém agüenta mais e não se vê a hora de que tudo esteja terminado e que o novo governo tome logo posse, antes que todo o sistema se derreta.

Ainda com toda essa impopularidade, com toda a crise econômica, Bush insiste em manter as tropas de ocupação no Iraque até 2011! A um custo mensal de 10 bilhões de dólares, o maios de todas as guerras feitas pelos americanos desde o final do século 19. Pode-se caracterizar essa simbologia do sapato atirado na cara do presidente americano como o retrato fiel do fim de uma era. Uma era de tristezas, de crises, de dominação e truculência, de financeirização do capital. Uma era de ocaso, de fim do unilateralismo, de fim de humilhações a que os EUA impuseram ao mundo todo, em especial aos árabes.

A simbologia não poderia ser melhor. Mais do que vaias ao final do seu impopular mandato, Bush sai sob sapatadas de um jovem combativo comunista e jornalista iraquiano de consciência elevada. Naquela sapatada desferida contra o chefe do império, Al Zaide representava o mundo inteiro. Representava todos os que lutam contra as injustiças, contra as ocupações, contra os ataques covardes que o exército americano praticou e continua praticando contra o povo do Iraque. Se em 2003 a simbologia era contra Saddam – quem não se lembra da derrubada da sua estátua na praça central de Bagdá e as várias chineladas e sapatadas desferidas contra a sua imagem – agora ela se volta contra aquele que se arvorou em ter derrubado um ditador. Mas pagará para toda a posteridade de sua vida, os imensos erros que a sua gestão deixou para o mundo. O povo árabe que o diga. Podemos nos sentir, como disse Gilles Lapouge (Estadão de 16/1/8), de “alma lavada, aliviados”. Não é qualquer dia que se presencia dois sapatos sendo atirados contra o presidente dos Estados Unidos.

Certo mesmo está Lapouge com sua conclusão de que vencedor da guerra, Bush, se iguala ao vencido Saddam e o dito “vencedor” é agora vencido por uma sapatada de número 42 partindo de um iraquiano, de um árabe. Pode haver maior simbologia do que isso?

Assista ao vídeo


**Lejeune Mirhan, sociólogo da Fundação Unesp, arabista e professor. Presidente do Sindicato dos Sociólogos, membro da Academia de Altos Estudos Ibero-árabe de Lisboa e da International Sociological Association.

Fonte: Portal Vermelho

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Que diria Raymundo Faoro?

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por Mino Carta

Que diria Raymundo Faoro desta hora brasileira? Dirijo a pergunta aos meus nostálgicos botões ao ser lançado pela Editora Globo um livro que reúne entrevistas do grande pensador. O momento da publicação não foi escolhido por acaso, estamos no fim do ano do cinqüentenário da primeira edição de Os Donos do Poder pela mesma editora. Obra-prima de Faoro, chave definitiva para entendermos o Brasil e a nós mesmos.

Intitulado A Democracia Traída, organizado por Mauricio Dias, por longos anos ligado a Faoro pela admiração e pelo afeto, e prefaciado pelo acima assinado, o livro coleta quinze entrevistas de Faoro a equipes que dirigi entre 1979 e 2002, as sete últimas em CartaCapital.

O título resume o pensamento que perpassa e sustenta a fala do entrevistado, alicerçada no ceticismo e temperada pela ironia. Trata-se da demonstração, inexorável, arrisco-me a dizer, do teorema do Hércules-Quasímodo, ser contraditório, patético na sua ambigüidade, destinado a semideus e condenado a Corcunda de Notre Dame.

É a condição de um país excepcionalmente favorecido pela natureza e entregue até hoje às vontades e artimanhas de uma elite feroz. Em pouco mais de duas décadas, ao longo das entrevistas que se tornaram tradição nas nossas redações e nas nossas vidas, Faoro denuncia, como escreve Mauricio Dias, uma negociação política “realizada segundo os princípios daquelas transações que resultam sempre na frustração dos movimentos sociais e na conseqüente traição da democracia”.

Resultado: “A anistia para os torturados implicou absolvição para os torturadores” e a campanha das Diretas Já conduziu “à eleição indireta e desdobrou-se a seguir na vitória de um rebento do regime popular”. São os efeitos da eterna conciliação oligárquica, boa parte antecipados nas entrevistas, o que me levou a batizar Faoro de O Profeta.

Ele, obviamente, esquivou-se. Não fugiu, porém, à explicação. “O profeta – disse no dia 6 de dezembro de 2000 –, não é exatamente quem prevê coisas. Isso é uma tradição tardia na história do judaísmo. Profeta é a pessoa que tem uma mensagem e que vem para dizer alguma coisa, é esse o sentido original da palavra. E que vem, inclusive, para fazer a crítica.” Como se vê, não me enganei.

E ele foi, desde sua saída da presidência da OAB, meu conselheiro, mentor e guia, além do amigo de todas as horas. E foi, estou certo disso, para todos nós que aportamos à CartaCapital, depois de passar por IstoÉ, pelo Jornal da República, por Senhor, por IstoÉ Senhor, por IstoÉ segunda fase. Agora nos faz aquele gênero de falta que não é possível preencher.

Volta e meia me ocorre imaginar o que ele diria diante de cada circunstância. A última vez em que pude interrogá-lo foi no começo de 2003. Conto no prefácio: “Quando finalmente Lula se elegeu, no segundo turno do pleito de 2002, Raymundo já estava no hospital, do qual só sairia para o enterro, em abril do ano seguinte. Ficou emocionado com a vitória do seu candidato, disse estar com sorte ao participar de um momento que já perdera a esperança de viver. Mas em fevereiro de 2003 manifestava algumas dúvidas quanto aos primeiros passos do novo governo”.

E que diria hoje, quando o bastião do Estado de Direito atende pelo nome de Gilmar Mendes? Ou quando o Banco Central do senhor Meirelles mantém os juros na estratosfera enquanto os Estados Unidos praticamente os zeram? Ou quando a maioria dos brasileiros apóia incondicionalmente o presidente Lula, mas quem manda ainda é a minoria branca? Ou quando já sabemos que em 2010 não será eleito outro torneiro mecânico? Etc. etc. e etc.

Creio que o profeta-mensageiro registraria o resultado de suas mensagens. Em 1998 dizia: “O eventual governo Lula não será revolucionário, a idéia da revolução já está banida da cabeça dele”. E em maio de 2002, ao acreditar na possibilidade da vitória de Lula: “O PT poderia mudar a orientação histórica do País, que é um país de exploração, o pobre é cada vez mais pobre. Lula significaria a vitória de uma camada contra a outra. Governar, porém, contra as pessoas que no Brasil estão por cima é quase temerário. Por outro lado, se Lula for eleito e contemporizar (...) passará a ser um governante como os outros. Essa mudança é o passo mais difícil de ser dado”.

Democracia, dizia Faoro, é igualdade e distribuição de renda, metas ainda distantes no Brasil de hoje. Por isso entendia que o confronto entre direita e esquerda justifica-se plenamente neste país cujo Estado é por fazer, nesta República inacabada.

Fonte: Carta Capital

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Gilmar Mendes perde a compostura: Balanço do Roda Viva

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por Idelber Avelar

Eu faço um balanço positivo do ruim programa de entrevistas da TV Cultura na última segunda. Fraco de qualquer ponto de vista que tenha um mínimo de rigor jornalístico, consistindo principalmente, como prevíamos, em “levantadas de bola” para o entrevistado, o programa não foi, no entanto, o que ele teria sido se não tivesse havido a mobilização de blogs como o do Nassif, do PHA, do Mello, deste próprio espaço e de uma legião de outros blogueiros e leitores que entraram em contato com a TV Cultura. Sim, sei que fazer história contra-factual, imaginar o que “teria sido”, é sempre hipotético. É evidente. Mas esta é minha hipótese: não que o programa “tenha repercutido” na internet mas, pelo contrário, a internet repercutiu dentro dele, exercendo influência especialmente na postura da colunista Eliane Cantanhêde -- a quem devemos parabéns -- e também na coordenadora Lilian Witte Fibe. Os outros foram o que esperávamos.

Da colunista da Folha de São Paulo sempre achei que é inteligente e autora de boa frase, mas também sempre me pareceu que ela ganharia muito em credibilidade se explicitasse seus vínculos pessoais e de simpatia com o tucanato. Não há nada de errado em tê-los e os tucanos são uma força política importante e legítima no Brasil. O problema é deixá-los nebulosos e pretender / fingir / supor que fala a partir de uma posição politicamente equânime.

Em todo caso, não há dúvida que a enxurrada de bits que circularam na internet influíram nela. Não me cabe julgar se Cantanhêde – cuja coluna na página 2 da Folha não foi exatamente combativa na época da Satiagraha – estava sendo “sincera” ou “fazendo média” com a maioria do público brasileiro ou se foi mesmo sendo convencida de que há que se interrogar Mendes. O fato é que, dentro de seus limites, tentou fazer jornalismo de verdade. Lilian também não foi mal, apesar do absurdo gesto pedindo contenção a Eliane no momento do bate-boca com Mendes, quando havia sido este que a interrompera.

Confrontado por Eliane com perguntas acerca do grampo fajuto e da quase unanimidade jurídica contra ele na época do segundo habeas corpus a Dantas, Gilmar Mendes foi grosseiro com uma dama que lhe fizera uma pergunta legítima. Falsamente acusou-a de estar querendo ensinar-lhe. Perdeu a compostura de magistrado. Lamentável. Parabéns, Eliane.

Aliás, salvo engano, nenhum comentário sobre o Roda Viva até agora notou o óbvio: as únicas a se comportarem com um mínimo dignidade jornalística na bancada foram as duas mulheres, enquanto um dos marmanjos, Carlos Marchi, se omitia, e os outros dois, Reinaldinho e Márcio Chaer, se esforçavam para levantar bolas, não como Ricardinho, mas como um tosco, desajeitado e afobado levantador que tivesse nas mãos, não nove, mas somente seis ou sete dedos.

Se o portal Consultor Jurídico ainda tinha qualquer credibilidade no meio jurídico, maculou-a severamente na segunda à noite, com a postura indigna do Sr. Chaer, que confundiu jornalismo com puxa-saquismo. Incrivelmente, na mesma noite em que tentava ajudar a coroar Gilmar Mendes como o paladino da liberdade de expressão, o Sr. Chaer sugeriu enquadrar “jornalistas de aluguel” por .... formação de quadrilha! Isso sem citar nomes ou fazer acusação concreta (qual é o problema? É Paulo Henrique Amorim? É Luiz Nassif? Diga o que tem a dizer então e coloque as cartas na mesa).

Reinaldinho, coitado, é aquilo ali. Pelo menos acredita no que diz. Usa o programa para traficar a imputação de terrorismo a quem lutou contra a ditadura. Transforma a bancada em palanque para tentar nos fazer crer que é inverossímil a hipotese de que um senador pefelê, Mendes e a revista de menos credibilidade do Brasil tenham sido pegos na mentira. Corrige, coitado, no post das 18:47 de 16/12, o “Schmidt” do ombudsman só para ir lá e, ele mesmo, escrever que “o sobrenome do Carl não é "Schmidt", mas Schimitt” errado também. A mesma fúria com que seus leitores anônimos defendiam a TV Cultura antes do programa foi dirigida contra ela depois que o ombudsman notou o óbvio (aliás, não sei se Ernesto Rodrigues reparou que implicitamente, depois do programa, ele deu razão à “reação em cadeia” da internet que antes ele criticara. Tínhamos ou não tínhamos razão, meu chapa, em atacar a composição da bancada? Estávamos “pré-julgando” ou simplesmente notando o óbvio?).

A pergunta 8 da lista formulada por mim na segunda-feira foi feita durante o programa: O sr. tem alguma idéia do porquê das mais de 30 ações impetradas contra o seu irmão ao longo dos anos jamais terem chegado sequer à primeira instância? . Faltou-lhe, evidentemente, uma palavrinha: julgamento. Por que não foram a julgamento? Disso se tratava, como saberia qualquer um com um mínimo de contexto e boa fé. A responsabilidade pela formulação imprecisa da pergunta é única e exclusivamente minha, já que a magnífica reportagem de Leandro Fortes, na qual ela se baseava, havia formulado a dúvida certinho.

Favorecido pela falta da palavra que teria tornado a pergunta juridicamente exata, Mendes escapou pela tangente e, desqualificando a indagação, só deixou claro seu desconforto com ela.

A isso, mes amis, o gênio de Oswald de Andrade chamou a contribuição milionária de todos os erros. Havia 24 perguntas formuladas em termos factuais. Aquela que continha uma imprecisão vocabular, uma errata, um piolho nas palavras – como diria Flaubert – foi a que acabou sendo a mais reveladora.

PS: Parabéns, Fernando Meirelles.

PS 2: Aguarde-se, claro, um Roda Viva bem mais duro com o Delegado Protógenes, na próxima segunda.

PS 3: Cobrem-me um post sobre a imensa desonestidade intelectual das menções a Carl Schmitt no programa: uma levantada capenga de Reinaldinho para uma cortada – indigna de um acadêmico – em que Gilmar Mendes tentava enlamear o Juiz Fausto de Sanctis.

Fonte: O Biscoito Fino e a Massa

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Madoff implodiu a SEC. CVM trata Dantas e Nahas com tapete vermelho

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Madoff: também tratavam ele com tapete vermelho

Madoff: também tratavam ele com tapete vermelho



por Paulo Henrique Amorim

Em nenhuma democracia séria do mundo, jornais conservadores, de baixa qualidade técnica e até sensacionalistas, e uma única rede de televisão têm a importância que têm no Brasil. Eles se transformaram num partido político – o PiG, Partido da Imprensa Golpista

. Enquanto o PiG procura super-dimensionar a crise econômica, para desmoralizar o Governo Lula e apressar a posse de José Serrágio (de pedágio, o mais caro do Brasil), a imprensa econômica em língua inglesa – Wall Street Journal, Financial Times e o caderno de economia do New York Times – se preocupou muito mais, nos últimos dias, com o Grande Golpe do “banqueiro” e estelionatário americano Bernard L. Madoff.

. Madoff deu um golpe de mais de US$ 50 bilhões !

. É um golpe da mesma natureza do “Esquema Ponzi”, de Charles Ponzi, que, em 1920, associou o seu nome a esse tipo de fraude de forma indelével: pagar os investidores antigos com o dinheiro dos novos investidores.

. Quando pára de entrar investidor novo, a bicicleta pára e vai tudo para o vinagre.

. Ponzi, coitado, entrou para a história – clique aqui para ler mais sobre ele, essa figura tão brasileira -, porque deu um golpe de US $ 10 milhões a 17 mil investidores americanos, especialmente da região de Boston.

. O FBI o colocou na cadeia duas vezes ( e a Suprema Corte não o tirou de lá.)

. (Ponzi, imigrante italiano, morreu abandonado num asilo, no Rio de Janeiro, para onde fugiu.)

. Madoff é de outra dimensão, mas é tão estelionatário quanto seu predecessor.

. Até agora, o que se sabe é que a instituição que mais perdeu dinheiro nas mãos de Madoff foi uma administradora de recursos, subsidiária do Santander: US$ 3 bilhões.

. O forte de Madoff, porém, eram investidores individuais, que ele conseguia através de conexões poderosas nos Estados Unidos e na Europa.

. Elie Wiesel, o escritor, e Steven Spielberg, o cineasta, aparentemente são algumas das vítimas, na pessoa física.

. Madoff prometia retornos fantásticos sobre os investimentos.

. (Um único fundo americano, Fairfield Greenwich aplicou US$ 1,7 bilhão de investidores privados americanos e europeus com Madoff )

. Eram retornos fictícios.

. Que se evaporaram na hora em que investidores sacaram num volume superior às novas aplicações.

. E a pirâmide em forma de um “ponzi” implodiu.

. Madoff estava quebrado e há vários anos.

. Nem os filhos sabiam que o pai era um estelionatário.

. Antes de contar aos filhos, Madoff, generoso, tentou salvar alguns milhões de dólares para dar de bônus de Natal aos melhores funcionários.

. Ele preso em casa, num apartamento na Park Avenue, em Nova York, com uma coleira dotada de chip: o FBI detecta todos os seus movimentos (e o Ministro Marco Aurélio de Mello ainda não reclamou da algema eletrônica …).

. Madoff tinha clientes brasileiros.

. Isso vai explodir aqui também (em silêncio).

. O que todo mundo se pergunta é: como foi possível existir uma fraude desse tamanho – US$ 50 bilhões - por tanto tempo ?

. Resposta: por que não havia regulação, não havia quem controlasse os negócios de Madoff.

. Nem uma auditoria independente, nem um órgão regulador.

. As informações que Madoff prestava à SEC (à CVM americana) eram falsas, maquiadas numa empresa de auditoria de uma sala só, em Nova York.

. E a SEC acreditava no que lia…

. Dois anos atrás, uma denúncia anônima levou a SEC a investigar Madoff.

. A SEC entrevistou um ex-diretor da SEC (êpa, conflito de interesse nos Estados Unidos também ???), que, então, prestava seus serviços altamente “técnicos” ao Fairfield, operador de Madoff…

. A SEC nunca mais será como antes.

. A SEC é em boa parte responsável pela crise que os investimentos em derivativos – como os de Madoff – provocaram.

. O Governo Obama já decidiu que vai querer mais regulação.

. E vai mudar a diretoria e a orientação da SEC.

. Obama vai fazer o que o presidente Lula, o que tem medo, não fez.

. Lula manteve na presidência da CVM um advogado de Daniel Dantas e ex-sócio de Dantas.

. O sucessor do advogado de Dantas na CVM foi um amigo do advogado de Dantas.

. O que a CVM fez para vigiar Dantas ?

. Estendeu um tapete vermelho na porta.

. Aplicou uma multa que faria Madoff cair na gargalhada (como Dantas caiu).

. Era sobre se Dantas permitia que residentes no Brasil aplicassem em seus fundos só para não-residentes.

. Claro que Dantas deixava residentes no Brasil aplicar nos fundos dele.

. E depois, um representante da CVM, num tal de Conselhinho, votou contra a multinha que a CVM tinha aplicado.

. E Madoff caiu na gargalhada, com Dantas.

. Depois, Dantas e Naji Nahas, esse benemérito da Bolsa do Rio, usaram o PiG para comprar e vender ações da Brasil Telecom e da Oi, nas barbas da CVM.

. A Teletime, do respeitado jornalista Rubens Glasberg, demonstrou isso de forma cabal.

. As notícias do PiG levavam e traziam grana para o bolso (gordo) de Dantas e Nahas – e o que fez a CVM ?

. Nada.

. Há uma grande diferença entre Obama e Lula, dois presidentes de “esquerda” – e não é porque Obama seja negro.

Fonte: Conversa Afiada

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Carta Capital faz anatomia de um paladino: Gilmar no Roda Morta

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O chapéu e o dublê

O chapéu e o dublê

A Carta Capital que chega às bancas, na seção Brasiliana, faz uma análise imperdível do comportamento do paladino da democracia brasileira, o loquaz Gilmar Mendes, e sua participação no programa Roda Morta da TV Cultura.

A certa altura, Carta pergunta “por que a extensa agenda em São Paulo, iniciada com uma homenagem na Fiesp, na sexta feira, 12, e concluída no Roda Viva, salpicada de visitas a empresas de comunicação?” Pena que Mendes carregue dentro de si um pequeno déspota.

A Carta se refere especialmente a dois cavalariços que socorreram Mendes. “Na vanguarda, um chapéu de onde, subitamente, começam a sair palavras. Eis a versão brasileira do ‘talentoso Ripley’, sempre insatisfeito com a sua inamovível condição de figurante, sempre tentando ser o que não é.”

Outro defensor de Mendes é dublê, o eterno assessor: “chegou a sugerir ao ministro o enquadramento de colegas de profissão, que não identificou, por formação de quadrilha. O dublê entende desses assuntos: mandar recados e formação de quadrilha”. O título do artigo é “O assessor e o coisseur”. Isso vale mais do que a 57ª entrevista que Mendes concedeu nesta semana, em que se considera responsável pelo esvaziamento da Polícia Federal e ataca os blogueiros.

Nesse mister, Mendes é mais do que um paladino: é o Grande Inquisidor, da ópera Don Carlo, de Verdi, em exibição no Scala de Milão, nesta temporada.

O Grande Inquisidor é quem sufoca Don Carlo, ensina ao rei o que fazer e devolve o Reino à profundeza da treva.

O Grande Inquisidor deve ser contra o e-mail. Veja a 57ª entrevista dele nesta semana.

Leia também:

Conversa Afiada apresenta: Bastidores do Supremo Presidente na TV Cultura

Mendes desconversa, tangencia, e faz programa virar “Roda Morta”

Fonte: Conversa Afiada

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A Abin não fez o grampo: Lula tem que demitir Jobim e readmitir Lacerda

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Kluwe participa do começo, meio e o fim do grampo sem áudio

Kluwe, o começo, o meio e o fim do Estado policial


por Paulo Henrique Amorim

Sindicância do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência da República acaba de ser encerrada com a informação de que não foi encontrado qualquer indício de grampo feito pela ABIN no decorrer da Operação Satiagraha. Em nota, o gabinete cita laudos do Exército e do Instituto Nacional de Criminalística, da PF, para refutar a tese de que agentes da ABIN tenham feito os grampos. A investigação também não localizou o áudio do suposto grampo que teria monitorado conversa do presidente do STF, Gilmar Mendes, e o senador Demóstenes Torres. Veja mais sobre a nota do GSI no texto publicado pelo portal Terra.

Leia matéria da Carta Capital que demonstra os motivos edificantes que levaram um espião da Abin a fabricar um grampo sem áudio para demitir Paulo Lacerda, que estaria na iminência de demiti-lo.


Saiba também como funciona o
intercâmbio tecnológico que existe entre o Gabinete de Gilmar Mendes e os “furos” da revista Veja, a última flor do Fascio. E a Veja, ninguém vai investigar ?

Fonte: Conversa Afiada

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sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

A ARTE, UM PODEROSO REMÉDIO

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Paulo Barreto Campello é médico, músico, professor e criador do programa "A arte na medicina às vezes cura, de vez em quando alivia, mas sempre consola", da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Pernambuco. Integra um conjunto de médicos do Recife


POR CONCEIÇÃO LEMES, ESPECIAL PARA O VIOMUNDO

Da entrada dos hospitais e clínicas especializadas às alas internas, grafites enfeitam as paredes e dão aulas de saúde. Contêm desde informações sobre prevenção da dengue destinadas às crianças à importância do exercício para proteger o coração de todas as idades. Cordéis ensinam cidadania, como este do gastroenterologista Wilson Freire: “Não deixe que a terra coma/O que ainda de vida têm/ Por isso doe os seus órgãos/Pra que eles vivam em alguém”.

Nas maternidades, gestantes ouvem as suas músicas preferidas antes e durante o parto. Vale o que a futura mamãe escolher: bossa-nova, samba, reggae, forró, frevo, clássico. É a celebração da vida. Ao som de Vivaldi (1678-1741) e Mozart (1756-1791), bebês são acolhidos no berçário. Embalados por composições suaves, dormem melhor e a amamentação é facilitada; os prematuros precisam de menos remédios. É o som da vida.

No castelo de três andares, funciona a escolinha de arte do complexo hospitalar. Aí, crianças e adolescentes com doenças graves, como câncer e problemas cardíacos, fazem toda sorte de reinações artísticas: música, teatro, dança, capoeira, maracatu, pintura, fotografia. Nos leitos, outras escutam contos de fada e criam as próprias histórias. Ao mesmo tempo, médicos-músicos e seus convidados percorrem enfermarias, serviços e corredores, tocando e maravilhando. É uma terra encantada de esperança que se alastra pelas salas de aula. Nelas, futuros profissionais da saúde aprendem que a arte pode -- e deve! -- ser usada como terapêutica e na humanização da medicina.

Conto de fadas? Ficção? Futurologia? Nada disso. É o programa “A arte na medicina às vezes cura, de vez em quando alivia, mas sempre consola”, da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Pernambuco (UPE). Em 12 anos de funcionamento, já beneficiou cerca de 30 mil pacientes de hospitais universitários e da rede do Sistema Único de Saúde (SUS) de Pernambuco.

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Sérgio Lopes Pereira

SÉRGIO E KETYANNE, A VOLTA POR CIMA

Sérgio Lopes Pereira, 27 anos, foi o primeiro paciente-aluno da escolinha desse programa pioneiro no Brasil. Nascido em São Bento do Una, próximo a Garanhuns, no sertão de Pernambuco, Sérgio aos 16 anos descobriu que tinha leucemia. Foi para Recife se tratar. Fez quimioterapia durante quase três anos no hospital da UPE.

“Antes, eu contava os dias para não ir à quimioterapia; era muito duro”, relembra. “Depois que a escolinha passou a existir, eu contava os dias para voltar ao hospital. Aprendi a pintar, tocar bateria.”

Hoje, curado, Sérgio é voluntário do programa que o resgatou para a vida; dá aula de bateria para novos pacientes. “Muitos são do interior, como eu era. Ficam sozinhos no hospital, longe da família, sem receber visitas”, prossegue. “As atividades da escolinha, como música, teclado, capoeira, violão, computação, fotografia, desenho, aliviam o sofrimento e ajudam a não entrar em depressão. Eu sou uma prova disso. Dei a volta por cima.”

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Keytanne Barros dos Santos

Ketyanne Barros dos Santos, 23 anos, é outra. Aos 3 meses de vida, perdeu a visão dos dois olhinhos. Teve retinoblastoma bilateral, tumor maligno da retina. Fez cirurgia e quimioterapia. Aos 13 anos, já curada, conheceu a escolinha do programa.

“Anualmente, eu fazia avaliação médica, para saber se havia surgido um novo tumor”, relembra Ketyanne. “Foi numa dessas idas que, enquanto esperava a vez de ser atendida, eu conheci o projeto da Universidade de Pernambuco e comecei a freqüentá-lo. Eu tinha um tecladinho, que tocava em casa. A partir daí, aprendi harmonia, canto, tocar violão, piano. Foi uma preparação para o que faço hoje. Toco, canto, faço poesias, estou na faculdade, curso teologia.”

Kettyane tem um CD de música gospel e um livro de poesias -- Quero ver a vida pela luz dos olhos teus --, publicado pelo projeto.

“O programa é uma bênção para as crianças e adolescentes que têm que passar dias, às vezes meses hospitalizados”, avalia. “O que mais me toca é vê-los se divertindo. Saem mais felizes das atividades da escolinha e tiram o foco da doença e da dor; ainda crescem como ser humano.”

“A ARTE É UM PODEROSO ‘REMÉDIO’”


“Realmente, existem várias experiências bem sucedidas de utilizar as diferentes formas de arte como parte do tratamento de pessoas com diversas doenças”, frisa o médico Mílton de Arruda Martins, professor titular de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da USP. “Trata-se, inclusive, de uma das práticas utilizadas com muita freqüência pelos profissionais de terapia ocupacional.”

De Belo Horizonte (MG), a psicóloga Otília Rosângela Souza, presidente da União Brasileira das Associações de Arteterapia, observa: “A arte ajuda a pessoa a enxergar a doença e a situação vivida por outro ângulo. Transforma sentimentos, melhora a auto-estima e desenvolve a criatividade”.

O médico e professor Paulo Barreto Campello, criador e responsável pelo programa de arte na medicina da Universidade de Pernambuco e vice-presidente da Associação Brasileira de Medicina e Arte, garante: “A arte é um poderoso ‘remédio’”.

Segundo Campello, estudos têm demonstrado que a arte pode contribuir para promover saúde de várias maneiras:

* Estimula a produção de anticorpos que fortalecem nossas defesas contra ataques de vírus, bactérias e fungos nocivos ao organismo. Contribui, assim, não só para combater as infecções instaladas, como evitar novas.

* Leva o cérebro a estimular a fabricação de substâncias que acalmam, alegram e relaxam.

* Funciona como ponte psicossomática entre nossas emoções e nosso corpo. Revela, assim, as dores físicas e as “dores” da alma.

* Ajuda na recuperação motora de pacientes que tiveram, por exemplo, acidente vascular cerebral, o AVC, mais conhecido como derrame cerebral. Dedilhar um teclado funciona tanto quanto movimentar cem vezes o dedo. Da mesma forma, para quem precisa de fisioterapia respiratória, tocar flauta, gaita ou pífano é tão eficiente como insuflar luvas. A diferença é que o tratamento com instrumentos musicais fica mais prazeroso e alegre. E alegria fortalece o sistema imunológico. Pessoas felizes recuperam-se mais rapidamente e adoecem menos.

“Nosso próximo passo será a implantação, a partir de fevereiro, da arteterapia como disciplina optativa da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Pernambuco”, informa Paulo Campello. “Abriremos algumas vagas para alunos de outras áreas de saúde da faculdade, como odontologia, enfermagem e educação física.”

A meta é fornecer-lhes instrumentos teórico-práticos, para que entendam o mecanismo e a importância da arte na sua área de atuação e a utilizem no dia-a-dia com os pacientes. “Queremos que os profissionais de saúde entrem também no nosso conto de fadas, tornando-o realidade por esse Brasil afora”, ressalta.

PRATIQUE OU APRECIE; A SAÚDE MENTAL LUCRARÁ


Se você duvida dos benefícios enumerados pelos especialistas entrevistados pelo Viomundo, que tal experimentar? Inclua algum tipo de arte no seu cotidiano, mesmo que a sua saúde esteja ótima. Pode ser literatura, poesia, música, canto, dança, escultura, pintura, fotografia ou o que gostar mais. Não importa a sua idade. Depois, se quiser, mande um e-mail para doutor Paulo, contando o que achou da experiência: artenamedicina@fcm.upe.br

Ah, prefere apenas admirar? Tudo bem. A saúde lucrará. Se você tem filhos, estimule-os.

“Saúde hoje tem a ver não apenas com a duração da vida, mas também com a sua qualidade”, justifica o professor Mílton de Arruda Martins. “Atividades criativas, como participar de atividades sociais e artísticas, contribuem muito para a saúde, especialmente a mental.”

“Deixe a arte entrar nas suas veias”, sugere Paulo Campello. “É a minha receita de vida. Prescrevo aos meus pacientes, recomendo à população em geral, inclusive a você.”


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Fonte: Vi o Mundo

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quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Entrevista com Maria da Conceição Tavares:“O país não pode mais contar com o BC; governo deve investir pesado no gasto social."



“O país não pode mais contar com o BC; governo deve investir pesado no gasto social. E o PT deve se renovar com o debate da crise"

Em entrevista à Carta Maior, a economista Maria da Conceição Tavares diz que o Brasil não pode mais contar com o BC. "A partir de agora, o Banco Central tornou-se uma peça menor no xadrez econômico". Para ela, a grande batalha de 2009 é fortalecer o emprego e o poder aquisitivo do povo e investir pesadamente na área social. Ao falar sobre a disputa de 2010, manifesta apoio a Dilma Roussef e diz que ela é mais consistente do que José Serra. E lança um desafio ao PT: "o partido precisa submeter seus projetos e ideais à nova realidade mundial.

O consenso nacional para derrubar a taxa de juro, unanimidade que agora arregimenta até conservadores de carteirinha, chegou tarde demais, na opinião da economista Maria da Conceição Tavares. Ela acredita que o BC irá fazê-lo em gotas de sereno, a partir de janeiro de 2009, quando esse simbolismo já não terá mais capacidade de reverter a dinâmica deflagrada pela crise.

Expectativas pessimistas e revisões em planos de investimento puseram-se em marcha ao longo da omissão persistente da política monetária comandada por Henrique Meirelles nos últimos anos. A ortodoxia encastelada no BC fez a sua escolha. E a cumpriu com fidelidade. “O Brasil não pode mais contar com o BC”, diz Conceição. Seus membros prestaram um desserviço ao país para servir ao rentismo, que os ancora e protege.

“A partir de agora, o Banco Central tornou-se uma peça menor no xadrez econômico”, resume e prossegue calmamente. “Reduziu-se a um estorvo apenas; uma irrelevância diante dos fatos, das urgências e das possibilidades que se colocam para a economia e o governo. Essa gente já não consegue mais sequer me provocar indignação, apenas cansaço”.

O tom sereno do diagnóstico não é usual, por isso mesmo soa mais forte que pancada. Vindo de quem vem, não poderia haver manifesto de desprezo mais contundente a uma esfera de governo que se fez obsoleta para os interesses do país. A professora, como Maria da Conceição é tratada carinhosamente pelos seus admiradores, discípulos e ex-alunos, e até por adversários, não costuma poupar decibéis na defesa de idéias sempre vigorosas. Que o faça agora em tom plano é um sintoma eloqüente do menosprezo que atribui à instituição e à política monetária nas questões decisivas dos próximos meses.

A grande batalha que mobiliza a professora nesse momento, tão difícil quanto foi a do juro, envolve uma conseqüência que faz enorme diferença: perder desta vez seria definitivamente fatal. Evitar esse desfecho é o propósito que devolve a determinação costumeira à sua voz. “Fortalecer o emprego e o poder aquisitivo do povo; em torno disso acontecerá a batalha decisiva para vencermos ou não a travessia de 2009”. É assim que ela define o que está em jogo na economia e na política de agora em diante. “Portanto, meu Deus”, e aqui está de volta a oratória envolvente da decana dos economistas brasileiros, “os que falam em cortar gasto de custeio que me perdoem, não sabem do que estão falando. Política social também é custeio. E se não é tudo, talvez seja o único grande trunfo que o governo controla, a partir do qual poderá agir com eficácia e rapidez diante da crise”.

Gastar mais na esfera social, no seu entender, é a injeção de adrenalina capaz de preservar a atividade, o emprego e o poder aquisitivo; ao menos naquele pedaço do Brasil que escapou da linha da pobreza durante o governo Lula e hoje agiganta o mercado interno, proporcionando ao país uma variável que o distingue na resistência ao colapso econômico mundial. Sim, isso poderia incluir até a antecipação de reajuste do salário mínimo, “como propõe o Carneiro”, diz Conceição (NR: economista Ricardo Carneiro, leia artigo nesta página). “Mas veja bem, estamos diante de uma questão política, não uma unanimidade tardia como parece ser a do juro hoje. Ampliar a despesa social é o que pensamos nós, economistas heterodoxos, assim como dizíamos há meses – anos - que era preciso baixar os juros. Mas por enquanto não há consenso sobre isso; talvez nem dentro do próprio governo. É uma corrida contra o tempo, motivo pelo qual insisto: o gasto de custeio social é a nossa chance de defender o país contra o desemprego e a recessão. Mesmo assim serão tempos difíceis”.

Não se trata apenas de vencer um percurso econômico. Conceição antevê nessa travessia a prefiguração do teste eleitoral a que será submetido um projeto que ela ajudou a construir nos últimos anos. Na verdade desde antes quando, jovem ainda, iniciou-se no BNDES e elegeu Celso Furtado e o projeto de desenvolvimento nacional como bússola histórica de sua vida e de sua profissão.

A professora Maria da Conceição é amiga de longa data da ministra Dilma Roussef, possível candidata do PT à sucessão do Presidente Lula. Conceição também já foi próxima de José Serra, candidato declarado da oposição no embate sucessório de 2010. Mas Conceição não tem dúvida de que lado estará então. “Serra não é um neoliberal; é bom que se diga e que não se confunda”, antecipa em tom sério. “Conheço ambos. A diferença entre Dilma e o Serra é que a visão da Dilma é mais consistente do ponto de vista histórico. Dilma escolheu o lado que pode apoiar um projeto de desenvolvimento para o Brasil no século XXI. E isso faz toda diferença. Entre o desenvolvimentismo de boca, do Serra, e o projeto ao qual Dilma pertence, eu não tenho dúvida de que lado fica a consistência histórica. E arremata: “Sim, Serra se opunha ao Malan no governo FHC. Mas Serra não se opôs às privatizações nem à política fiscal, concebida por gente da sua influência. Dilma é mais consistente. E não se trata apenas de superioridade no manejo econômico. Sua visão da economia tem uma contrapartida social coerente; e uma contrapartida de democracia consistente”.

Com um sorriso de entusiasmo, a professora comemora a notícia de que o PT , junto com a Fundação Perseu Abramo, criará uma Escola de Formação Política. “A agenda neoliberal contaminou toda sociedade; claro, também alcançou esferas do partido”, explica. “A crise econômica coloca esse pensamento em xeque e abre espaço para o PT retomar seu programa dos anos 94 e 98. Era um bom programa de reformas para o Brasil”, comenta, mas sem saudosismo - “perdemos com um bom programa, sempre é bom lembrar“. E aconselha como se fosse ao mesmo tempo cronista eqüidistante e personagem do mesmo enredo: “O PT precisa submeter seus projetos e ideais à nova realidade mundial. Isso requer estudo e reflexão. Essa crise não é como a de 30. É uma crise de paradigma, inclusive de paradigma industrial, o que não ocorreu em 30. É muito sério. Portanto, é hora de refletir, esclarecer, debater. O partido deve fazer isso sem perder a serenidade”, pontua preocupada: “Existe o horizonte político amplo, mas uma proposta de governo tem que oferecer respostas condicionadas às circunstâncias do país, agravadas pela crise mundial”

A seguir, trechos da entrevista de Maria da Conceição Tavares à Carta Maior

I)Controlar a conta de capitais com um BC desse tipo?Acho difícil.
A inflação está caindo, desaba em todo o planeta e aqui? Aqui eles mantém o juro no céu, a 13,75%. Para quê? Para atrair dólares? Para evitar fuga de capitais ? Mudou a conjuntura mundial, não existe mais liquidez internacional para ser atraída. Essa política é anômala: não vai atrair um dólar furado com essa taxa. Tampouco impedirá a fuga em busca de segurança. O que pode impedir esses movimentos de capitais é a taxa de juro zero decidida pelo Fed. Vamos torcer que seja assim. Mesmo porque, não vejo como controlar a conta de capitais num país que não controlou nem operações especulativas com derivativos. E elas foram feitas aqui, sim senhor; não foram contratadas apenas nos paraísos fiscais. Estavam aí à vista de todos, a começar do BC, e nada se fez. A verdade é que fizemos na área financeira uma abertura mais radical do que em qualquer outra. Talvez o Estado brasileiro não disponha no momento nem de mecanismos, nem de pessoal, e menos ainda de uma lógica de estado para controlar o movimento de capitais.

II) O Banco Central brasileiro virou um caso psicanalítico internacional
Os membros do Copom agem por necessidade de auto-afirmação, dizem seus defensores. Mas e o país? Temos um BC que se tornou um caso psicanalítico internacional... A intransigência tornou-o irrelevante para o país, essa é a verdade; e isso é uma marca grave. O BC brasileiro é um ponto fora da curva mundial. Um estorvo; uma peça menor no esforço do governo para defender o país contra a recessão. Simplesmente, não se pode mais contar com essa gente para nada. Na verdade, eu já não esperava nada desse grupo de interesses. Hoje, quando eles falam nem indignada eu fico; me dá cansaço.

III) A ortodoxia e o tamanho da crise apequenaram o BC
A turma do BC deixou a coisa passar a tal ponto que agora temos um paradoxo: a maior taxa de juros do planeta e, quando fizerem os cortes, será tarde demais. Nada do que possam fazer em gotas simbólicas, a partir de janeiro, terá importância na ordem do dia para enfrentar a crise. O governo não deve esperar mais nada daí. O BC ficou desimportante. As expectativas já foram formadas. Os interesses se aferram a sua lógica. Veja o caso da Vale do Rio Doce; uma empresa que está nadando em dinheiro e vem o Agnelli demitir e falar em exceção trabalhista! A rigidez monetária jogou lenha nessas distorções e agora não serve mais para nada. O governo precisa olhar para frente e esquecer o BC.

IV) Governo deve agir seletivamente e administrar o mercado de câmbio e crédito
O fato grave é que as taxas de juros estão subindo na ponta; o crédito continua caro e curto. Há uma pressão danada pela rolagem de dívidas contraídas por empresas dentro e fora do país. Isso ainda não está resolvido. E é sério. Para a rolagem externa teremos que tomar medidas adicionais em 2009. Não tenho a certeza de que a linha de US$ 30 bi criada pelo FED para países como Brasil e Coréia será suficiente. Talvez precisemos de mais, mesmo tendo o governo destinado também US$ 20 bi das reservas para essa finalidade.

Para o crédito interno não adianta mais liberar compulsório (percentual dos depósitos recolhidos obrigatoriamente pelos bancos no BC). Você libera, a banca privada não repassa; não chega na ponta e o custo do financiamento ainda aumenta. O governo deve agir direto, cada vez mais. Setor por setor, caso a caso. O Estado deve alocar recurso onde for mais relevante e administrar o mercado de crédito no piloto manual. É o que temos feito na área da construção civil e no mercado automobilístico. Deve-se aprofundar a ação estatal nessa direção. Não haverá normalidade de crédito via mercado; esqueçam o que diz o Meirelles e o BC. Não têm mais nenhuma importância.

V) Cortar o juro agora serve para reduzir custo da dívida interna; pode liberar fôlego fiscal para investimento público
Para ter algum sentido, o BC teria que derrubar a taxa de juro em pelo menos um ponto em janeiro, mas o farão de forma desprezível, em 0,25 ponto. Não falo para a atividade econômica, mas para reduzir a pressão fiscal no pagamento de juros da dívida pública. Isso permitiria liberar fôlego para a despesa social do governo. Esse é o ponto decisivo agora: agir na frente do emprego e do gasto social. A política do BC não fará mais nada pelo país. Por caminhos opostos, atingimos o mesmo esgotamento da ferramenta monetária que se verifica agora nos EUA; aqui, por fidelidade dos membros do BC aos interesses que representam, em detrimento dos interesses do país. Eles fizeram uma escolha e foram fiéis a ela até o fim. Absoluta disciplina. Infelizmente a escolha não foi o país, mas o mercado, de onde vieram e para onde voltarão.

VI)Custeio do Estado não é gasto com lápis e borracha; é gasto com gente, gasto social que tirou milhões da pobreza nos últimos anos
O fato é que a alavanca monetária chegou a um ponto de irrelevância. É hora da política fiscal: quem fala em corte de custeio nesse momento que me perdoe, fala sem saber do que está falando. Estão esquecendo: despesa social também é custeio. É o espaço que temos para defender o país, o emprego e a demanda interna. Os grandes projetos do PAC são importantes; os projetos privados associados a exportação de commodities também são de grande envergadura. Não vão parar porque são planos de longo prazo. Mas geram pouco emprego. Terão efeito reduzido na dinâmica do mercado interno. O que faz a diferença e está ao alcance do governo é o gasto de custeio do Estado. Claro, não falo de aumentar salários de assessorias etc. Gasto de custeio não é lápis e borracha; é principalmente gasto social. Esse tem que aumentar e aumentar urgente.

Naturalmente, em torno disso não existe o consenso que se vê agora, esse consenso tardio pelo corte dos juros. Ampliar o gasto de custeio, na esfera social, é algo que os economista heterodoxos defendem; mas o mercado não. Talvez nem mesmo dentro do governo exista clareza sobre isso. Sim, é preciso agir com os instrumentos disponíveis; até antecipar o reajuste do salário mínimo, se for o caso, como diz o Carneiro (NR: Ricardo Carneiro, economista da Unicamp). E fazê-lo não só na esfera federal, mas também nos Estados e municípios. Um mutirão público pelo gasto social, contra a recessão.

VII) O PT deve se preparar; se é certo que vai criar uma Escola de Formação Política chega em boa hora; a crise exige renovação
O partido deve se preparar para entender a dimensão da crise e agir sobre ela. Estamos diante de algo distinto de tudo o que se viu até hoje em termos de crise capitalista. Só é igual a de 30 na gravidade; e pode ser pior. Em 30 não tivemos uma ruptura de paradigma, exceto para romper o padrão ouro. Mas a indústria era fordista e continuou fordista, durante e depois da crise. Agora, parece que o padrão industrial se esgotou. Pior: ao contrário do mundo que emergiu após 30, não se vê uma força ordenadora capaz de injetar coerência na economia mundial. Ninguém sabe para onde vão os EUA; nem eles. Significa que a desordem pode demorar muito tempo.

Se o PT, finalmente, criará uma Escola de Formação Política, só tenho a comemorar. Chega em boa hora. O fato é que o colapso da agenda neoliberal tem que ser profundamente discutido. E isso tem a ver com o PT também. Essa agenda penetrou as entranhas de toda sociedade e o partido não foi poupado. Vide a posição que se esboçou em relação à Previdência Social, por exemplo; e mesmo em relação à dita autonomia do BC. Pallocci diz que está fora se o PT continuar criticando o Banco Central? É um favor que ele nos faz.

VIII) Quando me aproximei do PT em 1989 achavam que eu era reformista; hoje estou à esquerda
O PT já teve uma agenda consistente de reformas, aquela de 94 e 98; trata-se de retomá-la; submetê-la aos desafios da atual crise e abrir um ciclo de debates e de esclarecimento dentro do partido com dois horizontes: o de longo prazo, na análise desse colapso e do colapso do ideário neoliberal no mundo. Mas no curto prazo é preciso avaliar o que é possível e necessário para defender o país da desordem internacional. Não se pode confundir os dois tempos, ou daqui a pouco tem gente querendo reduzir jornada de trabalho e manter salário. É bonito. Mas vai acontecer? Não. Então não dá para jogar o partido em coisas desse tipo. É preciso ter respostas de curto e longo prazo.

É uma agenda para um debate interno. Fico feliz que o partido, finalmente, se abra a isso. Quando entrei no PT em 1989 muitos me olhavam com reticência; achavam que eu era uma reformista conservadora. Hoje dizem que estou à esquerda, mas eu não saí do meu lugar. É uma boa hora para resgatar a vida intelectual dentro do partido.

IX) Dilma tem uma visão histórica mais consistente que a do Serra
Estou otimista com a chance da Dilma ocupar a Presidência da República. Sim, já fui muito ligada ao Serra; conheço ambos. A diferença entre o desenvolvimentismo da Dilma e o do Serra é que a visão histórica e política da Dilma é mais consistente. O Serra, diga-se, não é um neoliberal; e isso é bom porque vai elevar o debate eleitoral em 2010. Mas o desenvolvimentismo do Serra é um desenvolvimentismo de boca. Ele se opunha ao Malan, é verdade (no governo FHC). Mas nunca se opôs às privatizações nem à política fiscal ortodoxa, concebida por gente da sua influência. É muito diferente da Dilma. De qualquer forma, fico feliz que a luta seja entre os dois. O país vai ganhar com isso. A sociedade entenderá as diferenças entre projetos que têm nomes parecidos, como desenvolvimento, mas que envolvem forças e concepções distintas, especialmente na sua dimensão social e na sua correspondência democrática. É aí que está a força da Dilma.

Será mais fácil negociar um projeto nacional de desenvolvimento tendo Serra e Dilma no embate. Melhor do que ter uma sociedade rachada entre um neoliberal de direita e um candidato nosso, de centro esquerda. Ontem, como hoje, e amanhã também, teremos que negociar um projeto nacional. Duas candidaturas que ao menos falem uma língua próxima facilitará a compreensão dos brasileiros; ajudará a somar forças.

É mais uma razão para o PT se preparar e definir, afinal, qual é o desenvolvimento que defende. O resultado de 2010 dependerá de tudo isso. Mas, sobretudo, vai depender da nossa capacidade de atravessar com sucesso 2009. Espero que seja um bom ano. Para todos nós. E para o bem do Brasil.

Fonte: Agência Carta Maior

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Quem ameaça a democracia?

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Quem conspira contra o habeas corpus?


por Maria Inês Nassif - no Valor Econômico

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, ao discursar na Câmara por ocasião dos 40 anos do malfadado Ato Institucional nº5, um instrumento de força que deu ao regime militar poder de vida e morte sobre os brasileiros, falou contra uma suposta articulação em favor da limitação do habeas corpus, garantia constitucional que o regime ditatorial jogou no lixo. "É fundamental que neste dia em que lembramos do AI-5, ressaltemos a necessidade de preservação do habeas corpus, não a sua limitação. O habeas corpus é a garantia dos direitos judiciais", disse o ministro. Em algum lugar da internet, é possível ler, junto com a "denúncia" de Mendes, a informação de que "no Congresso, parlamentares defenderam silenciosamente a limitação na concessão de habeas corpus depois que Mendes autorizou por duas vezes a libertação do banqueiro Daniel Dantas, do Opportunity, durante a Operação Satiagraha".

Vai saber o que é uma "defesa silenciosa" - mas, no final das contas, a "denúncia" de Mendes sugere que se entenda, como se verdade fosse, que ele se insurge contra setores antidemocráticos do Congresso que querem limitar o habeas corpus. Não existe nenhum movimento para reduzir as prerrogativas do STF ou os direitos individuais. O que existe é um grande desconforto em relação às suas "denúncias", decisões, ataques indiscriminados a outros poderes ou mesmo a instâncias inferiores da Justiça e à forma de confrontar autoridades.

Mendes libertou duas vezes o empresário Daniel Dantas, preso por ordem expedida por um juiz de primeira instância, e não pelo poder discricionário de um "estado policial". Antes, com igual eficiência, havia libertado presos das operações Anaconda, Hurricane e Navalha. Soltou os cachorros contra a Polícia Federal e contra o juiz Fausto de Sanctis, da 6Vara Federal Criminal de São Paulo, responsáveis pela prisão de Dantas, em defesa do preso - desqualificou, portanto, o trabalho do juiz e da polícia. Ameaçou punir o juiz. Foi alvo de manifestos nacionais em favor de seu impeachment e de outros tantos protestos contra sua decisão. Daí, muitas decisões depois, todo o mal-estar causado por uma aversão explícita a operações da Polícia Federal que resultaram em prisão de gente mais ou menos graúda é transformado num complô contra o instituto do habeas corpus, e o presidente do Supremo se apresenta como se fosse o único defensor de prerrogativas constitucionais.

Para que não paire qualquer confusão, observe-se o seguinte: setores que se envolveram seriamente na luta pela conquista das liberdades democráticas se insurgiram, sim, contra decisões do ministro Gilmar Mendes, mas por mais que se procure em conversas e arquivos não existe registro de qualquer movimento para reduzir o instituto do habeas corpus, como "denunciou" o presidente do STF. A insurgência foi contra atos seus, não contra o instituto. Não existe uma conspiração contra a democracia. E Mendes está longe de ser o bastião das liberdades democráticas.

Aliás, preocupante é o anúncio do ministro, que também preside o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), de que o órgão de controle do Judiciário estuda uma "resolução para fazer o acompanhamento de modo a ter uma retificação eventual dos fundamentos da prisão preventiva". Nesses tempos bicudos, isso não significa apenas mais uma forma de controle do presidente do Supremo sobre as prisões decretadas por juízes de instâncias inferiores. Significa que Mendes investe mais uma vez para controlar decisões dos juízes.

Para registro para a posteridade, vai em seguida uma pequena lista das "denúncias" e "protestos" do ministro: contra o "aparelhamento" do funcionalismo público (referência a uma suposta partidarização da PF); contra o "independentismo" da Justiça (não o seu, certamente, mas o dos juízes de primeira instância); contra a invasão da reitoria da UnB, em abril; contra o excesso de prisões preventivas; contra a opinião do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de que a absolvição do fazendeiro que seria o mandante da morte da missionária Dorothy Stang depunha contra o Brasil; contra a "espetacularização" da PF; contra as investigações sigilosas feitas pelo Ministério Público; contra as trocas de partidos por parlamentares; contra a lentidão da Justiça; contra o excesso de edições de medidas provisórias; contra o fato de o ministro da Justiça, Tarso Genro, não ter aprovado a soltura de Dantas ("Ele não tem competência para opinar sobre o assunto", disse); contra o fato de a ministra Dilma Rousseff ter opinado que crime de tortura é imprescritível ("Terrorismo também é imprescritível", afirmou ele, certamente apontando o dedo para a ministra, que militou, na época da ditadura, em um grupo armado); contra o que chamou de "estado policial", comparando-o à KGB; e contra o MST. De outro lado, considerou dentro da normalidade a intervenção do Judiciário em questões onde não houver consenso entre governo e oposição.

A lista de "competências" para opinar que se delega o presidente do Supremo, bem como a sua agressividade, tem colocado os demais poderes na defensiva. Enquanto Executivo e Judiciário recuam diante do presidente do Supremo, este avança sobre assuntos que não são seus. Confia que ninguém vai pagar para ver uma crise institucional.

Que Papai Noel presenteie o Brasil, em 2009, com uma democracia mais equilibrada. Aliás, com mais democracia. Quando um presidente de um poder se julga com mais poder do que tem, isso é subtração de democracia.

Fonte: Blog do Luis Nassif

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quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Artigo: A crise capitalista e a disputa política no Brasil

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A crise capitalista em curso no mundo e, por conseguinte, também no Brasil, não deve ser encarada como um episódio isolado. Para ser verdadeiramente dimensionada, precisa ser apreciada e compreendida em sua real dimensão histórica, como resultante de um processo que envolve disputas e conflitos.

Por Divanildo Pereira*


Quem paga a conta?

Em permanente luta pela sobrevivência, o sistema capitalista utilizou-se, sobretudo a partir dos anos 80, de uma nova roupagem. Com ela, procurou revestir velhos conceitos teóricos, perseguindo a mais ampla desregulamentação da economia a fim de liberalizar ao máximo o fluxo de capitais em todo o mundo.

Como complemento ao receituário no qual o Estado tornava-se desnecessário até mesmo como ente regulador, ativos públicos foram transferidos para a iniciativa privada, o trabalho foi precarizado, históricos direitos trabalhistas foram atacados – quando não suprimidos, e a economia foi progressivamente financeirizada.

Finalmente, depois de propagado e encampado por elites econômicas e políticas em todos os continentes, esse modelo de criação de riqueza virtual sucumbiu. E sob os seus escombros, vozes que antes o enalteciam, hoje fazem uma espécie de “mea culpa”, buscando nos cofres do Estado que tanto combateram a saída para a sobrevivência do próprio sistema.

Por outro lado, aqueles que resistiram e combateram tais fundamentos, sobretudo, por sentirem na pele as conseqüências nefastas da implantação do “novo” modelo, não ficarão imunes. Os efeitos da crise, que teve como epicentro o capitalismo financeirizado, em verdade, já se fazem sentir na chamada economia real.

É como disse o vice-presidente da CTB, Nivaldo Santana, em recente manifestação: “Quando a economia está em processo de crescimento, os últimos a serem beneficiados são os trabalhadores e trabalhadoras, mas quando ela está em desaceleração, são os primeiros e primeiras a serem chamados para pagar a conta".

O papel da mídia

Diante da crise e de seus possíveis desdobramentos, as forças políticas e sociais tendem a intensificar as disputas no terreno econômico e, principalmente, no plano ideológico. No Brasil, isso fica mais evidente pelo enfoque e dimensão que a chamada grande mídia vem dando ao assunto. Logo ela, destacada porta-voz do pensamento neoliberal.

A serviço das forças conservadoras, esses veículos tratam já de preparar um ambiente mais propício para a grande batalha eleitoral de 2010, para, no momento certo, jogar toda a responsabilidade pelas conseqüências econômicas e sociais da crise na "incapacidade" do governo Lula para enfrentá-la.

Encruzilhada política

Diante das circunstâncias, podemos afirmar que o Governo Lula vive uma encruzilhada política (e não só econômica!): ou decide destravar as amarras que hoje impedem um crescimento econômico capaz de enfrentar o atual cenário, buscando o fortalecimento da economia nacional e dos seus instrumentos indutores (sistema financeiro público e empresas estatais) para fomentar o consumo popular e a atividade produtiva, ou continua com sua híbrida política macroeconômica, de viés contracionista, que tem na manutenção das mais altas taxas de juros do mundo um dos grandes contra-sensos, sobretudo na realidade atual. E essa última opção – claro – põe em risco as conquistas do próprio governo.

A decisão do Copom do Banco Central, em sua última reunião, de manter as taxas de juros atuais, expressa essa dualidade e a força política que a elite brasileira e seus aliados ainda detêm, dando a essa instituição um caráter independente, deslocado de um projeto nacional de desenvolvimento. Não à toa, ele está dirigido por um banqueiro.

A depender da escolha do presidente Lula sobre qual o caminho a trilhar, podem se estabelecer as condições objetivas favoráveis ou não à sua sucessão.

A crise, a Petrobras e o sistema financeiro público

Enquanto empresa de economia mista e tendo o Estado brasileiro poder de decisão sobre ela, a Petrobras, ao longo do Governo Lula se constituiu num dos grandes instrumentos indutores de nossa economia: ampliou seus níveis de investimento; focou em exigências nos índices de nacionalização nas contratações de bens e serviços, propiciando a retomada de várias atividades econômicas, com destaque para a indústria naval e toda a sua cadeia produtiva; descobriu reservas que colocam o Brasil entre os grandes no cenário energético mundial.

O Programa de Aceleração do Crescimento – PAC, passo importante dado pelo Governo Lula no rumo de uma agenda desenvolvimentista, prevê investimentos de R$ 503,9 bilhões, sendo 34% deste montante oriundo da carteira de projetos do sistema Petrobras. Não à toa, a atividade petrolífera no Brasil representa hoje 10% do PIB.

Realçamos, mais uma vez, esses dados para melhor compreendermos as razões pelas quais a coalizão da direita brasileira, centrada no PSDB/DEM/PPS, realiza uma tática desestabilizadora sobre a gestão dessa empresa. As mesmas atitudes eles patrocinaram quando da aprovação da medida provisória 443 que possibilita o fortalecimento do papel do sistema público financeiro brasileiro (Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal) e quando da criação do fundo soberano.

Na verdade, a direita sabe que a viabilização e a consecução vitoriosa desses programas e medidas, podem constituir importantes contra-tendências aos efeitos da crise capitalista no país e por isso, a todo custo, lutam para inviabilizá-las. Eles apostam no pior para tentarem chegar em melhores condições políticas no pleito de 2010.

O papel dos movimentos sociais

As conseqüências econômicas e sociais da crise, as medidas que o governo Lula venha a adotar para enfrentá-la, como também as do segmento industrial e de serviços no país, combinadas com a disputa política de 2010, tendem a elevar a temperatura da luta de classes no Brasil. E dentro dessa perspectiva, cresce ainda mais o papel dos movimentos sociais.

O êxito da 5ª Marcha a Brasília, com a presença de 35 mil pessoas, é uma manifestação dessa tendência. Ali, os movimentos sociais, sobretudo, os trabalhadores e trabalhadoras coordenados pelas mais representativas centrais sindicais do Brasil (CUT, CTB, Força Sindical, UGT, CGTB e Nova Central), deixaram um recado ao executivo, ao parlamento e ao patronato: não admitiremos pagar mais uma vez uma conta que não geramos. Essa Marcha, apesar de muito importante, foi apenas um começo para as necessárias batalhas que ainda haveremos de realizar.

A unidade política é decisiva

Devemos também realçar um fato importante para os movimentos sociais e, em particular, para o movimento sindical: uma das razões – além daquelas de ordem objetiva, para o sucesso do recente ato na capital brasileira, foi o maior amadurecimento político do sindicalismo brasileiro, sem o qual não teria sido possível uma estratégia de unidade na ação política, e nem a elaboração de uma plataforma comum entre as centrais sindicais envolvidas, pautada na defesa da adoção de um projeto nacional de desenvolvimento com valorização do trabalho.

Esse patrimônio político acumulado pelo movimento precisa desenvolver-se ainda mais e as amplas e necessárias mobilizações contra a especulação financeira, pelo controle dos fluxos de capitais e do câmbio, pela ratificação das convenções 151 e 158, além da redução da jornada de trabalho sem redução salarial, dentre outras, devem adquirir maior convicção junto a classe trabalhadora brasileira.

Para cumprir esse objetivo, que já está na ordem-do-dia, miremos o exemplo dos trabalhadores e trabalhadoras franceses. Em fevereiro do próximo ano, eles realizarão um grande encontro nacional para formular e unificar ações que sejam capazes de enfrentar os efeitos da crise capitalista atual.

Trabalhadores e trabalhadoras do Brasil: uni-vos, já!

Não é hora de atomizarmos nossa ação política, mas ao contrário: devemos unir nossas forças, politizar nosso diálogo com os trabalhadores e trabalhadoras, levando-os a refletir sobre as raízes dos problemas atuais e a encontrar formas de interferir na grande disputa política em curso no país.

Está na hora, portanto, de o movimento sindical brasileiro, a partir das centrais interessadas na defesa da agenda daqueles que vivem do trabalho, bem como, na implementação de transformações estratégicas em nosso país, viabilizar, o quanto antes, as condições para a convocação de uma instância política capaz de unificar nossas ações e, com a força dessa unidade política, proteger o povo, a classe trabalhadora brasileira e seus aliados.

* Divanilton Pereira é diretor-executivo nacional de energia da CTB e da Federação Única dos Petroleiros e membro do Comitê Central do Partido Comunista do Brasil.

Fonte: Portal Vermelho

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