segunda-feira, 14 de abril de 2008

A culpa não é dos pobres


Houve um tremendo frisson mundial nos últimos dias, por conta de análises preocupantes do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial sobre a escassez global alimentos, o maior motor inflacionário atual. Lula afirmou que o fato era, de certo modo, bem-vindo, uma vez que os pobres estariam comendo mais.

O presidente tem razão. Há um acelerado aumento do poder de compra de famílias que nem sequer chegavam perto de vendinhas, e hoje podem bicar o mercado de consumo. O fenômeno acontece na maioria dos países emergentes, com vastas populações.

O tema segurança alimentar, finalmente, deixou de ser pauta apenas das reuniões dos economistas com viés humanitário. Mas não é o caso de se culpar os pobres e o etanol. Ou apenas os pobres e o etanol. Tem mais gente na jogada.

Segundo blogs especializados, diante da crise financeira, os hedge funds (fundos especulativos) estão migrando para o mercado de commodities. Os recursos aplicados em metais e produtos agrícolas cresceram 83%, de 14 bilhões de dólares em 2005 para 55 bilhões de dólares em 2007. É uma oportunidade de negócios e de lucros, com as bolsas em queda no mundo inteiro.

Essa invasão dos financistas na produção física global é, hoje, um dos propulsores do crescimento vertiginoso dos preços dos alimentos. E só tende a se acentuar, com a queda do juro americano.

Falta ainda alargar a discussão. Ladislau Dowbor, consultor e professor da Pós-Graduação da PUC-SP, considera que não há mais o clássico dilema econômico entre produzir manteiga ou canhões. Na avaliação do economista, o mundo produz bens inúteis demais, substituíveis demais, efêmeros demais, para uma meia dúzia de sempre.

Está na hora de se discutir a oferta de alimentos de maneira não-alarmista. O problema não pode mais ser tratado com leviandade entre os preconceituosamente chamados de eco-chatos e o mercado financeiro.

Dica econômico-cultural
Para os interessados no aprofundamento do tema, digitem http://www.earth-policy.org. É o site do Earth Policy Institute, dirigido por Lester Brown, um dos maiores economistas contemporâneos especializado em meio-ambiente e segurança alimentar.

Na batida da semana
Os próximos três dias serão dedicados ao Copom, que se reúne na terça-feira 15 e quarta 16 e anuncia sua decisão sobre a taxa básica de juro. Já houve ruído suficiente, com interpretações exóticas sobre uma declaração de Lula na Holanda, na sexta 11, traduzida pelos jornais como um recado de que ele havia dado aval ao Banco Central para aumentar o juro. O presidente negou a fantasia, no sábado 12, quando visitava a República Theca. Esse será o tema predileto dos oráculos de plantão no mercado financeiro.

Na terça 15, o IBGE divulga os dados de vendas do comércio varejista no País em fevereiro, que devem mostrar arrefecimento. Mas isso não demoverá os altistas de alardear a alta da Taxa Selic.

Lá fora, o mais importante são os dados americanos sobre o índice de preços ao consumidor, a construção de novas moradias e a produção industrial, referentes a março. Saem todos na quarta 16, além do Livro Bege, um extensivo levantamento sobre a situação econômica dos Estados Unidos.

Fonte: Carta Capital
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