quinta-feira, 29 de novembro de 2007

A farsa de Annapolis (parte 4) - por Uri Avnery - fonte: http://blogdobourdoukan.blogspot.com/


A farsa de Annapolis

Uri Avnery disse(4)*

Esta semana, o parlamento israelense aprovou lei que exige maioria de 2/3 dos votos para qualquer modificação nas fronteiras da Grande Jerusalém. Isto significa que Olmert não pode ceder nem uma, que fosse, das cidades palestinas anexadas a Jerusalém em 1967. E também está proibido até de aproximar-se dos problemas que constituem “o núcleo duro” do conflito.

Ehud Olmert exigiu que, antes de iniciar as negociações, os palestinos “reconheçam Israel como Estado judeu”. Fez-lhe eco seu parceiro de coalizão, o ultradireitista Avigdor Liberman, que propôs que Israel não vá a Annapolis, de uma vez por todas, se os palestinos não cumprirem esta exigência prévia.


Examinemos, por um momento, a exigência de Olmert:Os palestinos não têm de reconhecer o Estado de Israel. Afinal de contas, já fizeram exatamente isto no acordo de Oslo – embora Israel ainda não tenha reconhecido o direito dos palestinos a um Estado próprio, nos limites da Linha Verde.


Não, não é isto. O governo de Israel exige muito mais do que isto: os palestinos têm de reconhecer Israel como “Estado judeu”.


Algum dia os EUA exigiram que alguém os reconhecesse como “Estado cristão” ou como “Estado anglo-saxão”?


Stálin algum dia exigiu que os EUA reconhecessem a URSS como “Estado comunista”? A Polônia exige que se a reconheça como “Estado católico”, ou o Paquistão, como “Estado islâmico”? Há algum precedente de Estado que tenha exigido reconhecimento de seu regime doméstico?


A exigência é ridícula per se. O que facilmente se demonstra mediante demonstração ad absurdum.O que é um "Estado judeu"? Jamais se falou disto. Será um Estado com maioria de cidadãos judeus? Será “o Estado dos judeus” – quer dizer, dos judeus do Brooklyn, de Paris e de Moscou?


Será "um Estado pertencente à religião judaica" – neste caso, porém, incluindo também judeus seculares? Ou talvez pertença só aos judeus incluídos na “Lei do Retorno” – i.e. aos filhos de mãe judaica que não se converteram a qualquer outra religião?


Nenhuma destas questões está decidida. Os palestinos, então, terão de reconhecer algo que não está reconhecido sequer em Israel?

*Uri Avnery é membro fundador do Gush Shalom (Bloco da Paz israelense). Adolescente, Avnery foi combatente no Irgun e mais tarde soldado no exército israelita. Foi três vezes deputado no Knesset (parlamento). Foi o primeiro israelense a estabelecer contato com a liderança da Organização para a Libertação da Palestina (OLP) em 1974. Foi durante quarenta anos editor-chefe da revista noticiosa Ha'olam Haze. É autor de numerosos livros sobre a ocupação israelense da Palestina, incluindo My Friend, the Enemy (Meu amigo, o inimigo) e Two People, Two States (Dois povos, dois Estados).
A íntegra de seus artigos encontra-se neste blog.
Tradução de Caia Fittipaldi

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