por Luiz Carlos Azenha
Injustificável, para quem olha de fora, a decisão do presidente do Equador, Rafael Correa, de despachar tropas do Exército para ocupar as obras da construtura Odebrecht no país. Como é impossível confiar nas informações que nos são prestadas pela mídia corporativa, prefiro aguardar melhores esclarecimentos das duas partes.
De qualquer forma, transmito a vocês algumas impressões de minhas viagens à América Latina.
Em primeiro lugar, algo de que a mídia brasileira nunca se deu conta: existe ressentimento em toda a América do Sul contra o domínio econômico do Brasil. Ouvi falar em "imperialismo" brasileiro tanto na Colômbia quanto no Paraguai, por conta da presença de empresários brasileiros no controle de áreas-chave das economias locais.
Em segundo lugar, o poder eleitoral do "espantalho estrangeiro", exista ele ou não de fato, é grande. Ajuda a explicar a decisão de Hugo Chávez de expulsar o embaixador dos Estados Unidos. Dia 23 de novembro há eleições na Venezuela. Ajuda a explicar a decisão de Rafael Correa. Domingo que vem tem plebiscito no Equador.
Em terceiro lugar, existe um profundo descompasso entre as grandes corporações capitalistas e o interesse público. Está claro no que aconteceu em Wall Street. O presidente Lula fez um discurso duríssimo na ONU. O presidente da França, Nicolas Sarkozy, também. Não se pode dizer que os dois sejam "de esquerda". Nem que sejam anti-americanos. Nem que sejam anti-imperialistas.
Enquanto você lê este texto centenas de milhares de norte-americanos escrevem e telefonam furiosamente para os seus representantes no Congresso para se manifestar contra o pacote de resgate de 700 bilhões de dólares para instituições financeiras. É uma revolta como há muito não se via nos Estados Unidos. A percepção é de que os banqueiros lucraram imensamente e agora, que correm o risco de perder dinheiro, estão socializando os prejuízos. Tudo indica que algum pacote será aprovado. Mas existe oposição tanto de republicanos quanto de democratas. O que está na base da revolta? O descompasso entre o interesse das empresas e o dos contribuintes.
Minha previsão é de que está acabando a era em que os lucros das empresas ficam acima de tudo. A tal "responsabilidade social" não poderá ficar restrita aos comerciais de TV. Se as grandes empresas brasileiras quiserem expandir os seus negócios na região terão que adotar:
1. diplomacia privada, para suscitar boa vontade nos países em que atuarem (não estou falando de pagar propina aos políticos);
2. compromisso social com as comunidades locais (estou falando em construir creches e promover campeonatos de futebol).
Ontem me diverti muito com uma reportagem -- muito boa, por sinal -- do Valor Econômico sobre a ferrovia Norte-Sul, em que o repórter não se conforma com o fato de que os moradores de Tocantins não demonstram entusiasmo pelo projeto.
"Por mais estranho que seja, há uma sensação generalizada entre aqueles que não estão diretamente ligados à produção de soja de que a ferrovia será apenas isso, uma ferrovia; e não o catalisador de uma onda de desenvolvimento econômico poderoso", escreveu o repórter.
Pois eu digo: no Brasil os grandes projetos de desenvolvimento econômico são "grandes" para a minoria. Servem essencialmente aos grandes interesses econômicos. Quem é que vai ganhar com as hidrelétricas na Amazônia? Acima de tudo, as mineradoras. Enquanto os governos e as empresas não se derem conta de que é preciso atender aos interesses locais, o risco de oposição aos projetos é grande.
No Brasil, no Equador, na Bolívia, na Venezuela e no Paraguai. E até nos Estados Unidos.
Com a internet e a disseminação de informações em ritmo alucinado, hoje um morador de Peoria, Illinois, sabe exatamente quanto a empresa brasileira instalada lá está faturando no resto do mundo. E, com certeza, vai exigir a sua parte.
Fonte: Vi o Mundo
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