segunda-feira, 22 de setembro de 2008

O passado volta para assombrar McCain

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por Luiz Carlos Azenha

A crise no mercado financeiro ofereceu ao candidato democrata Barack Obama uma oportunidade extraordinária: a de "governar" em plena campanha eleitoral. O senador está em uma posição invejável para influenciar a formulação do pacote federal de ajuda aos bancos. Tem ao lado dele a liderança do Partido Democrata, que controla o Congresso. Sem apoio no Congresso não há chance de aprovação da medida.

Em discursos, o democrata já disse que quer algum tipo de apoio aos mutuários que correm o risco de perder suas casas. Obama não descartou a idéia de, se eleito, manter no poder o atual secretário do Tesouro, Henry Paulson, que tudo indica receberá poderes extraordinários. Eles incluem a garantia de imunidade contra futuros processos na Justiça.

O jogo eleitoral nos Estados Unidos está longe de se definir. Faltam 43 dias para a escolha do sucessor de George W. Bush. O primeiro debate presidencial acontece na próxima sexta-feira, na Universidade do Mississipi.

Mas o terremoto em Wall Street colocou o eleitorado em estado de alerta. A cifra de U$ 700 bilhões -- que é quanto o Tesouro americano pretende gastar no socorro às instituições financeiras -- é assustadora. Além disso, o tremor na bolsa de Nova York afeta diretamente a um grande número de norte-americanos. Mais de 50% deles têm alguma forma de poupança ligada à variação das ações de Wall Street.

O cenário da disputa eleitoral mudou completamente nos últimos dias, por três motivos.

O primeiro é que o republicano John McCain, para reanimar a coalizão que levou George W. Bush duas vezes à Casa Branca, endossou os cortes de impostos propostos pelo presidente e pretende torná-los permanentes. Ele também se definiu como alguém que quer tirar o governo das costas do contribuinte. Essas duas idéias, por mais atraentes que sejam, parecem fora de lugar num momento em que o governo promove a maior intervenção estatal na economia norte-americana desde sempre. Voltar a taxar os mais ricos -- como propõe Obama -- é uma idéia que ganha apelo popular.

O democrata já tem lembrado aos eleitores uma definição que o próprio McCain assumiu: o de que é "fundamentalmente um desregulamentador", ou seja, um demolidor da capacidade do governo de regulamentar os mercados. Quando existe um consenso de que esse foi um dos motivos causadores do colapso financeiro, McCain corre o risco de parecer um homem das cavernas.

O segundo motivo é que o próprio republicano cometeu uma gafe séria logo que pipocou a crise em Wall Street. Ele repetiu uma formulação cara ao presidente George Bush, segundo a qual "os fundamentos da economia dos Estados Unidos estão fortes". É uma questão discutível. Porém, do ponto-de-vista político, dizer isso é assumir um risco. O de parecer desplugado, num momento de grande preocupação para o eleitorado. Não se sabe ainda qual será o impacto do baque financeiro na economia real, ou seja, se haverá uma escalada do desemprego e da inflação.

O terceiro motivo é a ligação de John McCain com o escândalo das empresas de poupança no final dos anos 80. É um tema que ficou de fora da campanha eleitoral até agora. McCain é um dos "Keating Five", os cinco senadores que fizeram lobby para Charles Keating, dono de uma empresa de poupança que cumpriu cinco anos de pena por envolvimento no escândalo. Uma parceria tão tóxica quanto os papéis que contaminaram o mercado financeiro.

O republicano foi censurado pelos colegas pelo envolvimento com Keating. McCain e a mulher, Cindy, usaram nove vezes o jato particular do empresário para viajar até um resort nas Bahamas, de propriedade de Keating, para descansar. Cindy e o pai dela, um magnata da distribuição de cerveja, investiram em um shopping center de propriedade de Keating.

Ao todo, 747 empresas de poupança e empréstimos federais faliram na crise dos Savings and Loans. Na época, fiscais do governo fizeram alertas sobre a possibilidade de quebradeira. Foram voto vencido. Poupadores e o Tesouro americano ficaram com o prejuízo.

Agora a crise se repete, com dimensões muito maiores. Desta vez, sem que tenha havido alertas por parte do governo. Isso se deve, acima de tudo, às mudanças de legislação que enfraqueceram a capacidade estatal de vigiar o mercado. Elas foram patrocinadas especialmente por Phil Gramm, um senador que é um dos assessores de McCain para assuntos econômicos.

Fonte: Carta Capital

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