sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Blog do Sakamoto

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por Leonardo Sakamoto

O custo de brigar com o mundo inteiro


Washington - Tive que ir a um shopping na rua 14th para comprar umas coisas para o nosso escritório. Mas devido a uma ameaça de bomba, o local teve que ser esvaziado, isolado e farejado com a unidade K-9, ou seja, pela cachorrada.



(Li tempos atrás que, no início, tentaram empregar labradores para esse serviço. Mas não teria dado muito certo: a raça é naturalmente brincalhona e estabanada e era comum os cachorros irem pelos ares junto com os “pacotes” depois de achá-los...)



Depois de uma longa espera, calçada, rua e shopping foram liberados. Creio que não encontraram nada, mas também não acho que eles falariam: “Hey, pessoaaaaal. A gente encontrou dois quilos de explosiiiiiiivos amarrados com bolas de guuuude!”

Para o pessoal ao meu lado que aguardava a reabertura das portas, o fato parecia corriqueiro. Paranóia banalizada. Reclamavam apenas do atraso que isso estava gerando. Uma senhora em uma cadeia de rodas, quando informada do porque daquilo, reclamou: “Mas, de novo?!”

É... Entrar em guerra com o mundo tem seu preço.

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Condoleezza e a foto que vale por mil palavras

Washington - Passando o hall de entrada do Departamento de Estado norte-americano e virando à esquerda em direção às salas de conferência, há um corredor com fotos da atual administração.

Participei de um evento sobre o combate ao trabalho escravo por lá e queria muito ter tirado foto de duas imagens que estavam penduradas na parede. Mas o tempo foi corrido... Além disso, deve ser proibido - até para ir ao banheiro eu tive escolta (que ficou do lado de fora, é claro). Depois que saí, fui pedir a benção para Santo Google, padroeiro dos jornalistas, e as encontrei na rede.

Duas das imagens me chamaram a atenção. Em uma, o homem que está por trás da agressiva política externa norte-americana nos últimos anos tem um encontro com a secretária de Estado Condoleezza Rice. Em outra, outro homem, que ajuda o primeiro a cumprir essa política externa agressiva, também tem um encontro com ela. São fotos com climas bem diferentes, a bem da verdade.







Você, no fundo, no fundo, seria capaz de dizer qual é qual?...

PS: Tempos atrás, um dos comediantes do Saturday Night Live, programa de humor daqui que pode ser visto no Brasil, interpretou Dicky Cheney, simulando um comunicado à nação: "Meu caros cidadãos, aqui quem fala é o seu 'vice' presidente", frisando com um sorrisinho maroto e abrindo aspas com os dedos para a palavra vice. No mesmo quadro, Bush aparecia como uma pessoa perdida que pedia conselhos para o "tio" Dicky.

Só para completar: não sei se já chegou ao Brasil o episódio do Saturday Night Live em que a comecidante Tina Fey imita a candidada republicana à vice-presidência Sarah Palin. Na hora em que Palin foi anunciada, tinha certeza que ia rolar essa imitação, porque as duas parecem ter sido separadas no nascimento. Dito e feito, hilário.

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Felicidade é... uma cadeira de plástico vagabunda

Washington - O que o Congresso dos Estados Unidos e a casa dos meus pais têm em comum? Bem, é verdade que muitos dos que me lêem nunca estiveram em ambos os lugares - pelo menos, não na casa dos meus pais, eu garanto. Por isso, certamente, o Congresso leva vantagem em número de visitantes. E também há uma leve diferença no orçamento de ambos - meu pai que o diga. Além do fato de um ficar na capital do império, outro não muito distante do centrinho comercial do Campo Limpo, na periferia de São Paulo. Mas perto da casa dos meus pais tinha a venda do Sr. Armando, onde comprei o primeiro chocolate "Surpresa", e o Bazar do Sr. Vitório (que Deus o tenha), onde ia buscar papel de seda - para pipa... - além de vareta e linha 10.

É a segunda vez que bato perna no Congresso daqui para fazer reuniões e entrevistas. Mas é a primeira que percebo que os nobres deputados, que discutem a invasão de outros países ou se vale a pena salvar uma empresa com 85 bilhões de dinheiro público, são fãs, quem diria, das famigeradas cadeiras de plástico. Daquelas presentes em cozinhas, colocadas em volta de churrasqueiras, usadas em humildes templos evangélicos ou por seguranças noturnos que passam a noite sentados com seus inseparáveis pastores-alemães caducos de velhos, apitando de vez em quando para fazer valer o salário. Aquelas que são o terror dos gordos, já que arregam diante de um traseiro mais largo.





Meus pais têm algumas na área de serviço, naquilo que, um dia, já foi o meu quarto e no corredor onde habita a cachorra da casa - uma senhora de 17 anos, cega e surda. Melhor para ela, porque bater a cabeça em cadeira de plástico não dói. Enfim, essas cadeiras são baratas, são simpáticas e fáceis de limpar. A alegria da periferia!

No Congresso do país mais rico do mundo, pelas latinhas que jaziam ao lado das ditas, agrupadas, como se conversassem ainda, mesmo sem seus donos, o local deve ser divertido em algum momento do dia. Percebam que até no final dessa grande sacada há outros grupos de cadeiras, mostrando que não foi um caso isolado, mas algo adotado por mais de um congressista. Talvez até com solidário carinho.

Moral da história: para que um lugar suntuoso, de mármore de cima a baixo, obras de arte e murais, tapeçarias, se, no final das contas, a felicidade reside em uma simples cadeira de plástico vagabunda?

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Sakamoto com Tutu

Los Angeles - O evento de premiação do Freedom Awards (ao qual me refiro no post anterior) foi uma produção hollywoodiana. Coral, cantores, imagens do nosso trabalho e dos outros ganhadores passando em telões, celebridades do "show business" (alguém ainda usa essa expressão?) Antes da cerimônia, houve uma recepção ao ar livre – a entrega foi na Universidade do Sudoeste da Califórnia, um belo campus.

Depois conto mais sobre os outros premiados. Mas a história mais impressionante é a do Ricky, que coordena um programa de reinserção de crianças-soldados-escravos em Uganda (e voce achava que a sua vida era ruim, não?) Ele mesmo foi um ex-soldado-mirim, que fugiu depois de seis anos na trincheira.

Na nossa hora de receber a estatueta, fomos Xavier Plassat, da Comissão Pastoral da Terra, e eu ao palco. Ele convidou para o evento Tom Stang, irmão de Dorothy Stang, missionária assassinada por fazendeiros no Pará em 2004 devido à sua luta pelos direitos dos trabalhadores rurais, e que mora por aqui. Segue o meu discurso:

“Muita gente em todo o mundo tem lucros absurdos com a superexploração do trabalho. Dinheiro é poder. E, muitas vezes, poder precisa de violência para se manter. Muitos fazendeiros ricos se sentem confortáveis para estabelecer sua própria lei e usar trabalho escravo no Brasil. Há corporações internacionais que apóiam essas práticas, sempre pedindo mais por menos, sem se preocupar com as pessoas que serão esmagadas para isso acontecer.

Ao mesmo tempo, a pobreza cria seus escravos. Por isso, o fim da escravidão depende do fim da desigualdade social. O que requer uma redistribuição de renda, de oportunidades, de terras e de justiça, garantindo melhores condições de vida a todos. Quando isso acontecer, os trabalhadores rurais serão realmente livres. Nós dedicamos este prêmio à próxima geração de trabalhadores rurais do mundo. Que eles possam desfrutar da liberdade negada a seus pais.”

Meio raivoso. Mas em um mundo em que todos os problemas parecem que podem ser resolvidos com saídas superficiais e cestas básicas, é sempre bom lembrar que o buraco é mais embaixo.



O bispo Desmond Tutu, Nobel da Paz em 1984 e lutador pelo fim do Apartheid na Africa do Sul, foi o barato da noite. O velhinho é uma figura, dança, canta e tem o senso de humor - que tanto nos falta nesses dias sérios demais.

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Repórter Brasil e CPT recebem o Freedom Awards

Los Angeles - Estou nos Estados Unidos para receber o Freedom Awards, prêmio que a equipe da Repórter Brasil ganhou pelo seu trabalho no combate à escravidão. Para representar a outra organização que divide conosco a láurea, a Comissão Pastoral da Terra, veio o meu incansável companheiro de viagens, Xavier Plassat.

E estamos em boa companhia. Os outros premiados são o projeto Friends of Orphans, de Uganda (que auxilia na reintegração social de crianças e jovens recrutados como soldados na guerra civil), e os ativistas James Annan, de Gana (que trabalhou como escravo quando criança na pesca e hoje ajuda a resgatar e proteger crianças em situação de vulnerabilidade), e Amihan Abueva, das Filipinas (que trabalha no combate à exploração sexual e o tráfico de crianças).

A cerimônia de premiação acontecerá nesta segunda (15) e terá a presença do arcebispo sul-africano Desmond Tutu, ganhador do Prêmio Nobel da Paz. Vai ser um bom momento para falar de modelo de desenvolvimento e exploração internacional do trabalho, temas caros a este blog.

Entidades e militantes do movimento anti-escravagista de 30 países foram indicados ao Freedom Awards, organizado pela Free the Slaves, uma das maiores entidades de combate à escravidão do mundo. Os vencedores recebem prêmio em dinheiro para aplicarem em seus projetos.

É claro que este prêmio não é só nosso. Estamos inseridos em uma grande rede de combate a esse crime no país, então todas as pessoas e instituições que atuam para acabar com a escravidão também são homenageadas com ele.

Para ver mais detalhes do prêmio, clique aqui.

PS: Confesso que sou viciado em alguns seriados de TV - insônia da madrugada... Entre todos, "House" (exibido no Universal Channel e na TV Record) é, disparado, o meu preferido. Descobri que as gravações sobre o dia-a-dia daquele médico arrogante, preopotente e genial acontecem a poucas milhas daqui. Se der tempo, vou tentar invadir o set de gravação.

Fonte: Blog do Sakamoto

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