terça-feira, 30 de setembro de 2008

Protegida sim. Blindada, jamais

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por Daniel Pinheiro

Mesmo com o agravamento da crise financeira que assola principalmente os EUA e a Inglaterra, provocado pela rejeição no Congresso norte-americano do pacote de ajuda às instituições financeiras proposto pelo governo Bush, os danos à economia brasileira não serão significativos no curto prazo.

Esta é a avaliação de Mariano Laplane, professor do Instituto de Economia da Universidade de Campinas (Unicamp), para quem só o anúncio de algum tipo de auxílio será capaz de acalmar o mercado.

“Seguramente um pacote virá, mas esta intranqüilidade atual é fruto da crise de financiamento do setor imobiliário (que começou em julho de 2007) e agora se vê bastante agravada”, explica Laplane. “Este movimento de falências e fusões nos EUA e na Inglaterra, principalmente, provocou uma séria restrição no crédito global.”

Falta de liquidez global, aliás, que fica evidente em movimentos como a queda acentuada da Bovespa na última segunda 29, que chegou a ter suas operações paralisadas quando o índice que mede a movimentação da bolsa brasileira caiu mais de 10%. “Há uma fuga de capitais, porque os investidores que tinham dinheiro em ações negociadas no Brasil precisam cobrir suas posições em seus mercados de origem.”

Esse é o mecanismo que pode fazer com que a crise seja sentida de maneira mais significativa no País, diz Laplane. “Com menos gente dispondo de dinheiro para investir, as empresas que pensavam em abrir seu capital na bolsa para arrecadar receitas não farão isso agora, porque sabem que o montante seria muito pequeno.”

Outro setor que pode sofrer com a falta de crédito decorrente desta crise de falta de liquidez no sistema financeiro dos EUA é o dos exportadores, por conta da escassez de fontes externas para financiar as operações de venda em outros países.

Laplane ressalta que no Brasil os grandes perdedores agora são as pessoas do País que investiram na bolsa e viram seu dinheiro perder valor com os acontecimentos nas últimas semanas. “Ainda não temos uma cultura do brasileiro investir nas bolsas de valores, não são muitos que colocam suas economias no mercado financeiro, então não é uma coisa desesperadora como nos Estados Unidos, em que uma grande parte da população tem investimentos atrelados em ações e viu uma boa parte do dinheiro que tinha quase se evaporar.”

O diretor do Instituto de Economia da Unicamp enfatiza ainda a melhor situação da economia brasileira no momento, se comparada à crise das economias asiáticas, que assolou os mercados globais em 1997.
“É uma bobagem dizer que o Brasil está ‘blindado’ contra a crise o coisa que o valha, mas é inegável que a atual situação do crescimento brasileiro, baseada muito mais no consumo interno do que nas exportações, deixa o País com muito mais fôlego para enfrentar os efeitos dessa turbulência”, diz Laplane. “Além disso, contamos com um bom volume de reservas financeiras para ser utilizado em mecanismos que podem amenizar efeitos mais severos que essa crise possa causar na economia brasileira no médio prazo.”

Um dos exemplos citados por Laplane é a criação de um fundo de financiamento para os exportadores brasileiros, que teriam a quem recorrer para captar recursos para concretizar operações de venda os produtos do Brasil para os mercados internacionais.

Para acompanhar as reviravoltas da crise, e seus prolongamentos que eventualmente podem trazer problemas para a economia brasileira, Laplane recomenda que sejam observados indicadores menos óbvios e mais estáveis que as bolsas de valores pelo mundo, mais voláteis e bastante suscetíveis aos humores imediatistas do mercado de capitais.

“Nesses dias de instabilidade, todos os telejornais falam da Bolsa de Londres que abriu em baixa, do fechamento em queda expressiva das bolsas asiáticas, e essas informações são de pouca utilidade para quem quer medir o impacto real desta crise”, explica o economista. “É melhor observar para medidas mais concretas, como por exemplo o número de instituições financeiras que precisaram receber ajuda de bancos centrais ou empresas com melhor saúde, ou ainda a taxa de juros dos EUA, que remunera aquele que é considerado o investimento mais seguro do mundo, e geralmente é o porto tranqüilo procurado por aqueles abalados com a loucura que tem sido o mercado financeiro nas últimas semanas.”

Fonte: Carta Capital

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