Quando a administração Bush tenta enfiar pela goela do Congresso um pacote de salvamento de US$ 1 trilhão, ela começa a parecer com o coronel Sanders (da famosa rede americana KFC de frango frito) garantindo ao público que merece toda confiança para tomar conta dos galináceos. Se não fosse tão sério, haveria nisso tudo algo de cômico.
Por Sam Webb, presidente do Partido Comunista dos Estados Unidos*
Bush e Paulson, sobre cartaz de Dillinger
Aqui temos a Casa Branca, que dissipou trilhões de dólares em oito anos, e seu pivô, Hank Paulson, vindo de 38 anos de jogatina no sistema financeiro a serviço do Goldman Sachs... insistindo para que os líderes do Congresso entreguem-lhes um trilhão, sem debate e sem amarras.
Neste drama da vida real, Bush e Paulson fazem John Dillinger, o legendário gângster e assaltante de bancos do tempo da Depressão, parecer um escoteiro.
Nada a ver com o socialismo
Isso não é "socialismo para os ricos", como alguns sugeriram. Medidas socialistas iriam evidentemente sanear e estabilizar o sistema financeiro para que ele seja seguro. Mas um governo de orientação socialista também colocaria tanto os bons como os maus ativos das partes responsáveis (bancos comerciais e de investimento, fundos de ações e hedge funds) nas mãos de uma autoridade democraticamente regida. Transformaria o Federal Reserve (ou Fed, o banco central dos Estados Unidos), que durante a era Greenspan foi um dos principais arquitetos e chefes de torcida das bolhas econômicas (a da alta tecnologia, a das bolsas e, em sua última versão, a imobiliária) em uma instituição sob controle público. Conduziria os responsáveis aos tribunais e em caso de condenação os puniria devidamente.
Ao mesmo tempo, um governo de orientação socialista e seus aliados no Congresso canalizariam dinheiro para os proprietários de sua casa e o povo trabalhador, tomaria medidas especiais para ajudar as comunidades racialmente oprimidas, para não falar de nossas áreas rurais. Reconstruiria nossa deteriorada infraestrutura nacional, investiria em energia renovável e "empregos verdes", acharia um fim rápido para a Guerra do Iraque. Também proporia que o povo assumisse o complexo energético, que também se tornou uma vaca leiteira das mais ricas empresas.
Use o bem senso
Faz algum sentido entregar o controle de nossos sistema econômico-financeiro, por tempo indefinido, aos mesmos indivíduos que vêm jogando com o sistema e antes de mais nada nos colocaram nessa bagunça? Eu não consigo pensar em nada menos democrático. É algo que não tem um mínimo de bom senso.
Nos manuais sobre sistema bancário e monetário que li anos atrás, nossas instituições e sistema de finanças supostamente direcionavam o dinheiro para fins produtivos – novas tecnologias e inovações empresariais, para construir casas e criar empregos, investir em novas fábricas e equipamentos, para construir e renovar nossa infraestrutura nacional – auferindo ao mesmo tempo belos proventos.
Quando se olha para trás, é fácil ver que os bancos e centros de investimento cumpriram essas funções em certo período do desenvolvimento capitalista, mas trata-se de uma fase superada há muito tempo.
Auge das finanças e domínio da ultradireita
Na verdade, com a imposição do domínio da extrema direita e a reafirmação do poder do capital financeiro no país, três décadas atrás, nosso sistema financeiro passou a ser operado de forma mais ou menos independente por outros setores econômicos, em larga medida livres de qualquer corpo regulatório, e cresceu exponencialmente.
O capital financeiro, na busca de maximizar sua taxa de lucro, drenou dólares da economia privada (em especial o setor manufatureiro) e do tesouro público para esquemas especulativos incrivelmente arriscados. Fez proliferar uma série de instrumentos financeiros e transações que poucos compreendem, mas que enriqueceram fabulosamente os compradores e depositários desses exóticos dispositivos, muitos deles sem nada a ver com a economia real.
O capital financeiro facilitou as megafusões, as aquisições e a evasão empresarial para fora do país. Espalhou o caos por Estados soberanos e suas economias, em especial no mundo em desenvolvimento. Sem pensar duas vezes introduziu uma enorme instabilidade nas artérias econômicas dos EUA e do mundo – fato evidenciado pelo contágio financeiro, dentro e fora do país.
Tudo isso foi arquitetado com sucesso em uma das maiores transferências de recursos da nossa história, dos criadores de riquezas – o povo trabalhador do planeta – para os apropriadores de riquezas – a casta superior do capital financeiro americano. Ao mesmo tempo, deixou em nossa nação uma astronômica montanha de dívidas imobiliárias, governamentais e empresariais, que não pode ser superada da noite para o dia.
Em resumo, a reafirmação das posições dominantes do capital financeiro na política econômica dos EUA, que só foi possível devido ao controle da direita sobre as alavancas políticas do poder, fez com que o povo dos EUA e os povos do mundo pagassem um pesado tributo.
Agarrados ao poder
Entretanto, apesar dessa incrível destruição, dessa quase incompreensível corrupção, dessa desenfreada especulação, esses vendilhões do butim, do endividamento e do distúrbio ainda estão tentando resolver a crise atual de tal modo que continuem no comando das principais alavancas do poder – e com suas riquezas intactas.
Como eu já disse, isto não é socialismo. Sua melhor descrição é capitalismo de Estado monopolista-financeiro.
Conforme o marxismo, a principal missão do Estado é reproduzir as condições para a reprodução da estrutura de classe e das relações econômicas do capitalismo. Salvo engano, não é exatamente isso que Bush, Paulson e sua turma estão fazendo?
Uma arena de luta
De fato, o marxismo diz também que o Estado é uma arena de luta. Enquanto a classe dominante emprega o aparato estatal – inclusive, quando necessário, a violência – para impor seus interesses à sociedade, a classe trabalhadora e o povo, unindo-se, podem resistir com êxito a tais medidas, tanto a partir de dentro como de fora das estruturas estatais.
Isto foi feito nos anos 30, e assim se assegurou importantes vitórias para a classe trabalhadora e seus aliados no país. Isto foi feito também nos anos 60 e assim se deitou abaixo o sistema legal da segregação. E assistimos o mesmo ocorrer agora, com os incríveis esforços de milhões de trabalhadores de todas as raças e nacionalidades, junto com seus aliados, para eleger Barack Obama e uma grande maioria congressual democrata em novembro. Por certo é uma tarefa que assume significado ainda maior diante da tormenta financeira que sacode nosso país.
No momento, contudo, o povo americano e os seus amigos no Congresso se defrontam com um desafio de primeira ordem: impor sua marca ao modo de se tratar a crise financeira. Que não pairem dúvidas: nosso sistema financeiro pode ser estabilizado e voltar a um funcionamento ordenado de uma maneira que atenda às necessidades do povo americano e de nosso país. Mas isso exige combate!
* Fonte: Vermelho e http://www.cpusa.org/
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