segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Economia e a atual crise dos mercados

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Eric Hobsbawm, há alguns anos, já havia diagnosticado que a moderna teoria econômica, ensinada nas universidades e fortemente midiatizada, não passava de uma nova teologia. Os economistas, a serviço do ‘mercado’, são como profetas do caos. Curiosamente, insistem em prever o que não sabem.

Os últimos acontecimentos provocam ou deveriam provocar uma crise das consciências burguesas. Estas formas de ver o mundo são veiculadas pelas grandes mídias e, infelizmente, acreditadas por muitos que sequer detêm capitais que justifiquem suas posturas. São burgueses de mentira, que, simplesmente, mimetizam o poder de seus patrões e/ou líderes intelectuais.

A economia ‘científica’ que postulam é derivada do economics criado para se contrapor à economia política do século XIX, sobretudo a fundada pelo velho Marx. Eles separam a política da economia real, e acreditam que os fenômenos desta área existem sem sujeitos e interesses, por vezes cegos, arrogantes e anárquicos.

O que eles chamam de ‘economia real’ é algo que sustenta o mundo desde sempre. Crêem que vivem acima do mundo do trabalho e, paradoxalmente, o invocam sempre que as crises os surpreendem. Simplesmente não o chamam pelo seu verdadeiro nome. Na verdade, o mundo das finanças é tão real, quanto os que o sustentam, em tela, o da indústria e o das atividades agrárias e de extração, sobretudo mineral.

O segmento financeiro sequer existiria, sem que as pessoas continuassem a trabalhar e a produzir mercadorias e outros bens. O que vendem, os tais ativos financeiros, só podem existir porque são lastreados por riquezas efetivas produzidas pela mão humana. Suas peculiaridades consistem no fato de que seus agentes podem ir além dos bens materialmente existentes, dando a impressão de que a riqueza não tem limites.

Nestas situações, como a que se está vivendo, produzem-se as tais ‘bolhas financeiras’ que acabam por estourar como verdadeiras bolhas de sabão. Neste segmento econômico, o frenesi do enriquecimento fácil, a mentira da especulação e a retórica do desenvolvimento dos negócios presentes e futuros são elementos fortes que distinguem as atividades financeiras das produtivas. Por outro lado, para funcionar eles também precisam explorar o trabalho dos profissionais deste ramo.

No fundo, eles sabem disto tudo, quando dizem que o medo é que a crise vá alcançar a ‘economia real’, isto é, a verdadeira origem do poder que ostentam através dos bancos e do mercado de valores. A posição que ocupam, na materialidade da vida, faz com que ajudem a operar o jogo de luzes sobre a verdadeira razão da crise: a irracionalidade exuberante do capitalismo. Não há como fazer este modo de produção funcionar sem a ocorrência de crises e dos problemas sociopolíticos decorrentes. A crise é parte integrante desta forma de organizar a economia e a sociedade. Por isso, que em todos os países capitalistas, há inúmeros espaços que se protegem da voracidade dos mercados. Quase ninguém é louco o suficiente para acreditar na lisura dos negócios.

A velha crítica à natureza do sistema capitalista e às suas impossibilidades está mais viva do que nunca. A cientificidade atual do capitalismo é incapaz de curar suas doenças crônicas. Consegue, apenas, fazer com que sintamos o odor de podre de seus membros amputados e que imaginemos que a crise vai passar. É verdade que ele consegue permanecer vivo, remanejando forças e cortando na própria carne. Entretanto, isto é provisório, até a próxima débâcle que se vislumbra no horizonte.

Do ponto de vista teórico, é necessário avançar em uma compreensão atualizada destes fenômenos. As interpretações produzidas no passado permanecem, em parte, válidas. Contudo, novos problemas surgiram. A história de hoje tem um grau distinto de complexidade. Vê-la, apenas, sob o prisma das velhas teorias é fazer algo diferente do que fariam os teóricos do passado. Significa ossificar o pensamento crítico e impedir que se compreenda em profundidade o que se vive na atual fase da modernidade.

Eric Hobsbawm, há alguns anos, já havia diagnosticado que a moderna teoria econômica, ensinada nas universidades e fortemente midiatizada, não passava de uma nova teologia. Os economistas, a serviço do ‘mercado’, são como profetas do caos. Curiosamente, insistem em prever o que não sabem. Dizem até qual será a cotação tal e tal, em época determinada. Fazem ‘análises’ de conjuntura, que, em horas, viram poeira midiática. Todavia, esta postura agrada aos verdadeiros donos do poder econômico. Estes detestam qualquer interpretação fora do que acreditam, desejando ficar na obscuridade fantasiosa de seus negócios, muitas vezes, escusos.

É engraçado ver como eles estão confusos e têm pouco a dizer sobre o que está acontecendo. O edifício de suas crenças desabou. Suas referências não mais servem, frente à força dos fatos. Alguns, mais espertos, estão calados esperando o furacão deixar de soprar. Outros, menos inteligentes, enchem os ouvidos das audiências que dispõem, com um monte de bobagens.

*Luís Carlos Lopes é professor.

Fonte: Agência Carta Maior

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