do site do Luiz Carlos Azenha
Ciber Comando da US Air Force: Construir a infraestrutura para crimes de guerra high-tech
por Tom Burghardt
O que é que se obtém quando se combina militarismo estadunidense, fantasias de dominação e uma administração que encara a Internet como um viveiro de "malfeitores" e "subversivos"? O Ciber Comando, naturalmente! Só este esquema tem o potencial de infligir danos maciços sobre populações civis através de todo o planeta.
Situado atualmente na discreta Base da Força Aérea de Barksdale, na Louisiana, o Air Force Cyber Command , o mais novo comando do Pentágono desde a década de 1990, está devotado à noção de que a "próxima guerra" será combatida no espectro electromagnético, visão que encara computadores como armas "centradas em rede".
Com uma estrutura organizacional unificada e um orçamento de US$2 bilhões para o primeiro ano de operações, o Ciber Comando é considerado como a "grande coisa" a seguir. Segundo um artigo recente no Air Force Times , o Ciber Comando "estabeleceu 17 novos Códigos de Especialidade da Força Aérea – criando grandes mudanças nas carreiras de mais de 32 mil homens da Força Aérea".
Finalmente, se os securocratas da Força Aérea têm a sua carreira definida, ela "crescerá até se tornar um dos maiores comandos em serviço". Com a missão de "enganar, negar, perturbar, degradar e destruir" uma infraestrutura de informação do inimigo, o potencial de danos da parte dos "combatentes" americanos e dos especialistas em propaganda negra da "diplomacia pública" não deveria ser subestimado.
Embora a "Visão estratégica" apresentada pela Força Aérea seja velada numa linguagem defensiva, pela sua própria natureza o Ciber Comando representa um salto qualitativo do Pentágono rumo à criação de uma capacidade ofensiva, uma capacidade de extremo alcance e com consequências potencialmente catastróficas para sociedades que caem sob o sinistro olhar dos ciber-guerreiros americanos.
Isto é claramente explicitado pelos teóricos da Força Aérea. Na sua visão, o "ambiente estratégico" que confronta o imperialismo é descrito como "imprevisível e cada vez mais perigoso", caracterizado "pela confluência da globalização, de disparidades econômicas e de competição por recursos escassos".
E como as "disparidades econômicas" tornam-se cada vez mais ofuscantes, meios novos e mais efectivos para obter a "submissão" são exigidos pelo nossos mestres corporativos e seus militaristas cães de ataque. Isto é sublinhado pelo objetivo declarado do Ciber Comando de "alcançar domínio situacional no tempo e lugar de nossa escolha ".
Segundo a Força Aérea, a vigilância global exige a capacidade de sentir e assinalar através do espectro electromagnético. O alcance global exige a capacidade de conectar e transmitir, utilizando um vasto conjunto de redes de comunicações para movimentar dados por toda a Terra quase instantaneamente. O poder global é a capacidade para manter em risco ou atingir qualquer alvo com energia electromagnética e finalmente entregar efeitos cinéticos e não cinéticos através de todos os domínios. Estas capacidades no ciberespaço nos permitirão assegurar a nossa infraestrutura, conduzir operações militares sempre que necessário, e degradar ou eliminar as capacidades militares dos nossos adversários. (Air Force Cyber Command, "Strategic Vision," sem data)
Segundo Noah Shachtman, analista de defesa da revista Wired, a Força Aérea quer um conjunto de ferramentas hacker para lhe dar "acesso" – e "pleno controle" – a qualquer espécie de computador que haja. E uma vez que os info-guerreiros estão dentro, a Força Aérea quer que eles vigiem de perto a infraestrutura de informação dos seus "adversários" completamente não detectados".
Tradicionalmente, os militares têm sido extremamente relutantes em falar muito acerca de operações ofensivas online. Em vez disso, o foco normalmente tem sido a proteção contra ataques eletronicos. Mas desde o ano passado o tom mudou – e tornou-se mais belicoso. "O ciber, como campo de combate ... como o ar, favorece o ataque", diz Lani Kass, assistente especial da Chefia de Staff da Força Aérea que anteriormente dirigiu a Cyberspace Task Force. ("Air Force Aims for 'Full Control' of 'Any and All' Computers," Wired, May 13, 2008)
Como é que isto pode terminar nas megacidades do Sul global, identificadas pelos planejadores do Pentágono como "o terreno estratégico" do século XXI?
O geógrafo Stephen Graham, da Durham University, descreve a tendência que guia a atual doutrina do Pentágono da seguinte maneira: Num nível teórico os estrategistas militares, particularmente os proponentes da "guerra centrada na rede" – a "Revolução em assuntos militares" ("Revolution in Military Affairs", RMA) de Rumsfeld – acreditam que a dominância pode ser alcançada através "da sua vigilância cada vez mais omnipotente e da 'percepção situacional', do poder de fogo aéreo devastador e alvejado com precisão, e da supressão e degradação das comunicações e capacidade de combate de quaisquer forças opositoras".
Em outras palavras, um processo integrado que é extraído da teoria atual de gestão de empresas a fim de criar "apoio contínuo sempre ligado para operações militares em terreno urbano". Chame-se a isso "batalha no espaço" de mente onde a empresa Wal-Mart transforma-se no Terminator.
Graham escreve:
A retórica esmagadora em tais esforços enfatiza que a nova ciência tecno-militar, concebida especificamente para tratar de cidades, transformará os ambientes urbanos do Sul global em áreas que as forças estadunidenses possam dominar completamente, utilizando suas vantagens tecnológicas, com um mínimo de baixas para si próprias. Novas armas e programas de sensoreamento, concebidos especificamente para aumentar a capacidade das futuras forças dos EUA para controlar e dominar cidades do Sul global através de meios centrados em rede, já estão a emergir dos esforços mais amplos em simulação física e electrônica, jogos de guerra, e da avaliação da experiência da insurgência no Iraque. Isto centra-se, primeiro, sobre cidades do Sul global expostas através da tecnologia de novos sensores, e, segundo, no desenvolvimento de sistemas de armas automatizados e robotizados ligados a tais sensores. ("From Space to Street Corner: Global South Cities and US Military Technophilia", documento não publicado, 2007)
Como é que o Ciber Comando se ajusta nisso?
Sob o título "Cyberspace Attack Operations", os teóricos da Força Aérea asseveram:
Os dispositivos do ciberespaço obtidos a partir da tecnologia emergente, tais como energia dirigida, incluem: ruptura de sensores, manipulação de dados, degradação do apoio à decisão, ruptura de comando e controle, e degradação de sistema de armas. Ataques no ciberespaço podem ser dirigidos à infraestrutura de comunicação terrestre, aerotransportada e espacial do adversário, bem como às suas forças, equipamento e logística.
Na verdade tais operações são plenamente teorizadas como meios para alcançar "dominância de pleno espectro" via "Cyberspace Offensive Counter-Operations":
O ciberespaço favorece operações ofensivas. Estas operações negarão, degradarão, romperão, destruirão ou enganarão um adversário. Operações ofensivas no ciberespaço asseguram liberdade de ação ali enquanto negam esta mesma liberdade aos nossos adversários. Aumentaremos nossas capacidades para conduzir ataques a sistemas electrônicos, interdição e ataque a sistemas electromagnéticos, ataque a redes e operações de ataque a infraestruturas. Os alvos incluem as redes terrestres, aerotransportadas e espaciais do adversário, e ele próprio. Na medida em que um adversário se torna mais dependente do ciberespaço, as operações ofensivas ali tem potencial para produzir maiores efeitos. ("Strategic Vision," op. cit.)
"Maiores efeitos" neste contexto significa nada menos que a capacidade de tornar sociedades "alvo" completamente vulneráveis ao ataque imperialista. Cerca de uma década atrás, as forças da NATO lançaram o que foi descrito como uma "bomba blackout" a grafite, a BLU-114/B, sobre Belgrado e outras cidades durante a sua guerra de agressão contra os remanescentes da antiga Iugoslávia – com efeitos devastadores. Marty Mclaughlin escreveu :
Uma consequência particularmente perigosa do blackout de energia é o dano aos sistemas de água em muitas cidades iugoslavas, as quais dependem de estações de bombagem movimentadas por energia eléctrica. Novi Sad, uma cidade de 300 mil habitantes que é a capital da província sérvia de Vojvodina, ficou sem água corrente durante oito dias, segundo os moradores. Famílias foram obrigadas a obter água do Danúbio para uso sanitário e de um punhado de poços para ter água de beber.
Estações de tratamento de esgotos também foram fechadas, com o resultado de que o esgoto não tratado começou a ser escoado para dentro das redes de rios que alimentam o Danúbio, a mais importante via navegável da Europa. ("Wall Street celebrates stepped-up bombing of Serbia," World Socialist Web Site, May 5, 1999)
Com os avanços tecnológicos, os ciberguerreiros imperialistas acreditam que podem simplesmente transformar uma infraestrutura em rede de um adversário num sistema "zumbi" sob o seu controle para conseguir a mesma, se não maior, devastação.
Como relata Marty Grahan em Wired :
Comparações entre armas nucleares e ciber-armas podem ser forçadas, mas há pelo menos uma coisa em comum. Acadêmicos que estudam a ética de utilizar bombas lógicas, cavalos de Tróia, vírus (worms) e robots (bots) em tempo de guerra muitas vezes encontram-se eles próprios no mesmo terreno pisado pela geração anterior dos jogadores nucleares da Guerra Fria.
"Há muita coisa desconhecida num ciber-ataque", afirma Neil Rowe, professor no Center for Information Security Research da U.S. Naval Postgraduate School, o qual rejeita os ciber-ataques como ferramenta legítima de guerra. "O potencial para dano colateral é pior do que na tecnologia nuclear... Com a ciber, isto pode difundir-se através da infraestrutura civil e afetar muito mais civis". ("Welcome to Cyberwar Country, USA", Wired, February 11, 2008)
É precisamente por isso que a Força Aérea manifestou interesse em construir um Ciber Comando robusto!
Segundo uma Folha de Informação da Força Aérea, "Cyberspace 101" , eles concebem a sua "missão" como aquela que "nos permitirá capacidades ofensivas e atingir alvos deliberados".
Com data de lançamento oficial programada para primeiro de outubro de 2008, o Ciber Comando por enquanto não tem lar permanente mas pode-se prever que algum "líder" do Congresso em busca de oferecer benesses aos seus "constituintes" colherá o prêmio. De Hampton, Virgínia, a Yuba City, na Califórnia, líderes locais estão em negociações pelas costas de seus cidadãos.
E, segundo a Wired, grupos de interessados locais estão "lançando ofertas de terreno, apoio acadêmico e de investigação associado e, num caso, um edifício de US$11 milhões com um canal de proteção".
Com bihões de dólares em contratos governamentais externos pendentes, o Ciber Comando não é matéria de brincadeira. Em dezembro último a Aviation Week relatava que "líderes da U.S. Air Force que trabalham no nascente ciber comando acreditam que haverá uma 'enorme' necessidade de serviços contratados para apoiar o esforço em embrião quando ele enfrentar ventos contrários quanto a pessoal, tecnologia e financiamento".
Michael Bruno escreveu:
"Há enormes necessidades de contratação em andamento", diz o Maj. Gen. Charles Ickes II, assistente especial da Air National Guard encarregado de operações, planos e requisitos.
"Penso que ninguém pode dizer quão grandes", disse ele em 5 de dezembro na conferência da Força Aérea sobre tecnologia de informação na Associação das Forças Armadas para Comunicações e Eletrônica, seção da Virgínia. ("New Cyber Command to be 'Huge' Business Opportunity," Aviation Week, December 6, 2007)
Em maio, o Washington Technology relatou que a Força Aérea "está pedindo relatórios pormenorizados (white papers) sobre como pode ela conduzir ofensivas com êxito contra adversários no ciber espaço". E para apoiar este pedido, o Air Force Research Laboratory (AFRL) oferece US$11 milhões em financiamento para projetos de dois anos que forem propostos.
Se os projectos passados do Pentágono constituem alguma indicação para onde as propostas da AFRL podem levar, a estimativa de US$30 bilhões de custos para o seu projeto inicial de cinco anos tem todas as marcas de outro maciço buraco negro financiado pelo dinheiro dos contribuintes para empreiteiros da defesa.
Na verdade, a Defense Advanced Research Projects Agency (DARPA) desempenhará um papel crítico para a Força Aérea e atualmente está concebendo um "National Cyber Range" que "criará um ambiente virtual onde o Departamento da Defesa pode imitar a guerra real", tanto a defesa como a ofensiva", segundo Sharon Weinberger, analista de defesa da Wired.
De acordo com um anúncio publicado pelo sítio web do Federal Business Opportunities, o projeto, concebido pelo Strategic Technology Office do DARPA, é descrito como uma zona de teste que permitirá "conduzir ciber operações ao proporcionar um persistente ciber cenário". Muitos dos pormenores do programa são secretos.
Encarada como uma força que conduz "operações ofensivas e defensivas sustentadas através do espectro electromagnético plenamente integradas com operações aéreas e espaciais", o Ciber Comando da Força Aérea "potencializará ... capacidades ciber-espaciais ... em todos os domínios, para criar efeitos globais e de teatro em apoio da equipe conjunta que trava a guerra".
Crimes de guerra ao pressionar de um botão? O futuro é agora e sua aparência é sinistra.
19/Julho/2008
[*] Investigador e activista residente na Área da Baía de San Francisco, EUA. Além de publicar na Covert Action Quarterly, Love & Rage e Antifa Forum é editor de Police State America: US Military 'Civil Disturbance' Planning http://www.assoc-amazon.fr/e/ir?t=resistirinfo-21&l=ur2&o=8.
O original encontra-se em http://antifascist-calling.blogspot.com/ e em http://www.globalresearch.ca/index.php?context=va&aid=9619
Este artigo encontra-se em http://resistir.info/
Fonte: Vi o Mundo
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