sexta-feira, 14 de março de 2008

Copom: uma ata do outro mundo

O conservadorismo dos homens que comandam a política monetária do Brasil é mesmo impressionante. A ata da última reunião do Copom (Conselho de Política Monetária), colegiado do Banco Central responsável entre outras coisas por estabelecer a taxa de juros básica do país (Selic), foi divulgada na manhã desta quinta-feira com uma advertência surreal: se a inflação fugir da meta, a taxa de juros no Brasil poderá ser elevada. A hipótese da inflação fugir do controle é hoje remota, mas o simples fato do Copom cogitar um aumento na taxa de juros impressiona, porque o centro do debate macroeconômico atualmente gira muito mais em torno de medidas para evitar que o "derretimento" do dólar frente o real não prejudique as exportações brasileiras e a balança comercial. Ora, a melhor medida para evitar a valorização excessiva do real neste momento é justamente abaixar a taxa de juros, e não aumentá-la, uma vez que a tendência é uma nova redução nos juros norte-americanos na próxima semana, elevando assim, automaticamente, o diferencial que tanto atrai os investidores estrangeiros para o Brasil (a conta é simplíssima: hoje a Selic está em 11,25% e a taxa americana, em 3%, logo a diferença é de 8,25 pontos percentuais; como o Fed deve reduzir em mais meio ponto os juros nos EUA, esta diferença vai passar a 8,75 pontos, atraindo mais dólares interessados na maior rentabilidade para o Brasil).

O Copom deve, sim, perseguir a meta de inflação e não deve se descuidar deste aspecto, mas não é possível que seus integrantes não levem em consideração o fato de o mundo estar passando por uma crise sem precedentes e que inclusive pode abrir uma bela janela de oportunidades para o Brasil, se o país souber aproveitá-la. O dólar está tão barato hoje que acaba exercendo uma pressão deflacionária (via importação mais barata, por exemplo), de modo que o BC poderia perfeitamente afrouxar a política monetária, tolerar uma eventual inflação acima da meta por alguns meses e baixar a Selic, estimulando assim o consumo interno e a produção. Por tabela, juros menores também diminuiram a atratividade para os investidores estrangeiros, ajudando a manter o dólar um pouco menos derretido.

Resta saber, ao fim e ao cabo, por quanto tempo o presidente Lula vai tolerar tamanho conservadorismo dos responsáveis pela política monetária de seu governo. É sabido que Lula não admite a volta da inflação, mas se o preço para isto for, mais uma vez, frear o consumo interno, trata-se de um verdadeiro tiro no pé de um governo que parece fadado ao sucesso na área econômica.


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