sexta-feira, 21 de março de 2008

NÃO BASTA MATAR. É PRECISO DAR SUMIÇO NO CORPO

por Luiz Carlos Azenha

SÃO PAULO - Eu mesmo fui o primeiro a escrever, aqui, sobre o chamado sangue de barata dos jornalistas brasileiros. Notei, em comentários aqui e ali, um certo grau de cobrança, de expectativa de "atitudes heróicas", especialmente em relação ao Luís Nassif, que tem o seu site - um dos melhores do Brasil - hospedado no IG.

Acho botar a faca no pescoço do Nassif uma grande injustiça. Será que aqueles determinados em cobrar "atitude" não se dão conta da enormidade das pressões que ele deve ter enfrentado e, com certeza, continua enfrentando por conta da excelente investigação que faz sobre os bastidores de Veja?

Repito: minha saída "simbólica" do iBest, uma decisão também adotada por blogueiros como o Eduardo Guimarães, o Mello e o Renato Rovai, foi a única forma que encontrei de marcar uma posição que acredito ser de interesse não deste ou daquele indivíduo, mas do Jornalismo e dos internautas em geral.

A demissão de Paulo Henrique Amorim foi no estilo pula-catraca, tão ao gosto de chefes mafiosos. Por fax, com bloqueio de cartões de acesso de funcionários do Conversa Afiada e sumiço de conteúdo que o jornalista considerava pessoal: palestras e outras informações. Em uma das breves conversas telefônicas que tive com o Paulo Henrique eu disse a ele: há algo aí que está acima dos indivíduos.

Em primeiro lugar, a decência no tratamento de profissionais, que se transformam em lixo assim que não interessam mais à empresa que os contrata. Quando é que vamos acabar com as demissões pula-catraca, em que além de impor o poder de chefe um jornalista ou congênere, supostamente em nome do patrão, bota para fora instintos sádicos? Senhas bloqueadas, acompanhamento de seguranças, blecaute de conteúdo sem qualquer explicação, assassinatos de caráter - onde é que vamos parar?

Em segundo lugar, o respeito aos internautas. Quantas vezes, nas últimas semanas, não correram boatos de que o site de Luís Nassif tinha saído do ar? Ontem, bocejei quando começaram a chegar mensagens dando conta de que o Conversa Afiada tinha saído do ar. Só depois de muita insistência decidi checar e descobri: tinha acontecido. E, se aconteceu com o PHA, o que impede que aconteça nas mesmas circunstâncias, amanhã, com o Cidadania.com? E se o UOL der um apagão no blog do Eduardo Guimarães alegando que ele não dá audiência ou está ocupando muito espaço ou feriu alguma cláusula contratual? Meu ponto: qualquer um pode ser o próximo. De minha parte, vou manter este site em um hospedeiro independente, ponto com ponto br, pago de meu próprio bolso. É uma opção pessoal.

Se alguém pretende cobrar alguma coisa, está olhando na direção errada. Essas ocasiões acabam sendo instrutivas, se você souber tirar o melhor delas.

Servem para identificar dois grupos muito específicos que logo "circulam" em torno das notícias. O primeiro é formado pelos apologistas. São aqueles que colocam seus interesses pessoais acima de qualquer princípio. Ah, o Paulo Henrique Amorim ganhava mais do que merecia, não dava audiência, a demissão foi feita dentro do que rezava o contrato...

Não sei o que move essa gente. Sei que eles servem ao propósito de desviar o foco do essencial para o secundário. Quem trabalha com a internet sabe quanto "custa" a mudança de um endereço. Muito me surpreendeu a entrevista de um sindicalista, que ouvi ontem, com sua definição precisa: um site é quase um organismo vivo. Leva tempo para estabelecer todas as conexões, sejam elas físicas ou "espirituais". E é justamente por isso que o IG optou por uma demissão fax-blecaute. Ou vocês acreditam que quem tomou a decisão acordou de mau humor e decidiu apagar um site? Havia uma objetivo claro: causar o maior dano possível ao demitido. Não basta matar. É preciso dar sumiço no corpo.

Além dos apologistas, existe a turma do punhal. Acho perda de tempo identificá-los pelo nome. Com três meses de internet você vai identificá-los. São sempre os mesmos. Eles se dispõem a completar o serviço sujo. São os encarregados de disseminar informações falsas, tendenciosas ou manipuladas. Eles subestimam a inteligência dos internautas, como se leitores não fossem capazes de apurar e cruzar suas próprias informações. Na internet somos todos repórteres.

Àqueles que acham necessário fazer cobrança sugiro que foquem nos dois grupos acima definidos, para um debate educado baseado em informação, sem adotar os mesmos métodos de desqüalificação em que eles são mestres.

Fonte: Vi o Mundo
Share/Save/Bookmark

Nenhum comentário: