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por Mauricio Dias, no site de Carta Capital
“Os votos como qualquer mercadoria
podem ser comprados.”
Norberto Bobbio, em
“Diálogo sobre a República”
Houve um tempo em que se exigia renda anual, comprovada oficialmente, para o cidadão exercer o direito do voto. O mundo girou e a poupança exigida do eleitor transpôs-se, também, por regras não escritas, ao candidato. O poder econômico tornou-se um fator decisivo nas eleições e, assim, a atividade política foi praticamente substituída pela competição financeira. Esse é um processo em progresso no Brasil e no mundo todo.
A reforma eleitoral, aprovada na Câmara dos Deputados, faz um esforço louvável para introduzir melhorias na legislação. No caso específico das doações mantém o que está estabelecido e acrescenta a contribuição via internet de pessoas físicas. As empresas não poderão doar por esse meio.
Prudentemente os parlamentares passaram ao largo da discussão sobre o financiamento. A implosão do caixa 2 do PT e a do tucano Eduardo Azeredo, em 2005, ambos ainda em julgamento, mostrou muito dos vícios do financiamento privado e criou a ilusão de que o financiamento público seria a fonte das virtudes.
Marcos Valério, o publicitário mineiro que virou ícone desse processo desvirtuado, muda de nome e de partido. Mas não muda de função. Ou seja, o cristão muda, mas não muda o Natal. Era risível no circo das CPIs armadas pela oposição ver e ouvir o sermão ético de pecadores condenando pecadores.
Houve um momento em que o ex-deputado Roberto Jefferson, autor das denúncias, fez, com outras palavras, este desafio aos seus pares: “Quem não fez caixa 2 aqui levante a mão”. As mãos continuaram baixadas.
Na verdade o caixa 2 é a grande fonte de financiamento eleitoral. Dele escoa dinheiro para as campanhas e, também, para a conta particular dos políticos. Afinal, como ninguém é de ferro, o dinheiro nem sempre passa das mãos por onde passa.
A questão do financiamento de campanha, encaminhada em nome da moralidade, é pura hipocrisia. A questão é insolúvel em si mesma. É informação do repórter americano Bob Woodward, do Washington Post, que a invasão da sede do Partido Democrata, em 1972 (que levaria Nixon à renúncia, em 1974), foi financiada com 300 mil dólares naquele ano. Woodward falou disso sem alarde. Trata-se de um crime eleitoral e, certamente, fonte de grande corrupção na máquina administrativa das prefeituras, dos governos estaduais e dos governos federais. Aqui e, como se vê, alhures.
Agora, por exemplo, surgiu uma chiadeira, movida mais pela hipocrisia do que pela ingenuidade, contra a autorização de doação de pessoa física para os partidos. O argumento contrário é o de que as direções partidárias, a pedido do doador, repassariam o dinheiro aos candidatos. Isso já ocorre, formalizado por uma lei eleitoral de 1995.
O dinheiro promove, de fato, um desequilíbrio na competição eleitoral. Mas não adianta buscar igualdade na democracia eleitoral. Ela é inerente ao sistema.
Seria o suficiente buscar boas regras para amenizar o impacto dos interesses privados na máquina pública que se dá pelo financiamento eleitoral. No caso das doações individuais (as contribuições empresariais são limitadas a um máximo de 2% do faturamento) serão permitidas dentro do limite atual que é de 10% do rendimento bruto do ano anterior à eleição e até 50% dos bens móveis. Há uma boa sugestão incluída na lei eleitoral de 2006 que determina a fixação do limite de gastos nas campanhas. Até agora não houve o que se chama de “ambiente político” para ser votada. Ou seja, a ninguém interessa.
E que não se espere por perfeição. Lei e transgressão nascem juntas.
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