sábado, 8 de março de 2008

A mídia como arma de guerra - por Izaías Almada

A mídia como arma de guerra - por Izaías Almada

Se alguma dúvida existia, para muitos de nós, do papel da mídia no jogo internacional
do poder, na estratégia adotada pelo capitalismo neoliberal em manter suas
conquistas a qualquer preço e subjugar aqueles que não lêem na sua cartilha,
essa dúvida deixa de existir quando se analisa friamente os últimos acontecimentos
desta semana na fronteira entre o Equador e a Colômbia.

Um país conturbado há sessenta anos por uma luta político-militar interna,
onde mais de 20 mil insurgentes em armas, FARC e ELN, disputam o poder com
os sucessivos governos eleitos pela oligarquia.

A Colômbia viu, em poucas horas, cair por terra a máscara de país democrático
e legalista. E como sua política é determinada fora de suas fronteiras ou,
provavelmente, em algumas embaixadas de Bogotá, deixou a nu a estratégia
adotada por todos aqueles que não querem a paz interna no país. Ou, pior
ainda, que precisam conflagrar a região, ampliar o conflito, com propósitos
diversionistas, desviando a atenção para encobrir aquilo que interessa ao
Departamento de Estado norte-americano.

Senão vejamos trecho de um relatório feito ao presidente Bush em 30 de julho
de 2001 pelo National Energy Police Report e publicado pelo jornal The Nation:
“os EUA necessitam garantir para os próximos anos o fornecimento seguro,
estável e barato do petróleo”. O relatório avalia que três regiões no mundo
têm que ser consideradas nessa perspectiva: o Golfo Pérsico, a Ásia Central
e o Arco Amazônico andino, leia-se Venezuela, Colômbia e Equador.
Há, contudo, um significativo parágrafo na recomendação a Bush: “Caso não
se consiga o petróleo por meios diplomáticos, devemos introduzir na matéria
o nosso aparato militar”.Golfo Pérsico, Irã e Iraque; Ásia Central, Afeganistão.
Aqui, como se sabe, falharam os “meios diplomáticos”. O Arco Amazônico andino,
contudo, está localizado no “quintal”, o que não deveria causar maiores embaraços,
mas surgiram aqui dois empecilhos: o primeiro, Hugo Chávez, e mais recentemente
Rafael Correa. O tradicional golpe de estado foi tentado contra Chávez em
2002, mas também não deu certo.Idéias de soberania, independência, mercados
comuns e construção de alternativas energéticas vão ganhando força entre
países como Argentina, Brasil, Venezuela, Bolívia, Equador, Nicarágua, Cuba.
Cria-se a Telesur, a ALBA (Alternativa Bolivariana para as Américas) em oposição
à falecida ALCA, o Banco do Sul, a Petrocaribe, onde países pobres caribenhos
podem comprar petróleo da Venezuela a preço mais barato. Um pouco de solidariedade
invade os números frios do comércio feito de trocas que só beneficia um dos
lados, o mais rico.
Preocupado com os conflitos militares no Iraque e no Afeganistão, com as
ameaças ao Irã, com a manutenção de Israel como Estado polícia no Oriente
Médio, os Estados Unidos da América perceberam que, a rigor, contam apenas
com um governo totalmente submisso na América do Sul: a Colômbia. E talvez
já não contem, aqui no seu antigo quintal, só com os “meios diplomáticos”
para conseguir o seu petróleo seguro e barato.

Como explicar para o mundo que a invasão do território do Equador pelas Forças
Armadas da Colômbia, a que se pretendeu dar um caráter de surpresa, era uma
ação preventiva de defesa do território colombiano? E apresentar rapidamente
como prova alguns documentos “recuperados” do laptop de um líder guerrilheiro,
onde se inferia que 300 milhões de dólares foram dados por Hugo Chávez às
FARC, que os guerrilheiros iriam comprar 50 quilos de urânio, que Rafael
Correa e Chávez tinham acordos secretos com as FARC, um vídeo onde um soldado,
em plano muito fechado, conta dólares supostamente encontrados no acampamento
guerrilheiro.

Afinal, tudo isso justificaria a ação em território equatoriano. E era preciso
que o mundo repercutisse toda a montagem da farsa rapidamente. Rádio, televisão,
jornais, internet deveriam espalhar o mais rapidamente possível para as principais
capitais européias e para os países da América Latina, em particular, que
a Colômbia agiu contra terroristas que até urânio já queriam comprar... (Alguém
aí se lembra das armas de destruição em massa de Sadam Hussein?).

A mídia foi acionada como arma de guerra, como tem sido usual nos últimos
tempos. E com tal violência e precisão que confunde a cabeça de muitos de
nós... e chegamos a duvidar das nossas próprias convicções.Mas em dúvida,
sempre podemos nos perguntar:

De onde partiram os aviões e helicópteros que participaram da invasão do
território equatoriano e que, pela posição dos disparos, vieram do próprio
território do Equador? Seriam da base norte-americana de Manta, cujo contrato
não será renovado por Rafael Correa no final de 2008?

Quem dispõe de sofisticada tecnologia de satélites para identificar eventuais
telefonemas dados pelo líder guerrilheiro Raul Reyes?

O que foi fazer em Bogotá, dois dias antes do bombardeio ao acampamento guerrilheiro,
o contra-almirante Joseph Nimmich, comandante da Força Tarefa do Sul dos
EUA?

Onde estaria localizado o laboratório das FARC para enriquecimento de urânio
nas selvas colombianas?
Os 300 milhões de dólares que Chávez entregou às FARC teriam sido em cheque
ou escondidos em caixas de uísque?
Por quê a imprensa não deu o devido destaque à declaração de um dos últimos
reféns soltos pelas FARC, em fevereiro, de que Ingrid Bettencourt, uma vez
libertada, se candidataria à presidência da Colômbia?
Teriam Uribe e o Departamento de Estado norte-americano interesse na libertação
de Ingrid Bettencourt?

É preciso ter paciência diante de tanta mentira e farsa. Recomenda-se a leitura
do livro O Senhor das Sombras, de Joseph Contreras, sobre Álvaro Uribe.

Izaias Almada é autor, entre outros, do livro "Venezuela Povo e Forças Armadas",
Editora Caros Amigos.

fonte: Caros Amigos
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