quinta-feira, 10 de abril de 2008

Um jornal que serve ao capital

por Mario Augusto Jacobskind

Por mais que queira enganar a opinião pública, O Globo não consegue. Pelo menos os mais atentos percebem claramente. Está tão na cara, como esteve em abril de 64, de que lado está O Globo, que não adianta tentar aparecer como democrata desde criancinha e defensor da moralidade pública, no velho e carcomido estilo UDN, que não engana. Aquele ranço moralista, que no fundo tem por objetivo escamotear questões relevantes, é a marca da publicação.

O caso mais recente foi a edição desta quinta-feira (03/04), com direito a chamada de primeira página e tudo mais. Seguindo visivelmente a orientação do patronato, O Globo fez o seu protesto contra o veto do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva à fiscalização das contas dos sindicatos pelo Tribunal de Contas da União. Na chamada de primeira página, ouvindo o “outro lado”, apenas para constar, o jornal produziu a seguinte manchete: “Sindicatos celebram com Lula liberdade para gastar”.

Foi acionado o colunista Merval Pereira para protestar contra a decisão. Nem Getúlio Vargas, que morreu em 24 de agosto de 1954, foi poupado pelo referido jornalista, lembrando que “Lula defendia o fim da Era Vargas”. Nada disse sobre o seu ídolo Fernando Henrique Cardoso, que durante o mandato de oito anos se esforçou ao máximo para, ele sim, acabar com a Era Vargas. E exatamente acabar com o lado positivo daquele período, ou seja, o que resultou na criação da Petrobrás e a defesa intransigente da soberania nacional, que O Globo sempre foi contra. Aliás, basta consultar a Biblioteca Nacional para ver de que lado estava O Globo, então capitaneado por Roberto Marinho.

Fúria contra a organização dos trabalhadores
É realmente incrível neste episódio do veto de Lula à fiscalização pelo TCU das verbas dos sindicatos a incoerência do esquema anti-trabalhador que O Globo representa. Há anos que o jornal fala que os sindicatos devem estar libertos das amarras do Estado etc e tal. Então, qual o motivo de agora querer manter a área sindical sob o tacão do TCU? Contas dos sindicatos devem ser fiscalizadas não pelo Estado ou qualquer outro setor, mas somente pelos trabalhadores.

Teve até um gaiato dizendo que depois de uma jornada de trabalho o sindicalizado não vai à assembléia fiscalizar contas. Realmente quem faz este pré-julgamento desconhece o que venha a ser vida sindical. Se o trabalhador sindicalizado não freqüenta a sua casa, o Sindicato, não é por cansaço, mas por algum outro motivo. Pode ser por má condução da direção. Talvez até por receio de algum setor do patronato que tem ojeriza a qualquer tipo de organização dos trabalhadores e persegue quem aceita esta premissa na prática.

Perguntem aos dirigentes sindicais da área de comunicação se têm direito a entrar nas dependências das Organizações Globo? Perguntem o que acontece na porta de entrada? Truculentos seguranças muitas vezes são acionados para “cumprir a ordem” que vem lá de cima... Assim foi na TV Globo no ano passado durante a campanha para a eleição da diretoria da Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas). O outro lado, ou seja, a oposição, teve negada a autorização para entrar e se comunicar com os jornalistas.

E agora vem o senhor Merval jogar a mensagem do patronato numa linguagem enganadora, no velho estilo udenista, visceralmente anti-Vargas, que mesmo depois de 53 anos e oito meses de sua morte continua provocando a ira de O Globo.

Histerismo antivarguista
O histerismo anti-varguista do jornal, que sempre marcou a sua história, chega ao cúmulo de dificilmente passar uma semana sem que haja alguma referência negativa ao presidente odiado pelo conservadorismo.

A manipulação midiática de O Globo chega às raias do absurdo. No meio das matérias, em duas páginas, são citados exemplos de pelegos que supostamente utilizam verbas sindicais para viver nababescamente. Se há casos assim, e deve haver, não pode ser apresentado, como faz O Globo, como regra, mas sim como exceção. Por que O Globo não vai a fundo para analisar se estes “ladrões” representam de fato a classe trabalhadora ou são, isto sim, uma excrescência? Claro, aí não interessa a esta gente global.

Podem estar certos de uma coisa, a campanha vai continuar. O Globo e o seu campo patronal querem de todas as formas continuar a razzia contra os trabalhadores convocando seus colunistas preferidos, como Merval Pereira, para exigir reformas trabalhistas e sindicais. Não percam por esperar a intensificação desta tentativa de lavagem cerebral gênero pensamento único.

Ao longo das décadas, O Globo, apoiador da ditadura e de golpes de estado por toda esta América Latina, que chegou a ser até apelidado de o Pravda da imprensa brasileira e dos generais de plantão, pelo seu oficialismo, sempre tem se colocado contra os trabalhadores e abomina qualquer tipo de legislação que proteja quem trabalha. Está sempre ao lado do capital. Hoje, como ontem, tenta de todas as formas envenenar a opinião pública no sentido de se voltar contra o movimento sindical e de um modo geral contra todos os movimentos sociais. Como se tudo isso não bastasse, O Globo também não divulga cartas que se contrapõem ao seu ideário reacionário. É uma publicação exemplo típico de ter se tornado aparelho ideológico da globalização.

Em todas as áreas editoriais, da economia a internacional, passando pelas demais, prevalece este mecanismo. Merval Pereira, Rodolfo Fernandes, Miriam Leitão, Arnaldo Jabor etc e tal não deixam mentir e confirmam esta linha.

O Globo é realmente a leitura e como complemento Veja e Época, passando de vez em quando por Isto É. Aí sim, os leitores estarão informados o suficiente para saber qual a onda principal do momento contra os trabalhadores brasileiros.

Fonte: Fazendo Media

Mário Augusto Jakobskind é jornalista e escritor. Foi colaborador dos jornais alternativos Pasquim e Versus, repórter da Folha de S. Paulo (1975 a 1981) e correspondente da Rádio Centenária de Montevideo, além de editor de Internacional da Tribuna da Imprensa (1989 a 2004) e editor em português da revista cubana Prisma (1988 a 1989). Atualmente é correspondente do semanário uruguaio Brecha e membro do conselho editorial do Brasil de Fato. É autor, entre outros, dos livros América Que Não Está na Mídia (Adia, 2006), Dossiê Tim Lopes - Fantástico/Ibope (Europa, 2004), A Hora do Terceiro Mundo (Achiamê, 1982), América Latina - Histórias de Dominação e Libertação (Papirus, 1985) e Cuba - apesar do bloqueio, um repórter carioca em Cuba (Ato Editorial, 1986).
Share/Save/Bookmark

Nenhum comentário: