quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

Obama, um falso brilhante entre medíocres - por José Arbex Jr.- fonte:http://carosamigos.terra.com.br/

Obama, um falso brilhante entre medíocres

por José Arbex Jr.


A campanha do senador Barack Obama (de Illinois), candidato a candidato do Partido Democrata à presidência dos Estados Unidos, fornece uma chave para a compreensão do que se passa hoje no país. Ninguém levava a sua précandidatura realmente a sério, até a realização das primárias do partido, em Iowa, no começo de janeiro, quando ele derrotou a favorita Hillary Clinton. E a “zebra” quase se repetiu, em 8 de janeiro, nas primárias de New Hampshire. Agora, ninguém mais acha absurda a hipótese de os Estados Unidos elegerem o seu primeiro presidente negro. Como explicar?

Em primeiro lugar, e de longe o dado mais importante: em 2003, Obama se opôs à invasão militar do Iraque, ao contrário de Hillary e de toda a alta cúpula do Partido Democrata (a ex-primeira-dama, diga-se de passagem, não apenas aprovou a aventura militar de George Bush, como também apoiou com entusiasmo o bombardeio de Beirute por Israel, em 2006). Ora, a questão central da atual campanha eleitoral consiste, precisamente, no debate sobre como resolver o pesadelo que Bush criou para os Estados Unidos no Iraque. Obama é o único candidato que pode falar o que quiser a respeito, sem parecer oportunista, cínico ou, simplesmente, “espertalhão”. E ele oferece uma perspectiva clara: retirada de todas as tropas, no ritmo mais acelerado possível (defende o prazo de 31 de março de 2008).

Cansados de Bush
Outra parte da resposta é dada pelo principal eixo da campanha de Obama: mudança. Ele diz abertamente que os anos Bush quebraram os Estados Unidos, dividiram a nação e atraíram o ódio do planeta. Numa crítica mordaz ao Congresso (incluindo parte dos deputados de seu próprio partido), diz que pretende deixar o Legislativo “antes que toda esperança seque dentro de mim”. Com isso, Obama dialoga diretamente com todos os que se sentem cansados das aventuras de Bush e com os que já não acreditam mais “nos políticos”.

Não por acaso, depois das primárias de Iowa, todos os pré-candidatos, incluindo os do Partido Republicano, incluíram a palavra “mudança” em seus respectivos discursos. Sua história pessoal o credencia para falar como “cidadão do mundo”: Barack (“abençoado”, em árabe) é fi lho de africano (seu pai, nascido numa pequena vila, no Quênia, ganhou uma bolsa para estudar na Universidade do Havaí, onde conheceu sua mãe, durante uma aula de russo), é neto de muçulmanos,
passou a infância na Indonésia e abriu o caminho para, de volta aos Estados Unidos, formar-se em direito, em Harvard.

Em seu livro de memórias, conta que usou drogas na adolescência, e que era atormentado por questões raciais, agravadas por ter sido criado em um lar desfeito (seu pai abandonou sua mãe quando ele tinha 2 anos). Assim, ele personifi ca, de certa forma, o velho sonho da mítica América como a “terra das oportunidades”. É a face oposta da América de Bush, oriundo de uma tradicional família da elite branca. E também representa o self made man contra o poder da recente dinastia Clinton.

Estranho no ninho?
O seu grande trunfo reside muito mais na sua imagem de “estranho no ninho” de cobras de Washington do que em seu programa eleitoral, que não é muito diferente do apresentado pelos outros candidatos democratas. Embora seja favorável ao direito ao aborto e se oponha a uma legislação nacional proibindo casamento entre seres do mesmo sexo, Obama apóia o “endurecimento” contra os imigrantes ilegais (é favorável à nova legislação proposta por Bush) e propõe, no máximo, algumas medidas cosméticas para “disciplinar” o neoliberalismo desenfreado da era Bush. Como outros democratas, também propõe medidas para conter a emissão de carbono, favorece pesquisas com células-tronco e uma reforma tributária que atenue um pouco o sofrimento dos mais pobres.

Quando questionado por Hillary sobre o ponto mais diferenciado de sua campanha – as conseqüências regionais e mundiais de uma rápida retirada das tropas do Iraque –, Obama joga o problema para a comunidade das nações. Diz que uma solução estável e realista depende de a Casa Branca recuperar o seu prestígio planetário, abalado pelos republicanos.

E aproveita para estocar Bill Clinton (principal cabo eleitoral de sua mulher), que não poupa elogios ao ex-presidente Ronald Reagan, o grande precursor do neoliberalismo nos Estados Unidos. O recado é claro: Bill e Hillary são farinha do mesmo saco conservador que abriga Bush e os demais. Com esse discurso, Obama atrai o apoio de jovens, intelectuais e de atores bem conhecidos, como Tom Hanks, Jodie Foster, Will Smith e Paul Newman. Do lado do Partido Republicano, a confusão é imensa. Se, entre os democratas, os nomes de Hillary e Obama aparecem como os mais prováveis, ninguém ousa prever nada sobre o partido de Bush. Mesmo alguns dos críticos de Junior, como o senador John Mc- Cain, não conseguem se distanciar do fiasco no Iraque e de suas trágicas conseqüências.

Se a palavra “mudança” soa falsa nos lábios dos democratas, parece uma piada quando pronunciada pelos republicanos. Sem alternativas políticas reais a oferecer ao partido e ao país, alguns de seus pré-candidatos tendem a radicalizar a plataforma religiosa, tentando captar as simpatias dos evangélicos fundamentalistas, como é o caso de Mike Huckabee (ex-governador de Arkansas): questões como o direito ao aborto e casamento entre pessoas do mesmo sexo ganham relevância sobre todas as outras.

Nem sinal de mudanças
A não ser pela “novidade” representada por Obama – mais de aparência do que de substância–, o quadro eleitoral dos Estados Unidos constitui uma monótona mediocridade. Mediocridade perigosa, numa situação mundial seriamente ameaçada por crescentes tensões regionais – especialmente no Oriente Médio –, pelo desastre ambiental e por sinais de tormentas econômicas no horizonte. Não há nenhum sinal de grandes “mudanças”, como promete Obama. E talvez esteja aí o dado mais importante: quando a opinião pública estadunidense se convencer de que terá mais do mesmo, é possível que a luta de classes se faça novamente visível nos Estados Unidos.

José Arbex Jr. é jornalista - fonte: http://carosamigos.terra.com.br/

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