segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

Consumo crítico - por Wálter Fanganiello Maierovitch - fonte: http://www.cartacapital.com.br

Consumo crítico

15/02/2008 17:48:20

Wálter Fanganiello Maierovitch

A indústria da água mineral virou o mais recente alvo dos ambientalistas. Seus protestos ganharam espaços nos programas televisivos voltados à divulgação ambiental e científica. Sob outro foco, o comércio da água mineral transformou-se em carro-chefe de programas das ONGs dedicadas a orientar sobre o consumo ético e economicamente vantajoso para os cidadãos.

Em jogo, a forte tendência de substituição da mineral pela “torneiral”. Nas academias de ginástica européias, os bebedores são cada vez mais requisitados e, nas lanchonetes do pessoal da malhação, os sucos de frutas são batidos com água de torneira.

Nos restaurantes badalados, faz parte da moda chic pedir um copo d’água de torneira e os garçons não mais consideram isso excentricidade do cliente. Não demorará muito o retorno, ao centro das mesas, das jarras enchidas nas torneiras.

A propósito, fez escola o slogan criado pelo prefeito de Nova York, Michael Bloomberg: “Esqueçam a mineral water e bebam a água que jorra diretamente das torneiras das suas casas”. Para ele, a água saída das torneiras nova-iorquinas é saudável e leve aos bolsos.

Em Veneza, no último fim de semana, o cardeal-patriarca, Angelo Scola, manifestou sua adesão à recém-lançada campanha pelo consumo de água do rubinetto (torneira). A campanha foi posta nas ruas pelo Centro Stili di Vita.

Nesta campanha embarcou o prefeito de Veneza, Massimo Cacciari, laureado em filosofia e ex-eurocomunista do grupo do saudoso Enrico Berlinguer. Segundo Cacciari, a água mineral é dispensável e ele se declarou não consumidor.

A empresa que realiza a gestão pública da água potável em Veneza mergulhou na campanha da água do rubinetto. Nos próximos dias, começará a distribuir, para 100 mil famílias, folhetos informativos e uma jarra de vidro para ser guardada na geladeira a “clara, fresca e leve água de torneira”.

Entre os prefeitos engajados está o de Chicago, que sobretaxou em cinco centavos de dólar cada recipiente de plástico com água mineral posto à venda.

Em 2007, aproximadamente, 27 mil toneladas de plástico foram empregadas na confecção de recipientes de água mineral pelo planeta. Informam os técnicos que são necessários 7 litros de água para elaborar uma embalagem plástica de um litro. E que em cada pet de um litro têm-se 100 gramas de poluentes na atmosfera.

No Brasil, cujos desmatamentos criminosos poderão ser fatais à sobrevivência da Bacia Amazônica, chama a atenção, além da resistência heróica da ministra Marina Silva, o alerta inserto no calendário promocional do Banco do Brasil, a mostrar que o futuro do planeta depende da água e do controle da poluição.

Em Londres, o Parlamento prepara uma série de restrições contra os recipientes plásticos de água, já permanentemente vistos a flutuar pelo Canal da Mancha. Também são divulgados os custos de importação de água mineral na Grã-Bretanha. Para ter idéia, nas gôndolas dos supermercados londrinos são concorridas as vendas de água mineral, ainda em plástico, proveniente de bicas vulcânicas da Nova Zelândia ou das Ilhas Fiji, no Pacífico. Quanto às Ilhas Fiji, até os corsários da rainha sabiam que a distância até Londres era superior a 20 mil quilômetros.

É relevante lembrar que na chamada Casa do Parlamento Britânico, o Palácio de Westminster, uma comissão investiga o desproporcional consumo, em 2007, de água mineral: 105 mil garrafas importadas do produto.

Como a Itália é a campeã mundial de consumo de água mineral imbottigliata, um negócio que movimenta quase 4 bilhões de euros por ano, o bem bolado programa televisivo Terzo Pianeta mostrou, no sábado passado, que as três marcas mais vendidas nos supermercados eram estrangeiras. A veneta San Benedetto ocupou o modesto quarto posto.

Com o aproveitamento de imagens das ruínas das Termas de Caracalla, a produção do Terzo Pianeta falou sobre o uso pessoal da água na Antiguidade, como os hábitos higiênicos, a terapia termal e os banhos públicos.

No interior de uma perua van transformada em estúdio móvel do Terzo Pianeta, uma historiadora recordou a fama de Luiz XIV de se lavar raramente. Idem as mulheres da corte, isto para conservar o cheiro e se distinguir das prostitutas, que se banhavam em perfumes.

A falta de noções básicas sobre higiene levou à dispensa de banheiros e banheiras no luxuoso Palácio de Versalhes, construído pelo mencionado Rei Sol.

Os árabes, por sua vez, foram os responsáveis pela disseminação da cultura do banho e da limpeza, até como prevenção às infecções.

Pano rápido. O lobby da indústria da água mineral adverte que, ao contrário da “torneiral”, ela representa um verdadeiro alimento e possui propriedades orgânicas particulares. Quanto à embalagem plástica, nenhuma palavra.

Wálter Fanganiello Maierovitch

Linha de Frente - fonte: http://www.cartacapital.com.br


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