quarta-feira, 9 de abril de 2008

A marcha da insensatez

Por Luis Nassif

Na semana passada já tinha comentado, aqui, as incongruências do Relatório de Inflação do Banco Central.

O todo era diferente da soma das partes.

Juntando as partes, tinha-se um quadro futuro de menos pressão sobre atividade econômica e preços e de aumento de riscos sobre as contas externas:

• Risco de ampliação da recessão mundial.

• Risco de queda nos preços das principais commodities.

• Aumento na percepção de risco mundial reduzindo, a médio prazo, os fluxos financeiros para o país.

Mesmo assim, as conclusões do relatório eram de que aumentaram os riscos de inflação e que as contas externas são financiáveis a médio prazo.

É curioso o jogo de opiniões em torno da decisão provável do BC de aumentar os juros:

1. Na Folha, assim como no “Valor” de ontem, Delfim Netto critica acerbamente a falta de lógica do discurso do BC, a maneira imprudente como acenou com riscos não perceptíveis.

2. Na reunião do PSDB, o ex-BC Ilan Goldjan, sustenta que, depois de ameaçar, o BC não pode recuar, sob risco de afetar sua reputação.

Nos dois casos, percebe-se que o BC errou bisonhamente no discurso.

Insisto em um ponto: foi o primeiro desafio para valer do BC, nesse novo quadro que vem pela frente. Até agora, navegava em águas tranqüilas. O governo garantia superávits fiscais, a economia mundial navegava com vento a favor, e bastava ao BC manter juros elevados e derrubar o câmbio para atender sua única meta.

Agora, tem-se, numa ponta, a deterioração das contas externas. Com a redução dos juros americanos, mais um campo para operações de arbitragem de taxas (tomar empréstimo a taxas mais baixas no exterior para aplicar a taxas mais elevadas aqui). Internacionalmente, o risco de queda persistente da atividade econômica mundial com riscos sobre preços de commodities. Além da queda da atividade econômica mundial, uma inflação mundial superior à brasileira.

Tem-se uma mudança radical nos fundamentos da economia mundial, e o BC continua preso aos mesmos paradigmas dos últimos anos. No primeiro desafio enfrentado, na preliminar do jogo principal, escorrega feio.
Um governo é avaliado pelo conjunto da obra. Se Lula avançou na gestão de investimentos, com o PAC, na Saúde, Ciência e Tecnologia, Educação e Políticas Sociais, no ponto central – a política econômica, que garante a sustentabilidade de todas as demais – é de uma imprudência ampla.

Entendem-se os cuidados em não balançar a prateleira, para os pratos não despencarem. Nosso modelo político-institucional é complicado. FHC foi até o final do mandato por sua capacidade de compor alianças políticas. Lula não caiu por seu carisma e por sua habilidade política. Nos dois casos, a instabilidade gerada principalmente pela mídia dificulta qualquer ousadia maior para a correção de rumos.

O que seria do governo Lula com uma crise financeira (inevitável na transição) se até tapioca e relatório de despesas gera CPI? Se o governo Lula fosse maior, enfrentaria o desafio. Não é. A falta de quadros e de coragem para implementar mudanças preventivas (nem se está falando de mudanças radicais) na política econômica vai custar caro ao país.

E custar caro a ele quando a crise externa bater à porta.

FONTE: Blog do Nassif
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