segunda-feira, 4 de maio de 2009

Krugman: salários baixos não trazem benefícios à economia

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Crise mundial

O economista Paul Krugman avalia o efeito da redução salarial nos EUA. Na crise, os trabalhadores americanos têm aceitado reduzir o salário para não perder o emprego. "Os salários mais baixos não trazem benefícios para a economia. Enquanto isso, a queda nos salários pode piorar os problemas da economia em outros aspectos."

A síndrome do salário em queda

por Paul Krugman
Do New York Times

Os salários estão caindo em todos os Estados Unidos.

Os cortes de salário, como a perda de bônus dos trabalhadores da Chrysler, são o preço de se receber a ajuda do governo. Outros, como o acordo para reduzir o salário aqui no The Times, são resultado de discussões entre empregadores e seus funcionários sindicalizados. Ainda assim, outros refletem um fato brutal resultante de um mercado de trabalho enfraquecido: Os trabalhadores não ousam protestar quando seus salários são cortados, porque eles acham que não conseguiriam encontrar outro emprego.

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No final das contas, os salários em queda são um sintoma de uma economia debilitada. E eles são um sintoma que pode deixar a economia ainda mais doente.

Mas vamos por partes: os boatos sobre os salários em queda estão se espalhando, mas até onde este fenômeno atinge? A resposta é: longe.

É verdade que muitos trabalhadores ainda estão recebendo aumentos. Mas já foram feitos cortes suficientes para, de acordo com o Bureau of Labor Statistics (o instituto de estatísticas do mercado de trabalho americano), elevar o custo de empregar funcionários no setor privado a apenas dois décimos percentuais no primeiro trimestre - o menor aumento de que se tem notícia. Já que o mercado de trabalho ainda está piorando, não seria de espantar que a média geral dos salários baixasse ainda este ano.

Mas por que isto é uma coisa ruim? Afinal de contas, muitos trabalhadores estão aceitando cortes de salário para salvar seus empregos. O que tem de errado nisso?

A resposta está em um daqueles paradoxos que assolam nossa economia neste momento. Estamos sofrendo do paradoxo da poupança: Poupar é uma virtude, mas quando todos tentam poupar mais ao mesmo tempo, o resultado é uma economia deprimida. Estamos sofrendo do paradoxo da desaceleração econômica: reduzir o débito e colocar em dia os saldos é bom, mas quando todos tentam vender seus bens e pegar suas dívidas ao mesmo tempo, o resultado é uma crise financeira.

Logo poderemos ter de encarar o paradoxo dos salários: os trabalhadores de uma determinada empresa podem salvar seus empregos aceitando salários menores, mas quando todos os empregadores cortam salários ao mesmo tempo, o resultado é um desemprego maior.

O paradoxo funciona da seguinte forma: suponhamos que os trabalhadores da empresa XYZ aceitem um corte de salário. Isto permite que a gerência da XYZ corte os preços, tornando seus produtos mais competitivos. Os salários aumentam e mais trabalhadores podem manter seus empregos. Então você acaba pensando que os cortes de salário aumentam os empregos - o que não deixa de ser verdade se pensarmos no empregador individual.

Mas se todos aceitarem este corte de salário, ninguém fica com vantagem competitiva. Então os salários mais baixos não trazem benefícios para a economia. Enquanto isso, a queda nos salários pode piorar os problemas da economia em outros aspectos.

Em especial, as quedas de salário e, por consequência, as rendas mais baixas, pioram o problema do excesso de dívidas. O pagamento mensal da hipoteca não estará de acordo com o salário. Os Estados Unidos chegaram a esta crise com uma dívida familiar ocupando uma porcentagem da renda tão alta quanto não se via desde a década de 1930. As famílias estão tentando diminuir esta dívida economizando como há dez anos não faziam - mas quando os salários caem, é como se eles tentassem acertar um alvo em movimento. E o aumento das dívidas achatará o consumo e manterá a economia deprimida.

As coisas pioram ainda mais se as empresas e consumidores esperarem que os salários caiam ainda mais no futuro. John Maynard Keynes falou claramente, há mais de 70 anos: "O efeito de uma expectativa de queda de salário a 2 por cento, por exemplo, no ano seguinte será mais ou menos o equivalente ao efeito de um aumento de 2 por cento no valor dos juros naquele período." E um aumento nas taxas de juros é a última coisa que uma economia precisa.

A preocupação com os salários em queda não é apenas teoria. O Japão - onde os salários do setor privado caíram em média um por cento ao ano de 1997 a 2003 - serve de lição sobre o efeito da deflação de salário na estagnação da economia.

Então o que podemos concluir das provas crescentes da queda dos salários nos Estados Unidos? Principalmente que estabilizar a economia não é suficiente: precisamos de uma recuperação de verdade.

Tem se falado muito sobre as novas esperanças, e realmente há indicações de que a queda da economia que iniciou no ano passado tenda a diminuir. O Bureau Nacional de Pesquisas Econômicas pode até declarar a recessão como terminada ainda este ano.

Mas o índice de desemprego certamente continuará aumentando. E todos os sinais apontam para um mercado de trabalho inóspito para os próximos meses, ou mesmo anos, o que é uma receita inevitável para os cortes de salário, que acabarão mantendo a economia fraca.

Para quebrar este círculo vicioso, precisamos basicamente de mais: mais estímulos, mais ações decisivas por parte dos bancos e a criação de mais empregos.

Mas devemos dar o crédito a quem merece: O presidente Barack Obama e seus conselheiros econômicos conseguiram desviar a economia do abismo. Só que o risco de que os Estados Unidos virem um Japão - encarando anos de deflação e estagnação - parece estar aumentando.

Paul Krugman é economista, professor da Universidade de Princeton e colunista do The New York Times. Ganhou o prêmio Nobel de economia de 2008. Artigo distribuído pelo New York Times News Service.

Fonte: Terra Magazine

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