Fábio Feldmann*
De São Paulo
Novamente os noticiários mostram imagens chocantes de chuvas e alagamentos no Brasil. O filme visto em Santa Catarina em fevereiro deste ano, desta vez se passa no Nordeste do país, mais especificamente nos estados da Bahia, Maranhão, Piauí e Ceará, onde as chuvas já fazem 42 vítimas e deixam mais de 200 mil pessoas prejudicadas.
A seca, por sua vez, rotineiramente discutida quando se trata dos problemas do Nordeste, agora é protagonista nos terrenos do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, nos quais 196 e 108 municípios, respectivamente, estão em estado de emergência pela falta de chuvas. O pantanal mato-grossense também pode ser um exemplo já que experimenta em 2009 o período mais seco dos últimos 35 anos.
Insisto em escrever sobre este tema - o aquecimento global, pois os fatos ocorridos ultimamente estão se tornando corriqueiros e comprovando as projeções científicas. Embora não possamos responsabilizar o aquecimento global diretamente pelos ocorridos, dada a sempre existente possibilidade de ser um evento natural, ficam cada dia mais evidentes as conseqüências deste fenômeno. O IPCC - Painel Intergovernamental de Mudanças do Clima, já alertava em seu último relatório de 2007 o provável aumento de enchentes e a modificação dos padrões de precipitação que afetariam inclusive o suprimento de água.
Mais recentemente, no início de 2009, foi publicado no International Journal of Climatology um estudo sobre as futuras mudanças de temperatura e precipitação extremas na América do Sul, desenvolvido pelo Office Hadley Center e pelo INPE - Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, do qual participou o brasileiro José Antonio Marengo. O estudo projeta que as precipitações e secas extremas devem continuar a ser intensificadas em relação ao observado na segunda metade do século vinte.
São em cenários como esses que começamos a contar os refugiados ambientais, que segundo o PNUMA (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente) são caracterizados como "pessoas que foram obrigadas a abandonar temporária ou definitivamente a zona onde tradicionalmente vivem, devido ao visível declínio do meio ambiente (por razões naturais ou humanas) perturbando a sua existência e/ou qualidade da mesma de tal maneira que a subsistência de tais pessoas entra em perigo".
Participei, no final do ano passado na Polônia, da COP 14, a Conferência das Partes realizada no âmbito da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima. Durante o encontro fiquei chocado com a informação divulgada por Craig Johnstone, representante do Alto Comissariado para Refugiados da ONU (Acnur), de que existem hoje 25 milhões de pessoas que já podem ser consideradas refugiados ambientais, e estima-se que até 2050 hajam de 250 milhões a 1 bilhão destes refugiados no mundo.
Coincidência ou não, os eventos extremos estão ocorrendo e o número de refugiados ambientais está crescendo. As negociações, no entanto, não estão acompanhando o ritmo com que as conseqüências do aquecimento global têm se mostrado. Um novo acordo que substituirá o Protocolo de Kyoto vem sendo discutido desde a COP-13 em Bali e existe a pretensão de que ele seja negociado na próxima Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas no final deste ano em Copenhague.
As diversas evidências da necessidade de mitigação e de adaptação não têm sido o suficiente para fazer com que governos e sociedade tratem o aquecimento global com a devida urgência. No Brasil o assunto ainda é tido como futuro e não presente, sendo que o maior desafio hoje é colocar o tema efetivamente na agenda dos tomadores de decisão.
Forte: Terra Magazine
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