sexta-feira, 22 de maio de 2009

Cuidado com os erros de um ex-ministro da Saúde sobre a gripe suína

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por Conceição Lemes

No dia 27 de abril, o governador de São Paulo, José Serra (PSDB), que vive dando pitacos em questões médicas e de saúde como se fosse doutor, falou à imprensa em Ribeirão Preto, interior do estado, sobre a gripe suína (para ver o vídeo, clique aqui):

"Gripe suína, ela é transmitida dos porquinhos para as pessoas só quando eles espirram ou quando a pessoa chega lá perto do nariz do porco. Portanto, a providência elementar é não ficar perto de porquinho algum, mesmo não tendo gripe suína no Brasil pelo que se constata até agora. Ela pode ser feita a transmissão, isto sim, de pessoa a pessoa. Agora nós não temos nenhum caso ainda registrado..."

Exceto no finalzinho, Serra errou feio. Para qualquer governador, revela despreparo. Para quem também já foi Ministro da Saúde (1998-2002), deplorável.

No dia 12 de maio, durante almoço com suinocultores, Serra disse que não disse o que disse. (Leia aqui) A fala do governador, editada no vídeo, reflete exatamente o que Serra disse. Prevaleceu o velho ditado: filho feio não tem pai.

Para que não houvesse qualquer dúvida -- afinal, saúde é uma área em que não se pode errar sob pena de colocar a vida das pessoas em risco – esta repórter resolveu consultar esta semana o Centers for Disease Control and Prevention, o poderoso CDC dos Estados Unidos, sobre o assunto. O CDC é referência mundial para controle e prevenção de doenças. Foi a instituição que identificou o vírus causador da gripe suína, o A (H1N1)

O CDC tem um serviço de informação que funciona 24 horas por dia, durante os sete dias da semana. Esta repórter enviou ao CDC-Info um e-mail como simples cidadã. Em inglês, sem dizer que era brasileira nem identificar o governador Serra como autor da mensagem equivocada, disse que a recebeu e estava muito preocupada. Queria saber se era verdade ou mentira toda a parte suína. Perguntou ainda se poderia pegar a gripe A (H1N1) do porquinho que a mãe tem na fazenda.

O CDC-Info retornou horas mais:

Como acontece com todos os germes que facilmente passam de pessoa para pessoa, a prática de bons hábitos de higiene é a forma mais eficaz para evitar a propagação do novo vírus H1N1. Lavar frequentemente as suas mãos ajudará a proteger você dos germes. Lave com água e sabonete ou higienize as mãos com preparação alcoólica.

O CDC recomenda que quando você lavar as suas mãos – com água quente e sabonete --, faça-o por 15 a 20 segundos. Quando sabonete e água não forem disponíveis, lenços de papel embebidos em álcool ou gel higienizador podem ser usados. Jogue-os fora após cada utilização. Caso utilize gel, esfregue as mãos até elas secarem. O álcool mata os germes.

O álcool a que se refere o CDC e mata os germes é o álcool 70%. Há também o álcool em gel a 70%. É aquele gel que a gente esfrega nas mãos antes de entrar na UTI ou mesmo no quarto de alguns bons hospitais.

E “a providência elementar de ficar longe do porquinho”, preconizada pelo Serra para se proteger da gripe suína? Nenhuma palavra do CDC.

E sobre risco de a repórter pegar gripe suína do porquinho que a mãe tem na fazenda? Também nenhuma palavra do CDC .

Para bom entendedor, o silêncio basta. Em vez de dar trela às asneiras escritas no e-mail que enviei, o CDC-Info preferiu ensinar o que realmente funciona para a prevenção da gripe suína.

OS ERROS DE SERRA SOBRE A GRIPE SUÍNA

“E quais foram exatamente os erros de Serra”, alguém, nesta altura, talvez esteja perguntando. Vamos a eles:

A atual gripe suína não é transmitida dos porquinhos para as pessoas. Questionada sobre o tema, OMS foi taxativa: até o momento não há confirmação de transmissão do vírus de suínos para seres humanos.

Aliás, o que se detectou é o contrário. Gente transmitindo gripe para porquinhos. Isso aconteceu há poucos dias, no Canadá , quando um indivíduo que trabalha lá voltou do México com gripe e transmitiu o vírus A/H1N1 aos porcos. Talvez a pessoa tenha espirrado na cara dos porquinhos.

Há mais de 30 anos o vírus da gripe do porco circulou no ambiente humano. Na ocasião, causou um surto em um destacamento militar em Forte Dix, New Jersey, Estados Unidos. Foi um surto localizado, infectando cerca de 230 pessoas, 13 de forma grave, com um óbito. Não houve casos documentados fora da instituição militar.

O A/H1N1 é um vírus de porco. Entretanto, no seu genoma, há pedaços de vírus de porco, aves e ser humano. Em algum momento da história - e não foi agora -- o vírus do porco passou para o homem.

Não está tendo surto de gripe em porcos no México nem nos Estados Unidos. Nesses países, as pessoas que tiveram a gripe A (H1N1) não têm criações de porcos.

Tanto que esses países não recomendaram às pessoas que ficassem longe dos porquinhos, para evitar a gripe A (H1N1). A OMS também não incluiu a diretriz de Serra -- ficar longe dos porquinhos -- como medida preventiva contra o atual surto de gripe suína.

“Afinal, por que o Serra se meteu a falar do que não entende?”, talvez seja a outra pergunta que alguns façam. Primeiro, porque, desde que passou pelo Ministério da Saúde, Serra palpita sobre questões de medicina e saúde, como se fosse cientista ou doutor.

Segundo, Serra supôs que iria faturar, aumentando o seu currículo na área de saúde com vistas a 2010. Afinal, saúde será uma das bandeiras principais da sua candidatura à presidência da República, em 2010. Usou-a nas eleições de 2002, 2004 e 2006.

Terceiro, entre muros, o governador de São Paulo, José Serra, mestre e doutor em Economia, ex-ministro da Saúde, anda incomodado com o brilho do atual ministro da Saúde, José Gomes Temporão, em lidar com a gripe suína. Temporão é do ramo: médico, fez residência em doenças tropicais, mestrado em saúde pública e doutorado em medicina social. O desempenho do Ministério da Saúde e do seu corpo técnico tem recebido aplausos, aqui e no exterior.

No dia 24 de abril, a Organização Mundial da Saúde (OMS) fez um alerta global sobre a ocorrência de casos de gripe suína em humanos no México e nos Estados Unidos. Imediatamente, no Brasil, o Ministério da Saúde decretou emergência em saúde pública para enfrentar a nova ameaça, rebatizada de gripe A (H1N1).

“Realmente, o Brasil está preparado para enfrentar a gripe A (H1N1)”, observa o médico epidemiologista Jarbas Barbosa da Silva Jr., gerente da área de Vigilância em Saúde e Manejo de Doenças da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), em Washington, EUA. “Tanto a vigilância epidemiológica como a rede de saúde estão em condições de detectar precocemente, reduzir a transmissão e tratar os casos que porventura aconteçam.”

“A atuação do Ministério da Saúde tem sido bastante eficiente. Para começar, abrindo completamente as informações ao público e à mídia”, avalia o médico e especialista em política de saúde pública Jairnilson Paim, professor titular do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia – UFBA. “A articulação da Secretaria de Vigilância em Saúde [SVS] com a Anvisa [Agência Nacional de Vigilância Sanitária], outros ministérios e estados, além de democrática, mostra competência. Estou muito orgulhoso com o nível que o Sistema Único de Saúde [SUS] alcançou e a postura do ministro Temporão de transparência, de não enganar a população. Eu nunca tinha visto isso antes aqui".

Por isso, recomendamos: lave freqüentemente as mãos com água e sabonete. É eficaz, simples e custa quase nada. Protege você não só da gripe suína mas também das gripes sazonais, resfriados e diarréias durante os 365 dias do ano. E cuidado com as informações do “doutor” Serra sobre medicina: elas podem fazer mal à saúde.

Fonte: Vi o Mundo - Blog da Saúde

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