quarta-feira, 10 de setembro de 2008

Dalmo Dallari, sobre Gilmar Mendes

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Por Glauco Faria

No dia 8 de maio de 2002, Dalmo Dallari (foto), advogado e professor de Direito na Universidade de São Paulo (USP, publicou um artigo na Folha de São Paulo criticando duramente a indicação, pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso, de Gilmar Mendes para o Supremo Tribunal Federal (STF). Alguns trechos do artigo, intitulado “Degradação do Judiciário”:

“(...) O presidente da República (na época, FHC), com afoiteza e imprudência muito estranhas, encaminhou ao Senado uma indicação para membro do Supremo Tribunal Federal, que pode ser considerada verdadeira declaração de guerra do Poder Executivo federal ao Poder Judiciário, ao Ministério Público, à Ordem dos Advogados do Brasil e a toda a comunidade jurídica. Se essa indicação vier a ser aprovada pelo Senado, não há exagero em afirmar que estarão correndo sério risco a proteção dos direitos no Brasil, o combate à corrupção e a própria normalidade constitucional”. “Segundo vem sendo divulgado por vários órgãos da imprensa, estaria sendo montada uma grande operação para anular o STF, tornando-o completamente submisso ao atual chefe do Executivo, mesmo depois do término de seu mandato. Um sinal dessa investida seria a indicação, agora concretizada, do atual advogado-geral da União, Gilmar Mendes, alto funcionário subordinado ao presidente da República, para a próxima vaga na Suprema Corte. Além da estranha afoiteza do presidente -pois a indicação foi noticiada antes que se formalizasse a abertura da vaga-, o nome indicado está longe de preencher os requisitos necessários para que alguém seja membro da mais alta corte do país”.

"É importante assinalar que aquele alto funcionário do Executivo [Gilmar Mendes] especializou-se em "inventar" soluções jurídicas no interesse do governo. Ele foi assessor muito próximo do ex-presidente Collor, que nunca se notabilizou pelo respeito ao direito. Já no governo Fernando Henrique, o mesmo dr. Gilmar Mendes, que pertence ao Ministério Público da União, aparece assessorando o ministro da Justiça Nelson Jobim, na tentativa de anular a demarcação de áreas indígenas. Alegando inconstitucionalidade, duas vezes negada pelo STF, "inventaram" uma tese jurídica, que serviu de base para um decreto do presidente Fernando Henrique revogando o decreto em que se baseavam as demarcações. Mais recentemente, o advogado-geral da União, derrotado no Judiciário em outro caso, recomendou aos órgãos da administração que não cumprissem decisões judiciais."

"Medidas desse tipo, propostas e adotadas por sugestão do advogado-geral da União, muitas vezes eram claramente inconstitucionais e deram fundamento para a concessão de liminares e decisões de juízes e tribunais, contra atos de autoridades federais."


Dallari sabia do que falava. No mesmo mês, ele se juntaria a Fábio Konder Comparato em uma manifestação contra a indicação feita pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso, promovida por estudantes de Direito. Ali, Dallari voltou a lembrar o "currículo" de Mendes, alertando que o hoje ministro do STF propôs a ação declaratória de constitucionalidade sobre a medida provisória do Apagão, deixando de lado a possibilidade de incidência do Código de Defesa do Consumidor. Dallari citou também a oposição feita por Mendes em relação à investigação de contas no exterior de Paulo Maluf.

Outros também se insurgiram contra a indicação de FHC. O advogado mato-grossense Celso Araújo entrou com uma ação popular para impedir a nomeação e a posse de Gilmar Mendes. Ele finalizou seu pedido afirmando que o artigo 5º da Constituição é uma "quimera", pois existem pessoas "mais iguais que outras", fazendo referência ao fato de que ele foi retirado da lista tríplice para o cargo de juiz no TRE local, com base no fundamento de que tinha contra si um processo criminal, mas o mesmo não se deu com Gilmar Mendes. O futuro ministro respondia à ação de improbidade administrativa, extinta em abril de 2008 por seus colegas de Supremo.A Associação dos Magistrados Brasileiros também se posicionou publicamente contra a indicação, já que, uma vez no STF, Mendes poderia julgar causas as quais ele mesmo como advogado-geral da União havia sustentado a favor do governo. Mas nenhum tipo de movimentação comoveu o então presidente e Mendes foi ao STF. Arranjou briga com o Ministério Público quando analisou o recurso da prefeita de Magé, em 2006, em que pedia foro privilegiado para julgamento de uma ação de improbidade administrativa. Ali, Mendes tentou desmoralizar o trabalho do MP ao afirmar que os promotores moviam ações em defesa de interesses pessoais, corporativistas e políticos.

Naquela sentença, Mendes dizia que o foro privilegiado servia “para que os chefes das principais instituições públicas sejam julgados perante um órgão colegiado dotado de maior independência e de inequívoca seriedade.” Dada a manifestação de juízes federais em favor de Fausto de Sanctis (clique aqui para ler o blogue feito em sua defesa), de procuradores, delegados e de juristas, talvez hoje muitos duvidem da “independência” e “inequívoca seriedade” de determinados órgão colegiados... Não é à toa que se avizinha uma crise institucional envolvendo o mais hermético dos poderes, o Judiciário.

Fonte: Blog do Rovai

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