. O senador tucano Eduardo Azeredo, de MG, escreveu o “AI-5 digital”.
. Ele é o autor do PLS-76/2000 que torna crime o dono do provedor que não denunciar o que achar suspeito.
. Com isso, o provedor, sob remuneração, pode espionar livremente as atividades de quem comprar espaço em seu provedor.
. Ou seja, pode legalizar os crimes de espionagem de Daniel Dantas.
. Diz o item III do Artigo 22 do projeto, que trata do “responsável pelo provimento de acesso à rede mundial de computadores …”:
“III – (é dever dele) informar de maneira SIGILOSA (ênfase minha – PHA) à autoridade competente, denúncia que tenha recebido e contenha indícios da prática de crime sujeito a acionamento penal público, cuja perpetração haja ocorrido no âmbito da rede de computadores sob sua responsabilidade.”
. Em qualquer democracia do mundo, o provedor só pode revelar sigilo de seu freguês com ordem judicial.
. Nas democracias, só quebra sigilo quem segue o rito judicial.
. “Vai dar uma olhada na vida desse cara pra mim.”
. Pode dizer um policial corrupto que esteja a serviço de um contumaz grampeador, como, por exemplo, Daniel Dantas, flagrado na Operação Chacal.
. Essa do senador tucano é coisa de stalinismo, nazismo, ditadura militar – ou do Brasil em que vivemos.
. Essas reflexões surgiram com a entrevista que Paulo Henrique Amorim fez com o deputado Paulo Teixeira, do PT de SP e membro da Comissão de Ciência e Tecnologia.
. O projeto de Eduardo Azeredo está em discussão na Câmara.
. Eduardo Azeredo é aquele do “mensalão tucano”, que inaugurou os serviços empresariais de Marcos Valério.
. E vai ter o prazer de ser julgado pelo Ministro Joaquim Barbosa.
Ouça a entrevista com Paulo Teixeira.
E leia abaixo a integra da entrevista:
PHA – Eu gostaria de recorrer à sua opinião sobre o projeto de lei já aprovado no Senado Federal, um projeto de autoria do Senador Eduardo Azeredo, do PSDB de Minas, que trata do acesso ou do sigilo da informação no provedor na internet. O que diz esse projeto de lei e qual a sua opinião sobre ele?
PT – Paulo, primeiro esse projeto de lei, ele diz muita coisa, não é? Ele pretende, em primeiro lugar, introduzir no Brasil uma coisa que alguns países estão introduzindo e que no Brasil, na minha opinião, nós não deveríamos permitir que se introduzisse. Ele está querendo introduzir os mecanismos de controle da internet para a garantia do direito autoral. O que que é isso? Por exemplo, esse processo de baixar música, de produzir filme, de montar histórias, não é? Enfim, ele está querendo criminalizar esse tipo de prática e, portanto, embarcar a internet nesse tipo de controle, né? Nos países onde a indústria de entretenimento, a indústria fonográfica, nos países sede dessas indústrias, eles estão conseguindo introduzir e penalizar duramente aquelas pessoas que baixam música na internet, etc, né? Portanto o que a gente tem que ver é isso interessa a nós no Brasil botar esse controle dentro da internet? Então o nosso país, enquanto país, não assinou a convenção de Budapeste, que é exatamente a tentativa desses países que são de primeiro mundo, desenvolvidos e são sedes dessas indústrias, querer introduzir na internet nos outros países um mecanismo de controle e criminalização dessas práticas. Então, em primeiro lugar, ele quer o que hoje é assim o estágio mais rígido da propriedade intelectual, eles querem introduzir na internet e ao mesmo tempo criminalizar práticas que não tem objetivo comercial. Por exemplo, não sei se você conseguiu assistir a um filme que está passando no YouTube, em que uma pessoa pega uma música americana que traduzindo é “vocês nos seguirão” e botam o Ronaldinho eo Lula ….
PHA – Nós aqui no Conversa Afiada fazemos isso com muita frequência. Agora mesmo, por exemplo, temos um jingle da campanha de José Serra para prefeito em 2002 como a linha de áudio da relação dos senadores que querem a CPI da Petrobras. Alguém baixou o áudio do jingle do Serra…
PT – É, então, o que que acontece? Hoje você tem um processo de criação pela internet sem fins lucrativos, né, e que é exatamente o espaço de liberdade, de criação. Os adolescentes hoje constroem histórias, filmes, enfim, se utilizam de trilhas sonoras, etc, e o que se pretende hoje é criminalizar esse tipo de prática na internet. Então, esse projeto traz esse interesse e, ao meu ver, ele não deve ser aceito porque engessa a internet, perde a capacidade de ser um espaço de criação e também, digamos assim, estabelece que práticas corriqueiras e comuns e transformam em práticas desvirutosas e estende o código penal até elas. Então, esse é o primeiro aspecto que nós entendemos que esse projeto de lei não seja admitido. O segundo aspecto é que ele também tenta criminalizar coisas que em últimos projetos não está discutido. Não que a sociedade não deva discuti-las, mas por exemplo, essa história da pessoa fazer uma ligação clandestina de TV a cabo, não é? Ta lá no projeto dele, portanto, é mais uma maneira de trazer algo que a sociedade não discutiu. Se ele quiser discutir isso, a meu ver, mercê um projeto específico para dizer “olha eu quero criminalizar esse tipo de prática”, e ao criminalizar essa prática discutir em sociedade como fazê-lo. Mas não pode digamos fazer de uma maneira imposta esse projeto. Em terceiro lugar, ele está querendo utilizar de uma prática que, a meu ver, é criminosa. Isto é, ele está permitindo que todo o provedor de acesso, então, por exemplo, quem usar um provedor de acesso e esse provedor tiver alguma desconfiança que alguma pessoa praticou crime pela internet esse provedor terá que avisar a polícia. Certo?
PHA – Deputado, para ajudar aqui o nosso internauta, ele diz o seguinte, o parágrafo terceiro deste artigo: “informar de maneira sigilosa a autoridade competente denúncia que tenha recebido que contenha indício da prática de crimes sujeito acionamento penal público incondicionado, cuja perpetração haja ocorrido no âmbito da rede de computadores sob sua responsabilidade”. Aqui ele está tratando de um provedor exatamente.
PT – É. O que ele está permitindo que um provedor faça: quebre o sigilo das comunicações. A proteção ao sigilo das comunicações é uma proteção constitucional. Só pode haver uma maneira de quebra do sigilo, segundo a nossa Constituição: com ordem judicial. Então, o que eles estão querendo fazer. Fazer do provedor um delator. Isto é, tem dois valores embutidos aí. O primeiro valor é, você, provedor, ao saber de alguma irregularidade denuncia à polícia. Então você vai ser o delator de qualquer ato que seja uma anomalia dentro da internet. O segundo, tem outro valor. Quando a pessoa souber, na verdade ela vai bisbilhotar a comunicação. Ela vai quebrar o seu sigilo sem ordem judicial. O que não quer dizer também que o provedor pode ter alguma informação sobre você sem que tenha o rito judicial para que ele tenha essa informação.
PHA – Então ela pode também entrar no comércio do grampo clandestino e vender essa informação…
PT – Isso pode servir para espionagem, para disputas comerciais, disputas profissionais. Eu posso pedir ao provedor, olha, você poderia dar uma olhada na vida de tal sujeito para mim. Percebe? Portanto, e também você dá superpoderes à polícia, não é? A polícia, se ela quiser investigar, ela tem que ter tecnologia para investigar. Se ela desconfia de algum tipo de prática, a legislação permite que ela instaure um inquérito, peça a quebra do sigilo para a investigação criminal. Ela não está tolhida do direito e do poder de fazê-lo. Agora, nós estamos num Estado de Direito. Estado Democrático de Direito, portanto, para você quebrar o sigilo que é parte, digamos, do direito à privacidade da pessoa, você só pode fazer com um rito. E o rito que se permite é o rito judicial. Então esse projeto está sendo chamado de um projeto “vigilantista”. Isto é, que estabelece uma sociedade de vigilância.
PHA – Isso deveria funcionar muito bem no stalinismo, não é?
PT – Isso num estado totalitário, tem um sentido. No stalinismo, nazismo, a ditadura militar que nós tivemos, ta certo? O projeto foi equiparado ao AI5 digital. Foi chamado assim pela sociedade, pelos movimentos pela liberdade na internet. Por quê? Porque no AI5, quem morava em prédios, o zelador tinha que comunicar sobre o novo morador para o DOPS. Então agora, digamos assim, o provedor terá que dizer se há alguma irregularidade Olha, se a pessoa denuncia, denuncia à polícia. Você vai co-responsabilizar o provedor, estabelecendo um teor de insegurança na privacidade das pessoas. Porque o provedor, no Brasil nós temos inúmeros provedores, mais de 200, então numa cidade pequena, do interior, se alguém quiser saber da intimidade de uma pessoa, seja ela mulher, seja ela um homem, poderá buscar junto ao dono do provedor, porque ele terá a informação, e portanto…
PHA – Me permita a liberdade, isso aí é a legalização do que faz o Daniel Dantas?
PT – É. É basicamente isso, ta certo? Você vai legalizar aqueles que vivem do expediente de quebrar a privacidade das pessoas, ta certo? Uma pessoa como ele, que vivia da espionagem dos seus adversários, que pagava pessoas para profissionalmente fazer isso, o que aconteceu é que nós vamos garantir que pessoas dessa natureza tenham uma atividade legal. O que eu acho que é importante colocar, Paulo, é o seguinte: desse processo todo, da internet, ele vem sendo feito para discutir crimes que são praticados na internet. Então, o que nós precisamos discutir? Nós precisamos ter que a internet é um espaço da liberdade. Então, antes de nós querermos criminalizar todas as práticas, nós temos que estabelecer um plano de direitos para discutirmos o que tem que ser tipificado como… Por exemplo, eu diria o seguinte: subtrair dinheiro pela internet é crime? Ora, subtrair dinheiro é crime pela internet e fora da internet. Isso já existe, é o crime de furto. Número dois: como é que os bancos vão se proteger do ponto de vista dos procedimentos e do ponto de vista tecnológico. Como assim do ponto de vista dos procedimentos? Por exemplo, uma empresa emite seis cheques. Claro que a compensação há uma conferência entre o banco e o emissor. Será que nossas instituições financeiras vão estabelecer os procedimentos corretos? Será que a tecnologia também é uma tecnologia que o investimento nela, apesar dos bancos hoje terem os seus juros altos, será que eles estão investimento adequadamente em tecnologia e procedimentos para proteger o correntista? Bom, então, nós vamos dizer, o crime é praticado na rua, então, doravante, para você sair na rua vai ter que dar publicidade, para você sair na rua você vai ser filmado. E se eu desconfiar que você pode praticar algum crime eu vou, então, denunciar. Isso vai criar uma sociedade de terror. Aquela história do Big Brother está aí sendo configurada. Certamente, como se configura isso? Você cria um ambiente de medo. Foram aí para a questão da pedofilia, foram averiguados 18 mil logs. Dezoito mil pessoas foram investigadas para se achar 167 computadores que praticavam pedofilia. Isso antes da decisão judicial. O que nós precisamos fazer também é um diálogo. Que a Polícia Civil, que o Ministério Público, doravante, se quiserem fazer investigação, façam e peçam a quebra do sigilo. Nós não podemos criar uma base na sociedade que é a base da insegurança em relação à privacidade. Senão, já, já, você vai tornar a internet um lugar inseguro para se comunicar, para manter o que a Constituição coloca como um valor que é a proteção da privacidade, da intimidade da pessoa.
PHA- OK, deputado, muito obrigado.
PT – Muito obrigado, Paulo. Quero dizer a você que nós seremos radicalmente contra esse projeto e queremos pedir a seus internautas a opinião sobre ele.
PHA – Teremos muitas opiniões.
::
Nenhum comentário:
Postar um comentário