sexta-feira, 8 de maio de 2009

Revogação total da Lei de Imprensa amaeça a democracia

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Em nota, o Intervozes questiona a revogação total da Lei de Imprensa e aponta danos à democracia causados pela ausência de regulação do setor

No dia 30 de abril de 2009, o Supremo Tribunal Federal revogou a Lei nº 5.250/67, que “regula a liberdade de manifestação do pensamento e de informação”. A extinção da lei foi apoiada por sete dos 11 ministros do STF. Criada no regime militar, a Lei de Imprensa de fato confrontava princípios constitucionais (no artigo 5º, incisos IV, V, IX, X, XIII e XIV e nos artigos 220, 221, 222 e 223) e tratados internacionais no que tocam direitos fundamentais como a liberdade de expressão. Antes da revogação total da Lei, em 27 de fevereiro de 2008, o Supremo referendou a liminar do ministro Carlos Ayres Britto que suspendeu 20 dos 77 artigos da Lei de Imprensa (Lei 5.250/67).

Na maioria dos artigos revogados pelo ministro Carlos Ayres Brito, estavam expressas ordenações autoritárias e regulamentações já superadas por outras leis, como censura a espetáculos e diversões, apreensão e fechamento de empresas de comunicação, por mero ato do Executivo, sob o argumento de "subversão da ordem política e social”, limites à indenização por dano moral, entre outros. Em virtude de seu caráter autoritário e de sua anacronia jurídica fazia sentido que fossem declarados revogados os artigos 20 (especialmente seu § 3º); 21 (especialmente seu § 2º); 22; 23; 53, I; e 57, § 6º da Lei n. 5.250/67 (Lei de Imprensa), em face de sua não-recepção pela Constituição Federal de 1988.

Porém, a necessidade de se livrar do entulho autoritário não significa dispensar uma regulamentação para mediar uma relação desigual entre os detentores dos meios de comunicação e os cidadãos. Conforme descreve a Amicus Curiae de autoria da organização social Artigo 19, “toda pessoa tem o direito de ter igual oportunidade não apenas de receber, mas também de buscar e difundir informações e idéias por qualquer meio de comunicação. Monopólios e oligopólios, por exemplo, contrariam essa lógica na medida em que constituem sério obstáculo ao direito dos indivíduos e grupos de se expressarem, produzirem e receberem informação diversa”. O exercício da plena liberdade de expressão e imprensa está necessariamente condicionado “à regulamentação de temas como o combate à concentração, o direito de resposta e a responsabilização pela divulgação de informações falsas”.

É importante reafirmar a necessidade de regulação da atividade de imprensa, pois tornou-se prática corrente entre os detentores do meios de comunicação invocar a liberdade de expressão a cada tentativa do Estado de regulamentar sua atividade. Um exemplo simbólico foi a reação da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) à Classificação Indicativa da programação televisiva. O instrumento que tem como objetivo classificar o conteúdo televisivo de acordo com a faixa etária adequada a assistir o produto foi acusado de “ferir a liberdade de expressão”.

Sem dúvida, é fundamental apagar qualquer vestígio de autoritarismo e censura, o que não significa acabar com os instrumentos legais que regulam a atividade de imprensa. Para além disso, é preciso fazer uma diferenciação muito clara entre censura e controle social. Exercido pela sociedade, o controle social tem como centro de sua ação o monitoramento e a avaliação dos conteúdos veiculados pelos meios de comunicação, buscando denunciar notícias, programas e textos que violem direitos humanos e criminalizem movimentos sociais.

Ao contrário dos que defendem a não regulamentação da atividade da imprensa, o Intervozes acredita que é necessário reforçar o sistema e as leis que dão aos cidadãos o direito de processar e punir meios de comunicação de massa quando esses cometem injúria, calúnia ou difamação. Neste sentido, a imprensa não pode ficar sem um marco regulatório que defina suas responsabilidades e que garanta os direitos dos que "não são imprensa" em relação ao poder dos "que são imprensa". Ou seja: a revogação pró-forma de artigos de uma lei já caduca, em função tanto da sobreposição de legislação maior e/ou mais recente (a Constituição, especialmente), como da jurisprudência, não pode significar de maneira alguma a desregulamentação da atividade específica e especial que é o trabalho de imprensa.

Por tudo isso, o Intervozes discorda da revogação total da Lei de Imprensa e soma-se a outras organizações pela aprovação de uma nova lei. O coletivo também defende que a I Conferência Nacional de Comunicação, que acontecerá em dezembro, seja um espaço privilegiado para que a sociedade discuta a regulação das atividades do setor.

Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social

Fonte: Intervozes

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