Conhecido nacionalmente por sua cruzada contra a corrupção e em defesa da moralidade pública, o senador Pedro Simon (PMDB-RS) pouco tem a dizer sobre as denúncias de corrupção envolvendo correligionários e aliados políticos no RS. Na geografia moral do senador, seu Estado parece não existir.
por Marco Aurélio Weissheimer
O senador Pedro Simon (PMDB-RS) é conhecido nacionalmente por sua cruzada contra a corrupção e pela defesa da moralidade pública. A retórica inflamada do senador gaúcho na tribuna do Senado é cantada em prosa e verso por seus correligionários, eleitores e admiradores.
Um estranho fenômeno, porém, atingiu o senador desde novembro de 2007, quando a Polícia Federal desencadeou a Operação Rodin no Rio Grande do Sul. A operação prendeu uma quadrilha acusada de desviar recursos públicos do Departamento Estadual de Trânsito (Detran) no Estado. Para surpresa da população gaúcha, figuras até então respeitáveis da política local foram denunciadas como chefes da quadrilha, dando início a uma grave crise que atingiu em cheio o governo de Yeda Crusius (PSDB).
Com vários aliados acusados de integrar a quadrilha, Simon silenciou. Seguia fazendo seus discursos em Brasília, mas o Rio Grande do Sul foi riscado de sua geografia moral. A ausência de questionamentos na mídia contribuiu para alimentar esse silêncio. Em agosto deste ano, porém, uma nova denúncia abalou mais uma vez esse silêncio.
Atendendo a pedido da Procuradoria Geral da República, o Supremo Tribunal Federal autorizou a investigação de ilustres integrantes do PMDB gaúchos, acusados de envolvimento com um esquema de fraude na prefeitura de Canoas, administrada pelo tucano Marcos Ronchetti.
Estão sendo investigados, entre outros, o deputado federal Eliseu Padilha (ex-ministro dos Transportes do governo FHC), o presidente da Assembléia Legislativa, Alceu Moreira, o deputado estadual Marco Alba (atual secretário de Habitação do governo Yeda), e o prefeito de Sapucaia do Sul, Marcelo Machado, todos do PMDB.
O silêncio do senador acabou tornando-se ensurdecedor e ele acabou falando. Na manhã de 9 de setembro, em entrevista à rádio Gaúcha, Simon criticou as investigações considerando “infeliz” o momento em que ocorrem, referindo-se ao período das eleições municipais. “Esse problema de Canoas está aí há dois anos. Não é feliz iniciar uma discussão que nem essa há 30 dias da eleição. Podia ter tirado da gaveta há um ano e esse assunto já teria sido discutido”, disse o senador, que não tomou nenhuma iniciativa para “tirar esse assunto da gaveta” há um ano.
Antes desta manifestação, Simon ameaçou processar o atual vice-governador do Estado, Paulo Feijó (DEM) e o ex-chefe da Casa Civil do governo Yeda Crusius, Cézar Busatto (PPS), por declarações e denúncias envolvendo o PMDB e o Banco do Estado do Rio Grande do Sul. O atual presidente do Banrisul, Fernando Lemos, é afilhado político de Simon.
Em uma conversa gravada por Paulo Feijó, Busatto afirmou que o Banrisul seria utilizado pelo PMDB para financiar campanhas eleitorais no Estado. A revelação do conteúdo da conversa provocou a demissão de Busatto e quase decretou o fim do governo Yeda que chegou a criar um gabinete de transição para iniciar um “novo governo”.
Simon e Eliseu Padilha assinaram uma nota, em nome do PMDB gaúcho, rebatendo a acusação e anunciando uma ação judicial contra Busatto e Feijó. Mais tarde, desistiram da ação diante da afirmação do ex-chefe da Casa Civil de que tinha sido “mal-interpretado”. Mas antes disso, o vice-governador denunciou o desvio de cerca de R$ 18 milhões dos cofres públicos, envolvendo contratos do Banrisul com a Fundação de Apoio da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Faurgs)
Segundo Paulo Feijó, em 2006, o Banrisul teria repassado R$ 24 milhões para a Faurgs. No mesmo período, porém, teria sido contabilizada a entrada de apenas R$ 6 milhões na fundação. Uma empresa terceirizada que prestaria serviços exclusivamente para a fundação teria recebido o restante. Feijó disse que sua denúncia estava baseada em um documento resultante das investigações feitas pelo Ministério Público. Ele entregou esse documento à governadora Yeda Crusius.
O vice-governador reafirmou que tomou conhecimento das irregularidades ainda durante o governo de Germano Rigotto (PMDB), mas que, na época, era apenas líder de uma entidade sindical (a Federasul). Indagado sobre as semelhanças entre as denúncias de irregularidades no Banrisul e as verificadas no Detran, Feijó afirmou: “se não são iguais, são muito parecidas”. Mais uma vez aqui a resposta de Simon foi uma ameaça de processo que acabou não se concretizando.
As novas denúncias envolvendo importantes lideranças do PMDB gaúcho obrigaram Simon a se manifestar mais uma vez. Os brasileiros que assistem aos discursos do senador na TV certamente estranhariam a sua crítica às investigações pelo fato de elas ocorrerem em um ano eleitoral. Em Brasília, o senador nunca fez essa reserva em seus discursos contra corruptos e corruptores. E a denúncia envolvendo peemedebistas gaúchos pode expor um desvio de recursos públicos três vezes superior aquele descoberto pela Operação Rodin, no Detran.
Segundo reportagem da jornalista Adriana Irion, publicada no jornal Zero Hora (09/09/2008), o valor de apenas um dos contratos investigados é de R$ 150 milhões. O Ministério Público Federal está investigando irregularidades em contratos de obras de saneamento, obras rodoviárias e fornecimento de merenda escolar em prefeituras da Região Metropolitana de Porto Alegre.
O senador também foi indagado sobre se pediria o afastamento dos envolvidos de seus cargos (Padilha é secretário geral do PMDB gaúcho, Alceu Moreira é presidente da Assembléia e Marco Alba é secretário de Estado) como costuma fazer em Brasília quando ocorrem denúncias envolvendo integrantes do governo federal. Ao responder a pergunta, a retórica inflamada de Simon deu lugar a uma declaração evasiva: “A gente está na expectativa de saber o que está acontecendo”.
A mesma expectativa é compartilhada pela população do Rio Grande do Sul, que também quer saber o que está acontecendo. O senador disse que tinha conhecimento dos “assuntos de Canoas” há dois anos. No entanto, nada fez neste período. Nenhum pronunciamento, nenhuma denúncia, nenhum pedido de esclarecimentos, nenhum pedido de afastamento. Na geografia moral de Pedro Simon, o Estado que ele representa no Senado parece não existir.
Marco Aurélio Weissheimer é jornalista da Agência Carta Maior (correio eletrônico: gamarra@hotmail.com)
Fonte: Agência Carta Maior
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