por Idelber Avelar
A barragem de ataques sobre Barack Obama vindos da campanha de John McCain tinha se centrado, até agora, na sua “falta de experiência”, nos imaginados ou exagerados vínculos con radicais e em supostas (e algumas reais) osciliações de Obama. Não havia acontecido nada comparável aos golpes baixos que são vistos em eleições nacionais, pelo menos não explicitamente. Até este comercial:
Se McCain conseguir vencer – ou, melhor dito, se Obama conseguir perder – estas eleições, voltaremos a este clip como um ponto chave da virada. O comercial acusa Obama de querer “ensinar sexo” às crianças antes de que elas aprendam a ler. A base da acusação é uma lei na qual Obama votou uma vez, que simplesmente previa informação sobre doenças sexualmente transmissíveis para crianças de primeiro grau. Tudo no comercial é cuidadosamente pensado: a imagem das crianças ao fundo, a voz apocalíptica anunciando a notícia, a tomada da câmera no final, de baixo para cima, sobredimensionando a figura de Obama como uma espécie de predador em potencial. O sub-texto racial e os medos que o comercial quer mobilizar são nítidos, óbvios. Basta conhecer um pouco dos grotões americanos para saber do seu potencial demolidor. A idéia é aterrorizar a família -- “Obama: Wrong for your family!” -- com a imagem do vizinho negro grandão que tem aquela pinta de que toca seus filhos demais.
Uma campanha eleitoral da direita americana realmente faz ACM parecer brincadeira da hora de recreio. Na base democrata, começa a impaciência com a falta de respostas da campanha de Obama, quando já se completam 10 dias de domínio do ciclo de mídia pelos republicanos. Ataques demolidores como esse – sem nenhum argumento, claro, mas com imagens potentes que mexem com tensões racistas bem fundas -- não podem ser respondidos com declarações de indignação e críticas políticas. Não é suficiente. Exigem comerciais explícitos, que chamem o adversário de mentiroso – coisa que a campanha de Obama não tem feito.
A única boa notícia vinda da campanha de Obama é que foi dado o sinal verde para que os grupos 527 liberais, encarregados da pancadaria, voltem a atuar. O comercial visto aqui foi lançado pela própria campanha de McCain, diga-se. Ele aparece ao final “avalizando” o conteúdo da mensagem. Este é o John McCain que ia fazer a campanha "honrada".
Ocorrem-me dois exemplos clássicos de comerciais de pânico racializado vencendo eleições nos EUA:
1. Carolina do Norte, campanha para o Senado de 1990, em que o ultra-direitista Jesse Helms vinha sendo desafiado com sucesso por uma jovem liderança negra, Harvey Gantt, que já o ultrapassara nas pesquisas. Até que este comercial anti-ações afirmativas, mostrando mãos negras "roubando" um emprego que seria de um branco, virou a eleição e Helms venceu:
2. A segunda vítima de uma intervenção midiática de pânico racializado numa eleição -- apreciem a ironia -- foi o próprio McCain, que perdeu a primária republicana da Carolina do Sul para Bush em 2000 (e com ela a indicação do partido) depois que a equipe de Bush promoveu uma push polling -- suposta pesquisa de opinião que na realidade pretende "empurrar" uma hipótese caluniosa para o inconsciente do eleitorado. A pergunta da pesquisa arquitetada por Karl Rove em 2000 foi: você estaria mais ou menos propenso a votar em McCain se soubesse que ele é pai de um filho negro ilegítimo?
Com isso e unas cositas más McCain foi esmigalhado na Carolina do Sul e nunca se refez do baque. Bush ganhou ali a indicação republicana e o mundo tem sobrevivido para contar o conto.
McCain? Contratou o arquiteto das calúnias que o destruíram em 2000.
Fonte: O Biscoito Fino e a Massa
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