quinta-feira, 7 de maio de 2009

Meio ambiente e Sustentabilidade - É preciso ter pressa

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O diálogo entre Mohan Munasinghe, Nobel da Paz, Marina Silva, ex-ministra do Meio Ambiente e André Baniwa, liderança de uma comunidade indigena aponta: juntos, poderemos melhorar o planeta.

“Me gosto muito Brasil, soy brasileiro adotado”. Com sotaque carregado e boa dose de simpatia, o Nobel da Paz 2007, Mohan Munasinghe (clique aqui para conferir a entrevista concedida a Márcia Pinheiro), começou sua apresentação no II Fórum de Comunicação e Sustentabilidade arriscando algumas palavras em português. Em seguida, vieram slides e explanações sobre as questões globais mais urgentes, escassez de recursos, pobreza, destruição ambiental.

Vice-presidente do IPCC – Painel Internacional de Mudanças Climáticas, Mohan alertou que os eventos extremos (como cheias inesperadas contrastadas com excessivas estiagens) são uma das consequências esperadas do aquecimento global.

“Não podemos resolver o problema do petróleo piorando as questões ambientais”, disse ele em seguida ao exemplo do etanol de milho, proposto há alguns anos para resolver a crise do petróleo. Com a seca e a escassez do milho, o problema ambiental foi drasticamente piorado.

Para o acadêmico do Sri Lanka, a bolha financeira é causada pela ambição humana. “Por causa dos exageros dos ricos, os pobres sofrerão as piores consequencias da mudança climática. Falta vontade política para mudar essa situação”.

Mohan acredita que as seis bilhões de pessoas do planeta devem trabalhar coletivamente. “A sociedade sobreviveu à tragédia do tsunami porque houve solidariedade. É essa união que traz os principais ganhos”.

As soluções, de acordo com Mohan, são duas principais. “É preciso que os países ricos reduzam sua emissão de poluentes. E também prover uma rede de segurança para os países que correm sérios riscos de ser inundados”. O relatório aponta que Bangladesh, por exemplo, deve perder 17% de sua área de terra até o final do século.

“Precisamos fazer a transição agora, não há desculpas para deixar isso para depois.” E a saída está nas coisas simples. “Se sairmos dessa sala e apagarmos as luzes, plantarmos árvores e comermos menos carne, já estamos ajudando o processo.”

Para Mohan, “o Brasil tem um povo unido e com muito comprometimento. Cito aqui três brasileiros que considero sensacionais, Chico Mendes, Villas Boas e Celso Furtado. São grandes exemplos”. E fez questão de retomar as palavras em português para resumir o que deve ser feito. “Nós juntos podemos!”

Raízes preservadas

Marina Silva trouxe ao debate sua experiência de militante e de nome mais importante do ministério do Meio Ambiente, onde permaneceu, como lembrou com prontidão, por cinco anos, cinco meses e 13 dias.

“Estamos numa esquina civilizatória. Você pode dobrar para um lado ou para outro, mas o que baseia a decisão?” A resposta veio com outra metáfora. “É como se de repente, aqui neste auditório do Anhembi, aparecesse um leão para devorar algumas pessoas. Todos ficaríamos com medo, ofegantes. Chega um médico, faz um exame de sangue. Se ele souber que existiu o leão, daria o medicamento certo. E se não soubesse? A prescrição poderia ser totalmente errada. Por isso, nosso passado é orientador. E temos de tomar novas atitudes”.

Ao citar um modelo de desenvolvimento que não seja “desconstrutivo de nossas raízes”, Marina citou o caso da Raposa Terra do Sol. “Há 18 mil índios em 1,7 milhão de hectares de terra. Há quem diga que é muita terra para pouco índio. E uma área quase igual para seis arrozeiros. Isso ninguém comenta?”

Sobre a falta de respeito com a população indígena (no Brasil, hoje, são 280 povos), Marina manifestou sua indignação. “Me sinto civilizatoriamente empobrecida por não podermos trocar mais com as civilizações que nos antecederam. Imaginem quão maravilhoso seria se pudéssemos tê-las por completo se o curso histórico tivesse sido respeitado”, disse.

Lembrando que o projeto para preservar a Mata Atlântica tramitou por mais de 15 anos no Congresso, Marina fez uma suposição: “Imaginem que 95% da culpa seja só dos políticos. E a escolha dos maus-políticos?” questionou. “A população não elege só o presidente, o deputado. Ela tem de eleger de onde vem a água que toma, se o grão que consome não provém de desmatamento ilegal, a madeira que compra não tenha sido roubada dos índios”.

O compromisso com as plataformas duradouras também foi comentado por Marina. Não basta, segundo ela, que uma empresa pinte seu logo de verde e diga que faz planejamento ambiental. São necessários estudos, iniciativas e sentimentos potencializados. “Tive a oportunidade de tentar implementar esse comprometimento. Eu vivi uma utopia de imaginar uma política transversal. E eu não desisto dela.”

“Isso aqui ninguém traduz, né?”

Vice-prefeito de São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas, André Fernando Baniwa assumiu o microfone com uma frase de sua tribo, inteligível pelos participantes. E brincou: “isso aqui ninguém traduz, né?”, arrancando palmas. André é a liderança Baniwa de uma comunidade na região do Rio Negro que reúne 23 povos e quatro línguas diferentes. “Os desenhos nas pedras, feitos por nossos antepassados, nos ensinam a amar a terra, respeitar o outro”.

André dividiu com o público uma conversa que teve com um pajé de 80 anos de sua tribo, no final da década de 90. Os temas eram mudanças climáticas e o medo de que tudo fosse acabar na virada do milênio - ou, se não acabasse, as coisas seriam piores. O pajé lhe respondeu: “Eu nasci olhando o sol, a lua, as estrelas. Estou ficando velho e o sol continua ali, é o mesmo. Isso não vai mudar. As pessoas que estão mudando, e que precisam buscar a paz”.

Sua tribo não precisa de mais de 1800 reais por ano para sobreviver. Vivem da pesca, da colheita. André completou a 8ª série do ensino fundamental. “Mas vejam como funciona a nossa cultura: meu avô pediu para ajudá-lo a montar uma cesta, e eu não sabia. E ele disse: ‘você não se formou. Estão enganando vocês’. Para nós, é preciso saber ajudar a comunidade”, disse e completou: “Tenho muito orgulho de ser brasileiro, mas, antes de tudo, tenho mais orgulho ainda de ser índio”.

Modos de vida não adequados

Consultor do primeiro relatório nacional sobre biodiversidade, o jornalista Washington Novaes focou seu discurso nas ameaças à espécie humana. “Não há nenhuma dúvida de que estamos vivendo uma crise de padrão civilizatório. Nossos modos de viver não são adequados. Já danificamos os recursos naturais em mais de 25% do que a biosfera é capaz de repor”.

Novaes atesta que o Brasil tem de tomar consciência que já é o quarto maior emissor do planeta, sendo que 75% dessas emissões são de desmatamentos. “Não podemos esquecer também que somos privilegiados, contamos com 12 ou 13% do fluxo superficial de água do planeta, temos de 15 a 20% da biodiversidade planetária. É preciso ter pressa para preservar, correr para não ser atropelado”.

Uma frase do ex-presidente francês Jacques Chirac foi relembrada pelo jornalista: “As novas gerações podem nos cobrar: vocês sabiam de tudo e não fizeram nada”.

Numa breve participação por conta do tempo estourado do debate, Olinta Cardoso, ex-diretora da Vale enfatizou a perspectiva relacional e a busca de atitudes coerentes.

Em ritmo de celebração

A cerimônia de encerramento teve início com a premiação de 13 fotógrafos que tiveram suas imagens espalhadas pelo hall do evento e continuará, segundo a organização do evento, com uma homenagem a Terra que prestigiou a diversidade humana. Houve apresentações da Cia Circodança, índios Mehinakos (provenientes do Xingu), Marina de La Riva, Jair de Oliveira e Lino Krizz. O show foi aberto com uma mensagem especial do cantor Seu Jorge.

Fonte: Carta Capital

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