quinta-feira, 7 de maio de 2009

Colonialismo no Século XXI

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por Rui Daher
De São Paulo


Direito de propriedade - por Gabriel Daher

Se nos séculos XV e XVI a burguesia mercantilista de Portugal, Espanha, Inglaterra, França e Holanda escolheu o apetitoso continente americano para acampar, aos capitalistas industriais e financeiros europeus da segunda metade do século XIX, restaram os ossos da Ásia, Oceania e África, para roer.

Colonialistas uns, neocolonialistas outros, buscavam matérias-primas, alimentos, metais preciosos, energia e novos mercados para turbinarem suas economias.

No plano da superestrutura, a dominação econômica do primeiro ciclo arrastava consigo ensinamentos cristãos supostamente civilizadores e, no segundo ciclo, ciência e tecnologia, que supostamente deveriam ser os propulsores do desenvolvimento em bases justas.

Resultados? Tantos. Para o bem e o mal. Entre outras, a obra de Eric Hobsbawn bem os define.

Uma coisa, porém, é certa: em cinco séculos, o planeta se desenvolveu muito, embora sobre bases distraídas, que patrocinaram a erosão de vários sistemas ambientais que harmonizam a vida.

Nas últimas décadas, tem-se procurado correr atrás do prejuízo. Com pouca efetividade, quando através de organizações que proliferam cúpulas, simpósios, congressos e medições alarmantes. Com rapidez e furioso pragmatismo, quando países e investidores estrangeiros tratam de ocupar espaços em territórios alheios.

A coluna já mencionou que, no produtivo Brasil, o interesse estrangeiro tem feito subirem os preços das terras agricultáveis. Entende-se: clima propício, recursos hídricos em abundância, leis de ocupação pouco claras, fácil lubrificação de instâncias aprobatórias. Para o futuro anunciado, uma bênção "em que se plantando tudo dá".

Tais fatos apontam para a necessidade de um código de ética que conduza a compra de terras mundo afora.

Jacques Diouf, uma espécie de secretário da agricultura da ONU, alerta para a existência de sinais de neocolonialismo a partir de países como a Alemanha, Suécia, Coréia do Sul, Arábia Saudita, especialmente em terras africanas, a Etiópia incluída.

São países de economias ricas, porém pobres em terras agricultáveis e deficitários em seus estoques alimentares. Solução: investir no controle de terras produtivas no exterior e exportar para seus países os resultados dessas colheitas. Mesmo China e Índia, de largas extensões territoriais, mas também muito populosos, têm aderido ao loteamento.

O alerta de Diouf baseia-se em estudos do Instituto Internacional de Pesquisa sobre Política Alimentar (IFPRI, na sigla em inglês), que detectou impactos negativos em populações locais no que diz respeito às posses de suas terras e à subsistência que elas lhes permitem.

Embora negociações com áreas agrícolas envolvam um alto grau de sigilo, estima-se que, atualmente, entre 15 e 20 milhões de hectares já tenham sido tomados por investimentos estrangeiros.

Não que eles não sejam bem-vindos. Pelo contrário. O problema está na forma como se instalam.

Os ministros presentes em recente reunião do G-8 para assuntos agrícolas, não sei se de forma disfarçada, foram unânimes em aceitar um código de ética que passaria a nortear as aquisições de terras no exterior.

Nele, além de transparência nas negociações, pede-se "respeito pelos direitos fundiários existentes, inclusive os consuetudinários; compartilhamento de benefícios; arrendamentos em vez de compras de terras agrícolas e sustentabilidade ambiental".

O IFPRI vai mais longe, e propõe o impedimento de exportações de investidores agrícolas no exterior para seus países "durante uma crise alimentar no país anfitrião".

Eis um bom assunto para discussão entre as entidades que representam o setor agropecuário no Brasil, embora nem sempre suas ideias iluminem algum caminho.

*Rui Daher é administrador de empresas, consultor da Biocampo Desenvolvimento Agrícola.

Fonte: Terra Magazine

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