O inferno carcerário e as penas alternativas
O episódio da menina na cela de presos homens e a revelação de que não se trata de um caso isolado é apenas um episódio a mais no inferno carcerário brasileiro. Sabemos que nosso sistema penitenciário não é feito para recuperar – como deveria ser -, mas para isolar, punir e, se possível, exterminar – se não fisicamente, pelo menos a humanidade dos que ali são recluídos.
Sabemos que quem chega até ali, por uma ou outra razão, nao sai mais, salvo que fuja. As tramas cruéis da instituição fechada se encarregam de devorar seus membros. As cenas que os que estamos aqui fora conhecemos dali são apenas a confirmação de que nada queremos, nem esperamos daquele mundo. Queremos que fiquem ali para sempre, recluídos, fechados, isolados. São, para nós, bárbaros.
Reforçados por esse clima repressivo, pede-se cada vez mais penas, cada vez mais reclusões. Uma sociedade que demanda isso, tem que estar disposta a pagar mais impostos para construir prisões, delegacias, para ter mais policiais, mais juízes, mais camburões, mais repressão, mais caveirão.
Reproduz-se assim o inferno que estamos vivendo, dentro e fora das prisões. Enquanto isso, medidas tão simples como as que prevêem penas alternativas, praticamente não são utilizadas. Trata-se de processos de socialização dos condenados como réus primarios a infrações simples, que em lugar de conviver de maneira promíscua nas prisões, com os riscos de contaminação de todo tipo, tem a possibilidade de recuperar-se prestando serviços à comunidade.
As experiências existentes são muito positivas e alentadoras. Quando trabalhei na prefeitura de Luiza Erundina, em São Paulo, as penas alternativas foram utilizadas amplamente, com condenados prestando serviços de marcenaria, de pintura e de outras atividades similares em escolas públicas. Os resultados não poderiam ser melhores. Combina-se a tradução da pena em serviços que retribuam à comunidade pelos danos causados e tem uma dimensão de ressocialização.
Ao invés disso, essa ânsia de penalização que é multiplicada conscientemente pela imprensa – incluindo a rejeição da lei que limitava a compra de armamentos, as iniciativas para diminuir a idade de imputabilidade penal, para instituir a pena de morte, para aumentar as penas -, quer avançar na direção oposta, com a criminalização da pobrezsa, das lutas sociais, da infância e da juventude pobre, que perambula pelas ruas, praças e esquinas de sociedades que os discriminam, os rejeitam, os criminalizam.
Diminuir a população carcerária com a prática sistemática de penas alternativas contribui, ao contrário, para diminuir a superlotação das prisões, a contaminação de condenados primários com outros, para a ressocialização e recuperação dos que cometeram delitos primários. Não resolve todos os outros problemas, mas ajuda a retomar a função de reeducação das penas, a diminuir o caráter multiplicador da criminalidade dentro das prisões, sua promiscuidade física e social.
Postado por Emir Sader às 15:37
moacyr pinto diz:
10/12/2007
Caro Prof. Emir,
Desculpe-me mas vou "aproveitar" o assunto para tratar de outro correlato, que é a "redução da maioridade penal", em razão de um absurdo que ouvi pela Rádio CBN na manhã deste 10 de dezembro (passei esta mesma msg por e-mail para um grupo de amigos, pedindo para reproduzi-la). Aproveito ainda para lembrar que há em SP uma lei estadual, de autoria do deputado Hamilton Pereira, originalmente formulado por presidiários de Sorocaba, que, a despeito dos cortes recebido no Executivo, é muito interessante e vai de encontro ao espírito da experiência que o senhor descreveu que vivenciou no "Governo Erundina", propondo a produção de materiais de construção e de casas populares pelos detentos. O Projeto concebido pelos presidiários tinha o sugestivo nome de "Projeto Horizonte" e como tal foi apresentado pelo deputado, acompanhado de uma "Justificativa" que continha um texto de mais de 20 laudas escrito por um ex-presidiário.
Meu texto sobre a CBN:
Ao (destinatários do e-mail que enviei):
Veja que belezas de opiniões colhi de "gente fina" da CBN, hoje, segunda feira, 10/12/2007, no "Jornal da CBN", dirigido, pelo "humanista", sempre irônico, mui estimado e festejado no ar por todos que o cercam e sempre falante Heródoto Barbeiro:
1. Por volta das 9 horas, o âncora do programa, Heródoto, anuncia um "quadro" - cujo título lembra a questão da liberdade de imprensa e de expressão - onde diariamente ele dialoga irônica e animadamente com dois "próceres" da nossa cultura, um tal de Artur Xexéu (que juro que não conheço) e o grande e famoso escritor Carlos Heitor Cony - autor do clássico "Pessach - Travessia" e de, entre outros, o "Informação ao Crucificado", um livro autobiográfico que me impresionou muito, porque ele conta a sua "vida, paixão e morte" dos tempos de seminarista.
2. Abrindo o diálogo, Heródoto desta vez apenas perguntou para o Xexéu qual era o assunto do dia e este lhe informou rapidamente sobre a votação (não sei em qual etapa, no Congresso) do Projeto de um deputado - muito credenciado para tal, na sua opinião - propondo a "Redução da Maioridade Penal", passando, em seguida, a argumentar favoravelmente à mesma, tendo, em determinado momento, dito que hoje isso é necessário e também possível, já que, mesmo que a família não o faça, a sociedade oferece condições para que um adolescente de 16 anos - que já pode votar e dirigir - possa discernir entre o certo e o errado e pagar pelos seus atos (se as palavras não são essas, o conceito - juro - é exatamente este).
3. Sem nenhum comentário, Heródoto passou a palavra para Cony falar sobre o mesmo assunto e este, em total acordo com Xexéu, acrescentou aos argumentos deste que se D. Pedro II pode ter a sua "maioridade" proclamada para, com ela, governar o Brasil, por que nós não podemos mudar a lei atual, para que um adolescente de 16 anos (ele fez até umas digressões no sentido de que a redução poderia ser maior ainda e que não iria resolver, apenas ajudar, a solucionar a problemática da violência praticada pela juventude) passe a pagar pelos seus crimes, da mesma forma que alguém que tenha mais de 18?
4. E o "nosso" Heródoto agradeceu, se despediu dos 2 e passou para o "quadro" seguinte sem dizer um A sobre o que acabara de ouvir!
Preciso comentar alguam coisa? Emitir minha opinião? Penso que não!
Peço-lhe apenas, bem como às pessoas para as quais estou enviando cópia deste e-mail, que repassem "ad infinitum" - é assim que se escreve? - esta mensagem; porque a minha vontade é mesmo "quebrar as pernas" destes hipócritas, que sempre andam passando por humanistas, progressistas e civilizados por este país afora!
moacyr pinto