domingo, 12 de outubro de 2008

O DEM, que já foi PFL, que já foi Arena - Um declínio tardio

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Nas últimas décadas, o DEM - com as várias denominações que teve ao longo do tempo - esteve no centro do poder. A eleição deste ano indica que seu declínio, indicado pela votação decrescente nos últimos pleitos, se acentua.

Por José Carlos Ruy


O destino do Democratas (DEM), o segundo principal partido da direita no Brasil, é uma indicação das dificuldades e contradições dos conservadores no cenário político brasileiro atual. O DEM concorreu em onze capitais; em duas delas, estava à frente das prefeituras. Justamente as duas maiores e mais importantes: São Paulo e Rio de Janeiro.

Seu desempenho, nestas onze capitais, foi paradoxal. Venceu na principal, São Paulo, superando - surpreendentemente - a votação da candidata Marta Suplicy (PT/PCdoB). Mas perdeu em todas as outras. E, na Bahia, um dos mais sólidos bastiões do DEM (ex-PFL), durante o cacicato do finado senador Antonio Carlos Magalhães, sofreu sua pior derrota, praticamente deixando de existir. E, com ela ruiu uma tradição política de direita no estado, o chamado carlismo.

São resultados que merecem alguns comentários. São Paulo talvez tenha sido a jóia mais cobiçada nesta eleição, dando motivo inclusive a uma luta de morte no campo conservador, onde a concorrência entre o tucano Geraldo Alckmin e o demo Gilberto Kassab, apoiado abertamente pelo governador tucano José Serra abriu feridas difíceis de serem costuradas e que rachou de alto a baixo o PSDB. O glacê deste bolo conturbado é a eleição presidencial de 2010. Serra fez de tudo para tirar de seu caminho um adversário em seu próprio partido, o ex-governador Geraldo Alckmin e evitar assim roteiro semelhante ao de 2006 quando Alckmin venceu a disputa interna no partido e foi o candidato tucano à presidência da República. Mas Serra fez isso à custa de trincar em profundidade seu partido, ajudando a colocar Kassab no primeiro lugar neste primeiro turno da eleição municipal. Kassab, por enquanto, teve mais votos, mas o endereço do vencedor é o Palácio dos Bandeirantes, sede do governo paulista. O DEM que venceu nestas condições não é puro sangue, embora junte votos para o acervo de seu declinante partido.

O DEM, que já foi PFL, originário do tronco comum formado pela Arena, o partido que sustentou a ditadura militar de 1964, até que teve uma sobrevida longa. Na já longínqua crise final da ditadura militar, a Arena transformou-se em PDS (Partido Democrático Social) e, às vésperas da última eleição indireta para a presidência da República, em 1984, rachou com a saída do grupo de caciques que formou o PFL (Partido da Frente Liberal). O que restou do PDS sobreviveu por algum tempo mas, em pouco tempo, foi definhando, perdendo importância política e influência eleitoral. Hoje, pode ser considerado um partido residual, transformado no PP de Paulo Maluf, cuja figura representa aquela decadência política.

O PFL conseguiu uma vida mais longa. Recheado de caciques como Marco Maciel (PE), Antonio Carlos Magalhães (BA), Jorge Bornhausen (SC), entre os mais notáveis, conseguiu novo alento ao se aliar, no começo da década de 1990, com o PSDB de Fernando Henrique Cardoso e ajudar a elegê-lo presidente da República, em 1994. Foi quando alcançou seu auge eleitoral. Desde então sua votação vem declinando, situação acentuada sobretudo depois da eleição de Luís Inácio Lula da Silva para a presidência da República em 2002 e sua reeleição em 2006.

Seu desempenho nas disputas nas capitais, neste ano, é um retrato desse declínio. Tirando São Paulo, perdeu em todas. Seus melhores desempenhos foram em Recife (PE), Aracajú (SE) e Fortaleza (CE), onde seus candidatos ficaram em segundo lugar. Em Salvador (BA), Palmas (TO) e Florianópolis (SC), ficou em terceiro lugar; em Belém (PA) e São Luis (MA), amargou um quarto lugar; em Belo Horizonte (MG) e Porto Alegre (RS), ficou em quinto; e no Rio de Janeiro, cidade dirigida hoje pelo demo César Maia, pai do atual presidente do DEM, Rodrigo Maia, esperança e rejuvenecimento deste partido envelhecido, ficou num ignóbil sexto lugar.

A derrocada baiana do DEM, estado que Antonio Carlos Magalhães dirigiu como um imperador absolutista, pode ser uma prévia do que se poderá ver quando os resultados das eleições nos 5.564 municípios brasileiros forem conhecidos.

Lá, a previsão é de que aliados do governador petista Jaques Wagner elegerão prefeitos em 350 dos 417 municípios baianos, um virada política não muito comum: há exatos dois anos, os carlistas controlavam 370 destes municípios. Cálculos do Palácio de Ondina, sede do governo baiano, sugerem que o PMDB do ministro Geddel Vieira Lima poderá eleger entre 80 e 90 prefeitos; o PT, entre 60 a 65; PP, PR, PSB, PCdoB, PTB elegeriam, juntos, entre 190 e 200. O DEM concorreu com 116 candidatos, e talvez eleja metade deles (60 prefeitos). A derrota mais significativa já está consumada. Ela ocorreu em Salvador, onde o herdeiro político de ACM, o deputado federal Antonio Carlos Magalhães Neto, ficou em terceiro lugar, com pouco mais de 26% dos votos - vão disputar o segundo turno o peemedebista João Henrique, que disputa a reeleição, e o petista Walter Pinheiro (ver matérias neste Portal).

O DEM, que já foi PFL, que já foi Arena, esteve no centro do poder durante décadas. Hoje, desenha-se um protagonismo menor para ele, mesmo depois da tentativa de renovação que colocou no comando do partido os filhos dos oligarcas que o dirigiram até aqui. Resta ver se vai dar certo - o certo mesmo é que sua derrocada ilustra as mudanças democráticas que o Brasil vem vivendo, e que redefinem o papel das velhas oligarquias na política.

Fonte: Vermelho

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