segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Governadora do RS acusada de integrar quadrilha criminosa

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Um terremoto político atingiu o Rio Grande do Sul com a ação do Ministério Público Federal contra a governadora tucana Yeda Crusius, o marido desta, Carlos Crusius, quatro ex-presidentes da Assembléia Legislativa, o atual presidente do Tribunal de Contas do Estado, o vice-presidente do Banrisul e uma assessora direta da governadora. Segundo o MPF, acusados integram "verdadeira quadrilha criminosa, que lesou os cofres públicos entre os anos de 2003 e 2007". Gravações revelam prática de caixa-dois e reforçam suspeitas sobre compra da casa de Yeda Crusius.

O Rio Grande do Sul vive o maior escândalo político da sua história. A governadora Yeda Crusius (PSDB) foi acusada pelo Ministério Público Federal de integrar uma quadrilha criminosa instalada no aparelho de Estado. Além da governadora, a ação civil pública de improbidade administrativa denunciou outras oito pessoas: Carlos Crusius (marido de Yeda Crusius), José Otávio Germano (deputado federal do PP que foi secretário estadual de Segurança no governo Germano Rigotto; segundo a Operação Rodin, que apurou o desvio de R$ 44 milhões no Detran gaúcho, a fraude teria iniciado em 2003 durante o governo Rigotto, do PMDB); Luiz Fernando Zachia (deputado estadual do PMDB); Frederico Antunes (deputado estadual do PP), João Luiz Vargas (presidente do Tribunal de Contas do Estado); Rubens Bordini (vice-presidente do Banrisul e ex-tesoureiro da campanha de Yeda) e Walna Villaris Meneses (assessora de Yeda Crusius).

Pesam sobre eles acusações de enriquecimento ilícito, dano ao erário e infração de princípios administrativos, crimes relacionados à fraude que desviou cerca de R$ 44 milhões do Detran gaúcho. Segundo o MPF, “os demandados agiram de forma imoral, pessoal, desleal, desonesta e ímproba, valendo-se da condição de ou em conjunto com agentes políticos e servidores públicos para obterem vantagens pessoais, utilizando-se dos respectivos cargos, de bens públicos e verbas públicas afetadas ao desenvolvimento de serviços públicos em área sujeita às suas atribuições funcionais e políticas.”

Esse grupo, prossegue a denúncia do MPF, constituiu “verdadeira quadrilha criminosa, que lesou os cofres públicos entre os anos de 2003, por volta do mês de junho, até o mês de novembro de ano de 2007 (deflagração da fase ostensiva da investigação).” A ação define assim a atuação da quadrilha:

“A societas delinquentium restou formada pela associação perene e estável de diversas pessoas, integrantes de diferentes núcleos estatais e diversas esferas privadas, no objetivo consciente e deliberado de perpetrar, continuadamente, sob diversas formas e com a máxima lucratividade possível, as condutas ímprobas apuradas em face da Administração Pública e do Erário. O agir do grupo enquadra-se no conceito de organização criminosa da Lei n° 9.034/1995, estando presente a hierarquia da associação delitiva, o intuito lucrativo, gestão empresarial das negociatas criminosas, destruição de probas, omissão de rendimentos, corrupção do tecido social, inserção estatal ilegítima e blindagem patrimonial”.

“A organização criminosa era fortemente estruturada e sua atuação primordial voltava-se à obtenção e celebração de contratos públicos, mediante dispensa irregular de licitação em prol de fundações de apoio vinculadas à Universidade Federal de Santa Maria. Após a contratação, a atividade do grupo redirecionava-se à subcontratação de parcela substancial dos recursos a empresas privadas, que pouca ou nenhuma atividade realizavam, mas que absorviam esses recursos para a manutenção do esquema criminoso, pagando altos valores a título de propina para os servidores públicos estaduais e federais responsáveis pela efetivação e operacionalização da contratação; no caso, respectivamente, os então presidentes e diretores do Departamento Estadual Trânsito (Detran/RS) e integrantes da Universidade Federal de Santa Maria, incluído aí o seu ex-reitor Paulo Jorge Sarkis”.

“A quadrilha estabeleceu verdadeiro bureau do crime, utilizando-se, de forma fraudulenta, da possibilidade de dispensa de licitação para contratação de fundações de apoio, bem como de prestígios políticos de seus integrantes para o estabelecimento e manutenção dos intensos contatos com gestores públicos – para quem ‘vendiam’ a fraude e dos quais dependiam decisivamente para a consecução da sangria do Erário”.

Gravações falam de caixa-dois e compra de mansão
Todos os acusados negam as acusações. A governadora Yeda Crusius acusou os procuradores do Ministério Público Federal de estarem fazendo “jogo político”. A Associação Nacional dos Procuradores da República divulgou nota oficial criticando as declarações da governadora e defendendo a seriedade do trabalho do MPF no Rio Grande do Sul. A situação do governo tucano ficou ainda mais grave neste final de semana, com a divulgação pela revista Época e por jornais de Porto Alegre, do áudio de gravações feitas por Lair Ferst (um dos acusados de integrar a quadrilha que fraudou o Detran). As gravações mostram conversas de Ferst com Marcelo Cavalcante (ex-chefe do Escritório de Representação do RS em Brasília, encontrado morto no Lago Paranoá, em fevereiro deste ano) sobre temas como o caixa dois na campanha de Yeda e a compra de uma mansão pela governadora logo após o final do segundo turno, em 2006.

Os áudios foram divulgados pelo advogado de Lair Ferst, Lúcio de Constantino. Segundo ele, há outras gravações que poderão ser divulgadas no futuro se isso favorecer a defesa de seu cliente. Nas conversas, Cavalcante diz que Yeda Crusius recebeu uma carta entregue por Lair a ele, denunciando irregularidades no Detran. Parte dessa carta chegou a ser divulgada durante a CPI do Detran, em 2008. A governadora sempre negou ter tido acesso a este documento. As gravações também comprometem o marido de Yeda, Carlos Crusius. Em uma das conversas, Ferst e Cavalcante comentam o comportamento de Crusius em relação a recursos doados para a campanha de 2006. Em um trecho, Cavalcante diz:

“Algumas vezes que entrou dinheiro aí. Aí eu vou te repetir; lá no início, quando a gente conversava e tudo mais, eu até hoje não me esqueço, mas sempre achei muito esquisito que o Crusius vinha lá na sede do partido, lá e tal, e pegava a sacolinha, e deixava em algum lugar e ia embora. Não sei para onde. Acho que para casa, né?”

Yeda tem maioria na Assembléia Legislativa e vinha usando essa condição para impedir a instalação de uma CPI. A partir da denúncia do MPF, essa blindagem ruiu e a comissão deve ser instalada nos próximos dias. Além das denúncias envolvendo a participação de integrantes do governo na fraude do Detran, a CPI também pretende investigar as conexões desse esquema com um outro, de fraude em licitações, denunciado pela Operação Solidária. Segundo estimativas preliminares, o prejuízo para o Estado neste caso pode chegar a R$ 300 milhões.

Fonte: Carta Maior

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