por Luiz Carlos Azenha
James Carville foi consultor de campanha de Bill Clinton. A ele é atribuído o bordão "It's the Economy, Stupid". É a economia, estúpido. Um bordão que foi escrito no quartel-general de Clinton quando o democrata disputou as eleições contra George Bush, em 1992.
Bush vinha de "vencer" a primeira guerra do Iraque. Expulsou as forças de Saddam Hussein do Kuwait. Porém, a economia americana andava mal das pernas. Clinton focou na economia. E derrotou George H. Bush. Essa história é contada no filme War Room. Carville, craque na autopromoção, ficou famoso. Casou-se com uma consultora republicana. Ganhou rios de dinheiro em todo o mundo prestando consultoria a candidatos. Inclusive a FHC, no Brasil.
Como integrante da empresa Greenberg, Carville and Shrum, assessorou o candidato Gonzalo Sánchez de Lozada nas eleições presidenciais da Bolívia, em 2002. Goni fala espanhol com sotaque gringo. Foi presidente da Bolívia de 1993 a 1997. Um campeão do neoliberalismo e da privatização.
Em 2002 o candidato Manfred Reyes, ex-prefeito de Cochabamba, chegou a ter 41% das preferencias do eleitorado. Gonzalo de Lozada, o Goni, tentava se eleger novamente assessorado pela firma de Carville. O documentário Our Brand is Crisis, Nossa Marca é Crise, mostra os bastidores da campanha. Mostra como os marqueteiros americanos agiram para bombar Goni e detonar Manfred. O terceiro candidato era Evo Morales, o cocaleiro.
Os assessores americanos estavam sempre de olho na reação dos "focus group", os grupos de eleitores que avaliavam a campanha. Vale a pena ver o documentário. Os gringos se instalaram em La Paz e, escondidos atrás de vidros com películas de isolamento, assistiam os debates de bolivianos comuns. Fizeram isso antes e depois da eleição de Goni.
A certa altura, ainda na campanha, com Manfred bem adiante, os marqueteiros gringos usaram a mídia para plantar dúvidas sobre Manfred. Eles não estavam interessados na verdade factual. Queriam plantar dúvidas na cabeça do eleitor. Foram buscar no armário uma foto de Manfred vestido de militar, espalharam boatos sobre a mansão do candidato e sobre supostas contribuições que ele teria recebido do reverendo Moon. A mídia colaborou, produzindo notícias e manchetes que ajudaram Goni.
Na reta final, o embaixador americano na Bolívia deu uma contribuição valiosa ao candidato Evo Morales. "Como representante dos Estados Unidos, quero lembrar o eleitorado boliviano que se eles querem eleger aqueles que querem tornar a Bolívia, de novo, um grande exportador de cocaína, vão colocar em risco o futuro da ajuda financeira dos Estados Unidos à Bolívia", ele disse publicamente. Tenho para mim que o embaixador não disse isso "por acaso".
Morales, em 2002, nunca se propôs a tornar a Bolívia grande exportador de cocaína. Qual teria sido o objetivo do embaixador ao fazer uma declaração tão absurda? Tirar votos de Manfred é uma possibilidade.
E assim foi: Gonzalo Sánchez de Lozada se elegeu com 22,46% dos votos, contra 20,94% de Evo e 20,91% de Manfred.
Goni, lembrem-se, tinha como um dos principais objetivos exportar gás da Bolívia através de um gasoduto até a costa do Chile, de onde o gás seguiria de navio para os Estados Unidos, especialmente para ser queimado pela indústria da Califórnia. A oposição a esse esquema era grande por dois motivos: o Chile é inimigo mortal da Bolívia, por ter tomado a saída boliviana para o mar; e muitos bolivianos àquela altura já pregavam a nacionalização do gás e do petróleo bolivianos.
Goni assumiu mas não durou muito. Foi derrubado na "guerra do gás". Fugiu para os Estados Unidos, onde permanece no exílio, em Washington. O vice de Goni assumiu e também não durou muito. Em 2005, Evo Morales venceu as eleições presidenciais e o resto a gente já sabe.
O documentário ainda é um exemplo de como se fazem as campanhas midiáticas de demonização. A certa altura um dos marqueteiros de Goni diz, a respeito de Manfred, que a campanha foi bem sucedida ao plantar no eleitorado a idéia de que "há algo de errado com ele", algo "spooky", assustador. Fatos? Nos dias de hoje são tantos, chegando através de tantos meios, que uma boa parte das pessoas forma opinião a partir do "ouviu dizer"
Fonte: Vi o Mundo
Para ver todo o documentário, em inglês e espanhol, aqui
Se alguem se propuser a colocar legendas, será show.
Para ver a sétima parte, que é uma das mais reveladoras, clique aqui
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