domingo, 23 de agosto de 2009

Vai dar errado

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Vai dar errado


por Heberth Xavier

A tática é antiga, antiga. Inventa-se uma denúncia, ainda que daquelas que, na prática, não muda nada. Não importa que ela seja absolutamente mentirosa. Importa é ter uma rede na imprensa que faça com que essa "denúncia" prolifere. Depois, buscam-se declarações, é claro que absolutamente suspeitas (lideranças opositoras ao "denunciado", por exemplo). Se possível, em seguida ameça-se com comissões de investigação, e por aí vai.

Não há exemplo melhor disso do que o caso Lina. Segue todos os pressupostos acima:

1) não é, como até concordam vários da oposição, não é um assunto dos mais importantes, convenhamos. Está longe de ser programático e, como sabem dez entre dez pessoas que já fizeram política ou já se prestaram a análises mais neutras, trata-se de coisa comum no meio. Ou uma ministra da Casa Civil buscar informações e/ou pedir para acelerar, determinada investigação é alguma novidade? Não é no Brasil, nos EUA, na Europa ou em qualquer país democrático do mundo.

2) a própria "acusadora" já recuou, se é que denunciou de fato o "arquivamento" das investigações a pedido da Dilma. Foi claríssima no depoimento, ao dizer que em nenhum momento afirmou ter sido coagida a arquivar as apurações.

3) pois então a Dilma é acusada de montar dossiê contra FHC. Não foi provado NADA, NADA mesmo, a esse respeito. Mas vamos deixar de hipocrisia: o Serra é famoso por montar dossiês, o ACM também, Mercadante tem um caso assim... Há divisões no Partido Democrata e Partido Republicado americanos só para isso - lá, lobista é profissão, até regulamentada. Vamos fazer política de forma adulta, sem hipocrisia canalha?

4) A tal Lina, ao contrário do que muitos achavam (eu, inclusive), mostra a cada dia não ser tão "distanciada" assim dos fatos. Foi secretária de estado do governo Agripino Maia no Rio Grande do Norte. É casada com um ex-ministro do FHC e um empresário da publicidade cuja maioria dos contratos é com governos do PSDB e do DEM. Esse marido da Lina, estão aí as fotos e imagens comprovando, participou ativamente de seu depoimento no Congresso, indo várias vezes à mesa dela para dar palpites. Meu deus do céu, é até inacreditável imaginar que a oposição afiançou esse tipo de denúncia. É meio burrice, mesmo, e só se explica porque a oposição sabe ter a grande mídia para acobertar esses fatos... O problema é que até isso tem limites.

5) A revista Época, o Estadão e a Folha agora divulgam que ele afirmou enfim a data do tal "encontro" com a Dilma: 19 de dezembro. Os jornais sabem desde a semana passada que Lina informou os senadores da oposição sobre essa data. E também sabem que, nesse dia, Lina estava em Natal, e Dilma no Rio, pela manhã, e em Porto Alegre, à tarde. Agora, depois de duas semanas acusando Dilma de mentirosa, não dão UMA LINHA a respeito. Era uma denúncia desde o início estranha, já que invertia o ônus da prova, tão caro aos jornais e às revistas quando os acusados são aqueles que eles defendem. Agora, com as evidências mais do que evidenciadas (a redundância é proposital e importante!), percebe-se o absurdo dessa história toda.

Mas como dizia, é uma tática antiga, essa. Mas que já demonstrou ser equivocada há algum tempo. Lula foi vítima disso em 2006 e ganhou com pé nas costas (64% a 36%). Obama foi "acusado" de ser muçulmano, amigo de terroristas, financiado por gente "do mal" e, como sabemos, venceu até com certa facilidade (levando-se em conta as sempre apertadas eleições americanas disputadas pelos dois partidos).

Durante dias, martela-se a idéia de que um senador petista ameaçou renunciar à liderança do partido, conversou com Lula e voltou atrás. Ora, alguém acha que isso vai mesmo determinar uma derrota eleitoral? Isso pega, honestamente, um ou outro da classe média com pitis moralistas e seguidora do que a mídia quer. No fim das contas, Mercadante acaba posando de amigo e partidário do Lula, um político tão popular quanto nunca nesse país. Uma conclusão possível é se perguntar o que será do PT quando Lula não estiver no Planalto. Isso sim, é preocupante - para o PT - e é factível. Eleitoralmente, PARA 2010, porém, nada disso terá resultado.

Já participei da atividade político/partidária e hoje a acompanho com interesse. Não tenho sequer idade mais para purismos, da mesma forma que não aceito canalhices. Acho legítimo, de certo modo, além de perfeitamente compreensível, a tática da oposição. Realmente, o Serra sabe que, se a disputa for para o lado programático, a comparação entre os governos Lula e FHC será inevitável. Ainda não chegou o momento em que o governo FHC será apenas uma memória distante. Serra e PSDB/DEM sabem, portanto, que, se a batalha for nesse terreno, a derrota é certíssima. Então, partem para o outro campo. A UDN se cansou de fazer isso com Jango, que não tinha a popularidade do Lula e muito menos sua esperteza política - Lula cairia numa armadilha das grandes se negligenciasse a governabilidade, não cumpria sequer o primeiro mandato.

Bem, isso é do jogo político. É assim no Brasil e é assim nos países ricos, também. O lamentável apenas é a postura da mídia. Mês passado, os novos números do IVC testemunharam novo desabamento na circulação dos jornais. O processo dá mostras de ser inevitável. A internet precipita a queda. Mas é impressionante como os jornais também parecem fazer força para isso.

Isso vai dar errado. As fontes de informação já estão suficientemente dispersas em vários meios, pessoas e grupos de interesse. Em 1989, era fácil eleger o Collor, ainda que não concorde nem goste da tese de que o ex-presidente do PRN ganhou EXCLUSIVAMENTE por causa da mídia. Mas, de qualquer modo, hoje, não é assim tão fácil. Pode-se apelar para tudo, até chamar de "analista experiente e reconhecido" um cara desprestigiado como o Montenegro, do Ibope, e ainda usá-lo para previsões CATEGÓRICAS HÁ UM ANO, HÁ UM ANO, do sufrágio.

O jogo hoje é mais complicado. Não adianta O Globo manchetar em letras garrafais, na primeira página: "Marina diz que governo Lula é insensível a causas sociais". No dia seguinte, o mesmo jornal tem que noticiar (sem porém, citar a crítica que a senadora acreana fez ao próprio jornal O Globo): “Eu já disse inúmeras vezes, inúmeras vezes, desta tribuna, e em todas as manifestações que fiz, que foi (a do Governo Lula) a melhor política social que tivemos … Que precisamos fazer ajustes em relação à porta de saída, mas que só é possível porta de saída hoje porque teve uma porta de entrada, disse Marina. Saí do PT, mas compreendo todos os avanços que tivemos.”

Ano que vem, a economia certamente estará girando com uma expansão em torno de 5%. Já está crescendo. As pessoas sabem que há uma crise braba em todo o mundo e percebem que, agora, o Brasil está respondendo a ela de uma forma diferente. Tem as casas do programa habitacional que estarão sendo entregues. É demagogia? Uai, que tenhamos então muitos e muitos demagogos capazes de, ao invés de dar dinheiro para banqueiros e grandes multinacionais, prefiram distribuir um pouco a riqueza do país.

Ninguém elege um poste, é claro. E a Dilma é um poste? Aécio e Pimentel elegeram o Márcio Lacerda e o governador mineiro aposta no Anastasia. Ninguém consegue convencer alguém sério e informado que Lacerda e Anastasia sejam menos "postes" que a Dilma. Alguém se lembrava do Fleury antes dele ser escolhido pelo Quércia para sucedê-lo? Ou do Pitta, escolhido pelo Maluf? Mesmo Alckmin, que era vice do Covas, alguém sabia de sua existência antes de ser o candidato do PSDB em Sampa?

Enfim, há muita coisa para acontecer até outubro de 2010. Não estou GARANTINDO que a Dilma vencerá, nem poderia. Mas fico impressionado como tem gente aí que pega a GARANTIA de um cara como o Montenegro e toma isso como análise neutra e com substância.

Fonte: Vi o Mundo

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