domingo, 12 de outubro de 2008

São Paulo: cidade limpa, dos pobres

por Raimundo Bonfim

Na Cidade de São Paulo 1,6 milhão de pessoas moram em loteamentos irregulares; 2 milhões em favelas; 600 mil em cortiços e 13 mil nas ruas. O município, através da Lei 13.340 de 13.09.2002, aprovou seu Plano Diretor, dispondo de inúmeras regras de combate à especulação imobiliária e de ordenação do crescimento planejado de nossa metrópole, criando a ZEIS (Zonas Especiais de Habitação de Interesse Social). Não obstante o acarbouço jurídico extremamente avançado do ponto de vista urbanístico, assistimos na Cidade de São Paulo uma dicotomia. De um lado vivenciamos um enorme volume de investimentos e conseqüentemente um boom de expansão imobiliária nunca antes visto na história de São Paulo – com lançamentos imobiliários de luxo (uma unidade custa até 5 R$ milhões de reais), recursos suficiente para construir 125 casas populares.

Por outro lado um em cada seis paulistanos vive em favelas – demonstrando que nem mercado nem governos conseguem diminuir o absurdo déficit habitacional paulistano, tampouco resolver a questão fundiária e dotá-los de infra-estrutura básica (água, esgoto, iluminação e equipamentos públicos) os conjuntos habitacionais, favelas e loteamentos – impossíveis de serem removidos ante a realidade social. Enquanto a população de baixa renda sobrevive em condições precárias de habitabilidade, o setor privado e o poder público investem bilhões de reais no mercado imobiliário, beneficiando tão somente as corporações capitalistas do setor. O problema não é de legislação e sim de opção política, pois a nossa Constituição, o Estatuto da Cidade e o Plano Diretor são referências mundiais de marco jurídico para a justa distribuição da terra e regularização fundiária urbana.

O prefeito Kassab tem adotado uma política sistemática de gentrificação (processo de substituição da população mais pobre pela de mais alta renda em determinadas regiões da cidade). O projeto cracolândia, as constantes remoções de favelas e de cortiços, fechamento de sedes de entidades sociais, repressão contra os ambulantes e os despejos violentos de áreas localizadas em torno das regiões nobres são exemplos da peserguição implacável contra os pobres da cidade. O programa “Cidade Limpa”, que, aparentemente é destinado para acabar com a poluição visual em nossa cidade, acoberta, na verdade, uma política “higienista”, chefiada pelo secretário das Subprefeituras, o tucano Andréa Matarazzo e o também tucano Floriano Pesaro, Secretário de Assistência e Desenvolvimento Social. O propósito é “varrer toda sujeira” da cidade – situação comparável somente com a chamada reforma urbanística e de saneamento ocorrida no início do século passado na Cidade do Rio de Janeiro, quando o comércio ambulante foi proibido, moradores expulsos de suas casas e vacinação da população supostamente atingida com epidemias.

A sociedade civil não pode ficar inerte diante dessa política de higienização – que valoriza o capital imobiliário em detrimento do massacre e exclusão de milhares de pessoas. É necessária uma reação para denunciar e barrar essa política de cidade limpa, dos pobres.

Raimundo Bonfim é advogado e Coordenador-geral da CMP (Central de Movimentos Populares) do Estado de São Paulo.

Fonte: Caros Amigos

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