domingo, 12 de outubro de 2008

Crise dos EUA já atingiu o Brasil

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"Vamos ter um Natal extraordinário", afimou Lula nesta semana, num tom otimista característico de qualquer governante. Ao mesmo tempo em que adota medidas, embora tímidas, para conter os efeitos da grave crise nos EUA, o governo tenta acalmar o "deus-mercado". No extremo oposto, o irresponsável FHC, que desmontou o estado nacional e degradou o trabalho, posa de Cassandra e aposta no quanto pior, melhor. Suas recentes declarações à imprensa, sempre em tom alarmista, revelam cinismo e rancor típicos de um presidente escorraçado nas urnas e detestado pelo povo.

por Altamiro Borges

Como lembra o sociólogo Emir Sader, "FHC, apóstolo do caos, aposta na crise, na recessão. Ele conhece bem isso. Afinal, nos seus oito anos de governo, quebrou o Brasil três vezes e teve de ir ao FMI três vezes para assinar novas cartas-compromisso. Escondeu a crise durante a campanha eleitoral de 1998 e fez de tudo – ajudado amplamente pela mesma imprensa privada que agora aposta no caos – para ganhar no primeiro turno, porque o país estava de novo quebrado e Pedro Malan negociava novo acordo de capitulação com o FMI. Não deu outra, veio a crise, os juros foram elevados para 49% (sic) e a economia entrou em prolongada recessão".

Rede Globo perde o sono

Tirando esta guerra retórica, a crise nos EUA já chegou ao Brasil. Não se sabe ainda o tamanho e a duração dos estragos, mas alguns sinais preocupantes já se manifestam. As unidades da GM de São José dos Campos e São Caetano anunciaram férias coletivas para os metalúrgicos, alegando retração dos investimentos da matriz nos EUA. Na Zona Franca de Manaus, a Moto Honda e a Elgin comunicaram ao sindicato da categoria que também darão férias coletivas. Ainda segundo a entidade, a Sony demitiu 100 trabalhadores. O clima nesta base operária já é de insegurança.

Empresas que especularam no cassino financeiro também mostram fragilidades. A Votorantim já perdeu R$ 2,2 bilhões no mercado de cambio; os acionistas da Sadia abrirão "processo contra os administradores desta empresa para ressarcimento das operações que levaram à perda de R$ 760 milhões"; e a Aracruz admitiu prejuízos de R$ 1,95 bilhão. A incerteza abala a Bolsa de Valores de São Paulo, que despencou nos últimos dias. Até a poderosa Rede Globo, que sempre defendeu a orgia financeira, está estressada. Ela acumula dívida de US$ 665 milhões e a disparada do dólar tira o sono da sua diretoria e de alguns astros globais, que temem por seus contratos milionários.

Qual o grau de vulnerabilidade?

Ninguém sabe qual será o impacto da crise no Brasil. Até críticos menos rancorosos do que FHC acham que a economia está mais blindada, com reservas em divisas, superávit comercial e dívida externa sob controle. Lembram que o mercado interno teve certo aquecimento, devido à elevação do salário mínimo e aos programas sociais do governo, que retiraram milhoes de famílias da miséria absoluta e injetaram dinheiro na economia. Citam ainda a diversificação das relações comerciais do país, que hoje não depende tanto dos EUA, como no período do "alinhamento automático" de FHC. Apesar destes avanços, há dúvidas sobre o verdadeiro grau de vulnerabilidade do Brasil.

Para Marcio Pochmann, presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a nova dinâmica do mercado interno ajudará a minimizar os efeitos destrutivos da crise nos EUA. "Parte significativa da expansão da nossa economia depende do mercado interno e relativamente pouco do mercado externo. Isto nos ajuda a entender como o Brasil, frente à grave crise internacional, não foi afetado de forma tão decisiva". Ele também valoriza os avanços nas relações comerciais mais diversificadas. Mesmo assim, ele alerta: "Isto não significa que não seremos afetados pela crise internacional", que deverá ter um "efeito dominó" sobre a economia de todos os países.

"O pior ainda está por vir"

O Prêmio Nobel de Economia, Joseph Stiglitz, também avalia que "o Brasil hoje está bem mais preparado que há alguns anos". Mas, para ele, "o pior ainda está por vir" e "ninguém está imune à crise. O Brasil, por mais preparado, também não". Ele ainda aponta um risco pouco citado por outros analistas, o da grave crise na agricultura. "Muitos investidores estrangeiros colocaram seu dinheiro nas commodities nos últimos meses, fugindo do dólar. Com a crise, o primeiro impacto é o fim dos créditos e as dívidas contraídas podem ser um problema no campo. Além disso, tudo indica que os preços das commodities vão cair. A bolha no Brasil pode estar no campo".

Mais pessimista, o ex-presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Carlos Lessa, afirma convicto que a crise causará enormes estragos ao país. "O Brasil já foi atingido. A bolsa de valores caiu violentamente, o real se desvalorizou, a taxa de câmbio subiu e as empresas brasileiras que têm empréstimos no exterior estão com muitas dificuldades de renová-los. Assim, a reserva internacional começou a diminuir". Ele lembra que, apesar da retórica, o governo já reconheceu a gravidade da situação ao reduzir o compulsório dos bancos e ao injetar dinheiro na economia. Mas o economista acha que estas medidas ainda são tímidas.

Medidas de defesa da economia

"O Brasil deveria adotar políticas de controle de câmbio e de regulação das exportações", sugere Lessa. Mesmo com nuances no diagnóstico, Pochmann também defende medidas mais incisivas para defender a economia. Ele lembra que a crise colocou em xeque a hegemonia dos EUA e os dogmas neoliberais, em especial a flexibilização financeira. "É necessário o Estado para garantir maior regulação e condição saudável para a existência da economia. Acredito que estamos diante de um novo movimento de pêndulo para a ampliação da regulação sobre a economia capitalista". Para ele, é urgente aumentar os mecanismos de controle sobre o sistema financeiro.

Até o ex-ministro Delfim Netto, tsar da economia durante a ditadura militar, propõe endurecer a relação com os bancos. Defensor da economia de mercado, ela avalia que a desregulamentação saiu de controle e defende maior intervenção estatal. "Diante de uma crise sistêmica, não adianta querer discutir. Não estamos tratanto de questões filosóficas, mas de problemas práticos". Para garantir liquidez, ele propõe que o Banco Central e o Ministério da Fazenda firmem um acordo com os bancos para enfrentar a crise. "Eles terão de cooptar os banqueiros. É dizer: olhem aqui, vocês podem até empoçar o dinheiro que têm, mas só que vocês vão pagar um preço caro".

Em síntese: a crise mundial, deflagrada nos EUA, é das mais graves da história do capitalismo. Ela foi agravada pela desregulamentação imposta pela dogmática neoliberal, sob hegemonia do capital financeiro. Nenhum país ficará imune aos seus efeitos destrutivos. No caso brasileiro, a vulneralibilidade conjuntural hoje é menor. Mesmo assim, o país já foi atingido. O Brasil ainda é muito dependente da liquidez externa e da exportação de produtos de baixo valor agregado, das commodities. Para evitar que a gripe vire uma tuberculose, o governo precisará adotar medidas mais incisivas de controle do fluxo de capitais e de regulamentação do sistema financeiro, entre outras.

Da redação Vermelho

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