quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Perspectivas sombrias e grandes soluções

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De certo modo, a atual crise é um efeito retardado da queda simbólica e real do Muro de Berlim, combinada com o avanço neoliberal da globalização, a partir da década de 1980. As burguesias dos países centrais e periféricos acharam que tinham chegado ao paraíso.

De toda esta crise econômico-financeira, espera-se que sobre alguma coisa de positivo. Não se tem como evitar o sofrimento humano dos que, realmente, estão sendo duramente atingidos mundo afora. Não há como impedir, nos limites geográficos do império do capital, o aumento do desemprego, da carestia e a diminuição do poder dos Estados nacionais em cuidar dos doentes e de assistir os endividados. O saldo real desta nova crise será pago pelos de sempre. Caberá aos que carregam o fardo do capital, administrar suas vidas concretas em um contexto de maior dificuldade.

O que se espera é que a crise sacuda consciências, destrua ilusões e amplie laços de solidariedade. Diminua distâncias entre povos e culturas, reforçando a idéia de uma humanidade globalizada, apesar das diferenças e complementaridades. Quebre orgulhos nacionais, faça evaporar retóricas reacionárias de Estado e contribua para a paz universal. Os seres humanos continuam sendo orgânicos, precisam da luz do sol para sobreviver e usam de suas inteligências para interpretar o mundo que os rodeia.

Nesse duro momento de crise, é bom refletir sobre nossas fragilidades e perceber que a modernidade ensaiada no século passado não completou seu ciclo. O modo de produção dominante continua trazendo a infelicidade coletiva, seus sujeitos históricos continuam ativos, mesmo que se tente destruir a teoria dos sujeitos, descentrá-los e impedir que eles sejam conhecidos. A crise desnudou o rei. Continua sendo preciso guilhotiná-lo, depois de apeá-lo do poder.

A crise demonstra, mais uma vez, a validade das grandes narrativas histórico-políticas e que existe uma verdade de base, uma realidade objetiva da qual não se pode fugir. Quando se tenta, ela persegue seus desafetos, denunciando a incapacidade deles de compreender o que causa as crises e qual a solução real para o problema. Ela aponta para urgência de estratégias que levem à superação do atual sistema. Demonstra que qualquer outra solução é paliativa.

De certo modo, a atual crise é um efeito retardado da queda simbólica e real do Muro de Berlim, combinada com o avanço neoliberal da globalização, a partir da década de 1980. As burguesias dos países centrais e periféricos acharam que tinham chegado ao paraíso. Não havia mais o espectro do comunismo rondando o planeta. O socialismo realmente existente desmoralizou-se e desapareceu. Os mercados se abriram aos negócios, pensando que nada obstaria um crescimento sem fim. Emprestou-se dinheiro para muitos, sem imaginar que uma boa parcela não poderia pagar, porque na outra ponta do sistema rondavam os monstros das desigualdades, do desemprego e da inflação.

Pensaram que não tinham mais problemas políticos muito graves, porque muitos dos seus críticos potenciais, ou se corromperam, ou substituíram suas convicções por idéias pueris, relativizando as verdades antes conhecidas relativas ao sistema e abandonando a história. Não demorou muito para o mundo desabar sobre a cabeça de todos, tal como se está assistindo. Quando a crise chega, não poupa ninguém, nem mesmo quem fez o ‘dever de casa’ ou encastelou-se nas fortalezas efêmeras das ideologias. Os mais inteligentes, agora, devem estar pensando que deveriam ter ouvido pelo menos algumas das críticas que os atingiam.

Talvez, a força da presente crise seja capaz de melhorar o ar que se respira, encontrar e unir os verdadeiros críticos da ordem que a gera e a reproduz mundo afora. Nada melhor do que a verdade da história para destruir as certezas, que não vão além da especulação sem base filosófica ou social sustentável.

Que esta crise leve ao inferno os arautos da pós-modernidade e os burocratas de sempre que se aliam a quem está no poder! O crepitar de suas chamas, talvez elimine vermes e purifique a organicidade dos corpos e a clarividência dos homens e das mulheres de boa vontade.

*Luís Carlos Lopes é professor.

Fonte: Agência Carta Maior

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