quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Alon Feuerwerker: Crise, Pútin e as agendas mortas

::

"A crise financeira mundial é uma oportunidade para o presidente russo, Vladimir Putin, fazer o ajuste de contas com os oligarcas, milionários que construíram sua riqueza apropriando-se de ativos estatais após o colapso da União Soviética", aponta o jornalista Alon Feuerwerker em artigo publicado na última terça-feira (21) em seu blog.

"Com a turma do 'estado mínimo' de pires na mão e à cata de novas idéias, vivem-se tempos em que cabe aos governos decidir quem vai sobreviver e quem vai morrer", escreve.

"Na Rússia está sendo assim, como mostra o texto da Bloomberg. Nos Estados Unidos, também. O governo americano decidiu matar o Lehman Brothers, enquanto salvava outras empresas", diz Feuerwerker.


Leia abaixo a íntegra do texto

Da Bloomberg:
Putin usará diminuição do crédito para 'destruir' olgarcas
Por Torrey Clark e Henry Meyer


Vladímir Pútin chegou ao poder em 2000 prometendo destruir 'a classe' dos oligarcas russos. Em dois anos, ele mandou dois para o exílio e aprisionou outro. Agora, pode usar a dissolvição do mercado globar para completar o trabalho.


Os US$ 50 bilhões que o premiê e o presidente Dmitry Medviedev prometeram emprestar às empresas insolventes estenderão o controle do estado sobre os líderes empresariais.


Bilionários suplicando ajuda — dentre eles Oleg Deripaska, o mais rico da Rússia, e Mikhail Fridman — terão de dar às autoridades o direito de veto nas decisões financeiras de suas empresas.


"Isso dará ao estado mais influência sobre as maiores empresas e indústrias do país", afirmou Chris Weafer, executivo da UralSib Financial Corp. em Moscou. "Em 2008, só existe apenas um oligarca: o estado".


Tudo isso marca a inversão de uma década atrás, quando os oligarcas financiaram o quase insolvente governo de Boris Iéltsin. De acordo com a revista Forbes, até abril deste ano, as cem maiores fortunas da Rússia controlavam uma fortuna equivalente a um terço da economia". Leia aqui o texto inteiro (em inglês).

Quem está bem na crise atual? Seja entre as pessoas, as famílias ou as empresas, leva vantagem quem está operacionalmente no azul, tem pouca dívida e dispõe de caixa.

Esses não vão apenas sobreviver, vão poder ir às compras e arrematar baratinho de quem está na outra ponta do espectro: os endividados, sem dinheiro e operacionalmente no vermelho.

É a lei da selva. Da turma em dificuldades sobrarão poucos. Vários vão quebrar, alguns serão absorvidos e participarão do que é eufemisticamente chamado de "consolidação".

É o outro nome da monopolização, ou oligopolização se preferirem. O sistema bancário brasileiro vai ficar menos competitivo do que já é. Os grandes bancos vão acabar de dominar o mercado e poderão impor suas regras aos clientes, ainda mais. Nas tarifas, por exemplo. Uma área em que o cidadão já é bem esfolado, enquanto o governo finge que nada vê.

Agora, dinheiro mesmo, de verdade, só quem tem hoje em dia são os governos. É por isso que os negócios privados, após anos de antiestatismo retórico, estendem o pote ao Estado em busca de socorro.

Com a turma do "estado mínimo" de pires na mão e à cata de novas idéias, vivem-se tempos em que cabe aos governos decidir quem vai sobreviver e quem vai morrer.

Na Rússia está sendo assim, como mostra o texto da Bloomberg. Nos Estados Unidos, também. O governo americano decidiu matar o Lehman Brothers, enquanto salvava outras empresas.

Só que a coisa degringolou e teria se transformado em catástrofe se o premiê britânico, Gordon Brown, não tivesse soprado na corneta o toque de avançar.

Qual foi o mérito de Brown? O de entender que a crise só poderia ser enfrentada se os governos anunciassem a disposição de capitalizar sem limites qualquer entidade econômica que desejassem.

Mas isso terá que ser feito também por meio da aquisição, pelo Estado, de participação societária nas empresas beneficiadas. A estatização das empresas. E a preços bem baixos, dado que o mercado está vendedor, como mostram as bolsas.

Daí que a Bloomberg possa dizer que Putin está perto de cumprir sua promessa eleitoral de "destruir os oligarcas como classe". Até no Brasil o governo já entendeu que os bancos estatais devem avançar no mercado.

É isso: a sociedade (permito-me usar o termo, por didatismo) pede a proteção do Estado. E eu pergunto: se o alto da pirâmide implora por proteção estatal, como poderá justificar a eliminação das ralas proteções que o Estado dispensa à base da formação social? Como falar em reforma trabalhista ou previdenciária?

São hoje agendas mortas. Ainda que possam ressuscitar lá na frente, quando o edifício tiver parado de chacoalhar e a turma de sempre sentir-se novamente com força para avançar no bolso alheio.

Fonte: Blog do Alon


Share/Save/Bookmark

Nenhum comentário: