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por Leonardo Sakamoto
A Comissão Pastoral da Terra (CPT) divulgou os dados sobre os conflitos agrários do primeiro semestre deste ano. Em número absoluto, eles diminuíram: de janeiro a julho de 2009, foram registrados 366 conflitos, que afetaram diretamente 193.174 pessoas, enquanto que no mesmo período de 2008, foram contabilizados 678 conflitos e 301.234 envolvidos. Contudo, a regularidade com a qual se desrespeita os direitos humanos e a persistência das condições geradoras e dos atos de confronto continuam dando contornos à violência no campo brasileiro. E os números continuam vergonhosamente altos. Posto abaixo trechos de uma matéria que produzimos aqui na Repórter Brasil sobre o assunto.
Dados sobre expulsões (promovidas por agentes privados) e despejos (executados pelo poder público) ilustram bem essa forte tendência de continuidade. Segundo Dirceu Fumagalli, da coordenação nacional da CPT, é possível identificar uma “sincronia” de ações em que o resultado final é sempre o mesmo: a negação do acesso de trabalhadores e comunidades à terra. “Quando os despejos não são feitos pelo Estado, a ação privada nas expulsões aumenta [como se deu em 2007]. Quando o próprio Estado faz mais despejos [como se verifica em 2008 e 2009], a ação privada diminui”.
Ou seja, na falta de jagunços, o Estado entra com a polícia.
Ao todo, foram 12 assassinatos, 44 tentativas de homicídio, 22 ameaças de morte e seis pessoas torturadas de janeiro a julho deste ano. Nos mesmos meses de 2008, foram 13 assassinatos, 32 tentativas de homicídio, 38 ameaças de morte e dois torturados. Se o mês de agosto de 2009 for incluído no balanço, o número sobe para 17 - sem os cinco assassinados no Assentamento Chico Mendes, em Brejo da Madre de Deus (PE), em julho, pois o crime ainda está sob investigação.
De acordo com a CPT, 2.013 pessoas foram libertadas de trabalho escravo na metade inicial de 2009. Nos Estados do Acre, Pernambuco, Espírito Santo, Rio de Janeiro, Tocantins e Bahia, o número de libertações já é maior que o registrado em todo o ano passado. Surpreendentemente, 39% (786 pessoas) dos que ganharam a liberdade no 1º semestre eram explorados no Sudeste.
Um dos dados mais preocupantes é a quantidade de adolescentes libertados da escravidão. Apenas no primeiro semestre de 2009, foram libertados 88 jovens com menos de 18 anos. No mesmo período em 2008, foram 16. “Isso mostra uma nova geração sob o jugo da escravidão, perpetuando o histórico de seus antepassados”, comenta a CPT, que salienta que os dados divulgados são parciais, pois novas informações a respeito de conflitos ocorridos neste mesmo período poderão ser incluídas posteriormente no relatório anual.
Na visão de Dirceu, a estrutura estatal (incluindo os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário) atua a favor da permanência da concentração da terra, apontada por ele como causa fundamental dos conflitos agrários. “O Estado não está para cumprir os direitos constitucionais”, declara. O representante da CPT lembra que não há uma a reforma agrária efetiva no país, que a impunidade não regride e que as políticas públicas que deveriam garantir qualidade de vida não são capazes de evitar a vulnerabilidade dos excluídos - que desemboca em fluxos migratórios e na sujeição ao trabalho escravo.
Além da ausência de avanços efetivos na política de democratização da terra, as obras de infra-estrutura de apoio ao agronegócio, como as previstas no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do governo federal, também contribuem para este clima de pressão. “As populações locais e os grupos que se opõem [a esses empreendimentos] sofrem intimidações e, às vezes, chega-se ao recurso desta violência extrema”, completa Darci Frigo, advogado da ONG Terra de Direitos, que acompanha questões de conflitos agrários país afora.
Fonte: Blog do Leonardo Sakamoto
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