quarta-feira, 30 de setembro de 2009

A depressão silenciosa (nos EUA)

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Os mais pobres, EUA: A depressão silenciosa

25/9/2009, por Greg Kaufmann, The Nation



Na manhã de 23 de setembro, o Secretário do Tesouro, Timothy Geithner participou de uma audiência da Comissão de Serviços Financeiros para discutir planos para prevenir um novo colapso econômico [ing. economic meltdown]. Vários especialistas falaram sobre como os grupos minoritários da população estão enfrentando o atual colapso econômico – colapso que ninguém previu, como se sabe –, e deixaram bem claro que nenhuma das iniciativas do governo federal (chamadas ‘de recuperação’) considera com objetividade os interesses daquelas minorias.

“Para a maioria dos grupos étnicos minoritários, a Grande Recessão é, de fato, uma Grande Depressão”, disse o deputado Democrata Edolphus Towns, de New York, presidente da Comissão [de Deputados] para Supervisão e Reforma do Governo.

Towns falou da taxa de desemprego de 15% entre os afro-descendentes e de 13% entre os hispânicos – muito acima dos 9,7% de desemprego nacional. Assustadores 22% dos norte-americanos nativos que vivem em reservas estão desempregados. “A taxa de desemprego dos afro-descendentes residentes em NYC subiu quatro vezes mais depressa que a dos caucasianos, entre o primeiro trimestre de 2008 e o primeiro trimestre de 2009” – disse Towns.

A crise dos despejos também é impressionante e continua a aprofundar-se à medida que aumenta o desemprego – e também teve impacto excepcionalmente violento sobre as minorias. O secretário de Habitação e Desenvolvimento da Comunidade de Maryland, Raymond Skinner, disse que em Baltimore e no Condado Prince George – as duas áreas em que grupos nacionalmente minoritários constituem maioria da população –, para uma população equivalente a 26% da população do estado, houve 42% dos despejos estaduais, nos últimos 18 meses. Só em 2007, no Condado Prince George, os proprietários de casas perderam cerca de 1 bilhão de dólares, com a queda no preço das propriedades e multas e taxas administrativas devidas a empresas financeiras.

Inicialmente limitada ao mercado dos ‘subprimes’ – no qual as minorias que estariam qualificadas para empréstimos com melhores juros, acabaram por ser empurradas para empréstimos com juros exorbitantes, chamados ‘subprimes exóticos’ –, a crise dos despejos agora se ampliou. Nas palavras de Skinner, “os despejos estão assumindo uma nova face. No segundo semestre de 2009, a maioria dos despejos no país já são casos considerados empréstimos “de primeira classe”, para tomadores considerados confiáveis.

“A crise agora está sendo ampliada pelo desemprego e perda de renda”, disse James Carr, coordenador da National Community Reinvestment Coalition. “Em 2009, quase 60% dos despejos têm, como principal causa, o desemprego.”

O esforço do governo Obama para conter os despejos está sendo, numa palavra, completamente ineficaz. Para Carr, a modificação nas ofertas de empréstimos nos novos programas para os bancos são “cheias de muitas cenouras [mas] não há qualquer porrete que force os bancos a ações mais responsáveis.” Os tomadores perdem dez vezes mais dinheiro num despejo do que numa renegociação de hipoteca – cerca de 144 mil dólares, em média, em relação aos 14 mil de uma renegociação sem impostos. Os bancos, então, têm preferido a solução final do despejo (e deduzem a perda maior dos próprios impostos), em vez de renegociar o empréstimo – renegociação que, no longo prazo, seria proveitosa para o tomador e para a comunidade. Resultado disso, apenas 12% dos proprietários conseguiram renegociar seus empréstimos, nos termos do programa “Making Home Afforda ble”.

É claro – como todos sabemos, exceto o Senado controlado pelos banqueiros – que temos de reformar a legislação da falência, para que os juízes possam modificar as condições das hipotecas para moradia, exatamente como já podem modificar condições de pagamento de iates ou de investimentos. Cerca de 30% dos empréstimos em que há risco de despejo seriam beneficiados por essa reforma, disse Carr. Mas todos os participantes da audiência concordaram que nenhuma modificação da legislação conseguirá beneficiar os que estejam ou venham a ficar desempregados.

Carr sugere que se produza uma “nova versão da Homeowners Loan Corporation" (HOLC) da era da Grande Depressão. A HOLC poderia negociar hipotecas que ficassem num ponto intermediário entre o valor de mercado e o valor de face, e usar o desconto para modificar os empréstimos [ing. HOLC could use eminent domain to purchase loans at a cost between the current market value and face value, and use the discount to modify the loans]. Os desempregados poderiam fazer acordos de aluguel que possibilitassem que a família permanecesse na casa, ou receberiam bolsas ou empréstimos de emergência para continuar pagando as prestações da hipoteca. Seria resultado muito melhor e muito mais barato do que o despejo, que cria casas abandonadas e em deterioração e faz cair o preço dos imóveis. A HOLC não aparece ainda no radar, nem do governo Obama nem do Congresso – mas é ideia que já deveria estar sendo considerada.

Outros especialistas reunidos na audiência falaram sobre os fundos insuficientes alocados pela ‘Lei da Recuperação e Reinvestimento dos EUA’ [ing. American Recovery and Reinvestment Act especificamente para os mais duramente atingidos pela recessão – que, afinal, são o público-alvo explícito da lei. É preciso oferecer estímulo imediato à geração de empregos, e uma extensão dos serviços de assistência aos desempregados. Dentre as ideias apresentadas para reforçar a recuperação, destacam-se: fixar uma percentagem em todos os projetos de infraestrutura para treinamento de trabalhadores portadores de necessidades especiais; alocar fundos para construção de prédios públicos, projetos de reforma e renovação para reconstrução de comunidades urbanas; aumento nas oportunidades de trabalho e negócios para as minorias nacionais nos projetos governamentais; e financiamento para ‘empregos verdes’ – nos quais os salários tendem a ser melhores, que se dedicam às necessidades de infraestrutura nas comunidades de baixa renda e cuja demanda aumentará na economia das energias renováveis.

“Dirigir os dólares para os indivíduos e comunidades que mais e mais imediatamente necessitam deles ajudará, sim, a estimular toda a economia, salvará empregos e criará novos, tanto para as famílias mais necessitadas quanto para toda a população dos EUA” – disse Carr. “Famílias que vivem no limite da sobrevivência empurrarão esses dólares de volta à família mediante o consumo (remédios, roupa, atenção às crianças, energia, transporte e outras necessidades básicas). Esse gasto reaquecerá vários setores da economia e terá impacto positivo nas comunidades nas quais circulem esses dólares e em toda a economia nacional.”

Contudo, além de conter os despejos e criar programas direcionados para a geração de empregos, é preciso atacar diretamente as barreiras raciais e a persistente discriminação, para que se criem oportunidades econômicas, além de opções de moradia, transporte e educação pelas quais as populações minoritárias possam pagar. De fato, a discriminação desempenhou papel decisivo no colapso econômico. É preciso proclamar essas evidências e responder a elas com criatividade e decisão, para pôr fim a essa depressão silenciosa.

O artigo original pode ser lido em
: The Nation

Fontes: Vi o Mundo / The Nation


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