quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Tempo de compromissos

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por Marina Silva*

Há uma semana, executivos das maiores empresas do país, reunidos em São Paulo no seminário "Brasil e as Mudanças Climáticas: Oportunidades para uma Economia de Baixo Carbono", se comprometeram a fazer a sua parte em relação ao meio ambiente.

Assumiram o compromisso de reduzir, ao longo dos próximos anos, o chamado conteúdo específico de carbono dos seus produtos. Esse conteúdo mede o quanto de carbono fóssil é emitido no processo que vai da fabricação ao consumo das coisas que estão no nosso dia-a-dia.

Essa não é uma questão menor, marginal, meramente romântica. É crucial. Deixá-la de lado será ficar para trás em relação ao resto do mundo. A economia de baixo carbono, conectada com a realidade do aquecimento global, já avança nos fóruns e organismos internacionais. As empresas que ignorarem isto perderão muito mais dinheiro do que imaginam perder para adaptar seus processos às exigências ambientais.

A iniciativa das empresas também é importante para revigorar as difíceis negociações, ainda em curso, entre os representantes dos governos participantes da Convenção do Clima, cuja reunião anual está marcada para dezembro, em Copenhague, na Dinamarca. É nela que deverá se definirá a continuidade do Protocolo de Quioto que engloba os países mais ricos.

Mas a novidade esperada para essa reunião é um possível compromisso dos grandes países emergentes - principalmente Brasil, China e Índia - com os esforços internacionais de redução das emissões de carbono para a atmosfera. O Brasil provavelmente não avançará para além da promessa já feita no ano passado de reduzir em 70% o desmatamento da Amazônia até o ano 2017.

Está previsto até o final do ano um levantamento completo das emissões de gases do efeito estufa em cada setor do país, a partir de dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e da própria indústria. Preliminarmente já sabemos que o Brasil caminha para um perfil de emissões similares aos dos países desenvolvidos, impulsionados pelos setores da indústria, energia e transportes. Uma tendência que precisará ser equacionada.

Esse equacionamento significa ir além do enfrentamento do desmatamento e das queimadas. Representaria, por exemplo, melhorar muito a atividade pecuária, onde 190 milhões de cabeças de gado ocupam 200 milhões de hectares de pasto: um único boi ou vaca em uma área maior que um campo de futebol.

Melhorar esse índice reduzia a pressão pelo desmatamento e poderia aumentar a oferta de áreas já desmatadas para a produção agrícola, de florestas energéticas, de biocombustíveis e para a recuperação florestal.

Assim, nesses dias que precedem a reunião em Copenhague, o contraste mais notável no nosso país é entre o governo federal e algumas das nossas maiores empresas. Enquanto o governo resiste a assumir metas globais, numa lógica compreensível apenas no jogo diplomático internacional, as empresas tomam a frente do processo e antecipam aquilo que vai ser - cedo ou tarde - a tarefa que caberá a todos: reduzir as emissões atmosféricas de gases que vem aquecendo o planeta e provocando as mudanças climáticas globais.

Para interromper esse jogo diplomático imobilista dos governos, é preciso lembrar que o que está em campo é nada mais nada menos do que a condição de sobrevivência de uma grande parcela da espécie humana e da biodiversidade no planeta. Dada a dimensão do problema, é melhor tomar a atitude correta antes cedo do que tarde.

*Marina Silva é professora de ensino médio, senadora (PV-AC) e ex-ministra do Meio Ambiente.

Fale com Marina Silva: marina.silva08@terra.com.br

Fonte: Terra Magazine

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