sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Marjorie Rodrigues - impagável! Um dos melhores blogs dos últimos tempos.

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Assvertising COMBO: (quase) todos os clichês sobre as mulheres num post só

Ultimamente, a publicidade brasileira tem superado os próprios níveis de escrotidão. Parece até que as agências estão competindo para ver quem faz o comercial mais machista. Bem, não sei exatamente o que eles ganham com isso, mas sei muito bem que quem sai perdendo somos nós. Então peguem seus caderninhos e respirem fundo: vamos começar a contar as baboseiras.

CLICHÊ #1 - O corpo feminino é defeituoso e precisa de cuidado constante

PARTE 1

aboborascarefree

Carefree, com o slogan “mantenha seu encanto por mais tempo”. Não achei no You Tube, gente. Sorry. Mas o comercial é basicamente este: quem usa os lenços íntimos perfumados Carefree fica “livre de odores” o dia inteiro, mantendo seu “encanto” por mais tempo. As outras vão virando abóboras — literalmente — no meio do caminho.

(Pois é. Cactos, abóboras, costelinhas… Tô ansiosamente no aguardo para saber a quais outros itens da fauna e flora os publiciotários vão nos comparar)

Para quem não entendeu a mensagem, calma que a gente destrincha. É mais ou menos assim:

Alguém já te disse que você é uma pessoa interessante? Se sim, a que você atribui tal elogio? De onde você acha que vem o seu “encanto”?

a) Da simpatia, sociabilidade ou bom humor;
b) Da inteligência ou erudição;
c) De algum talento específico, como tocar violão ou escrever poesias;
d) Do cheiro da tua buceta.

Se você respondeu A, B ou C, você é uma idiota. Saiba que o maior e mais poderoso ”encanto” de toda mulher é o odor que emana da sua genitália! Odor este que pode ser sentido a qui-lô-me-tros de distância.

…E VOCÊ, SUA DESGRAÇADA, FEDE!!!!1 Quantos banhos você toma por dia? Um de manhã e outro quando você chega do trabalho? Não é o suficiente, sua porca! Tem que passar uns paninhos perfumados o dia inteiro para segurar a nhaca! Se teu chefe sentir o cheiro dessa buceta nojenta, você não vai conseguir aquela promoção, tá me entendendo? Pior ainda: se perder o “encanto”, VOCÊ VAI FICAR ENCALHADA!!! É preciso manter teu encanto pros homens, mocinha. Senão vai virar uma solteirona, cheia de gatos e, quando morrer, ninguém vai dar falta de você. Aí os gatos vão ficar com fome e comer sua cara. E tudo por quê? Por quê? Porque você não tomou conta desse teu corpo imundo, sua relaxada. Vai perfumar essa buceta! AGORA! CORRE! Não, não pode esperar mais cinco minutos. É capaz de você virar abóbora no caminho para o banheiro! Vai, vai, vai!

PARTE 2

Não contente em fazer um elogio à jornada múltipla para as adultas, Dermacyd agora está de olho nas adolescentes. Então, chamou uma adulta para dar lição de moral nelas, falando sobre sabonete íntimo como se fosse uma obrigação. Obrigação — tanto quanto fazer escova, unha e depilação (!). Afinal, é preciso que as meninas aprendam desde cedo que suas vaginas são extremamente fedidas e frágeis e, portanto, precisam de cuidados especiais.

Só que, na boa? Acho que esse comercial sofre de falta de verossimilhança. Eu não convivo com nenhum adolescente – mas algo me diz que, se um adulto chegar num adolescente se esforçando para falar sua língua (com gírias demodê tipo “fala sério, amigaaam!”) e ainda fazendo ESTA cara…

dermacyd

…o máximo que este adulto irá conseguir é um “tá, tá, tá. Whatever, tia. Fala com a minha mão”.

CLICHÊ #2 – Tudo o que uma mulher quer na vida é homem

PARTE 1


(preciso registrar que eu quero o vestidinho dela, porém)

Quando você está menstruada, o que espera que o absorvente faça? Impeça que o sangue manche sua roupa, certo? Errado. O que você quer é que este sangue NO-JEN-TO fique o mais longe possível da sua pele!!!!1 É preciso haver uma camada que separe a sua pele deste líquido indesejável. Tão indesejável e nhaquento que nem mesmo os fabricantes de absorventes querem que você se lembre dele nos comerciais — usam um líquido azul.

(E, ei, nem venha me dizer que eles não usam um líquido vermelho porque isto “choca”. Tem cena com sangue até na seção da tarde e ninguém fica chocado ou com nojinho. O problema é com o meu sangue, então. O problema é com um sangue muito específico: a menstruação. O problema é com o feminino. Tanto é que, de uns tempos para cá, vários banheiros públicos passaram a ter, ao lado do papel higiênico, um compartimento com saquinhos plásticos — geralmente patrocinados por, ahá, Intimus Gel! Diz: ”deposite seu absorvente usado aqui”. Serve, portanto, para isolar o absorvente do resto do lixo. Como se a menstruação fosse mais suja ou esteticamente desagradável do que um papel sujo de urina ou cocô).

Ah, sim. Além de te manter o mais longe possível dessa coisa nojenta que insiste em sair do teu corpo, você também quer que o absorvente te ajude a arranjar um peguete. Hã, como isso é possível? O que tem a ver uma coisa com a outra? Bem, não subestime a capacidade dos publicitários de fazer ganchos esdrúxulos: quando não está grilada com o fato da sua pele estar em contato direto com a menstruação, a mulher fica confiante. Gente confiante anda rebolando com um ventilador na frente do rosto. E aí, pimba!, todos os homens vão querer transar com você.

…Mas péra aí. Que vantagem Maria leva? Se o sangue menstrual é assim tão horrível, a última coisa que essa menina ia ter coragem de fazer é transar menstruada.

PARTE 2

Fiquei na dúvida: a proposta do comercial era contar o tempo por Melissas ou por homens?

Na boa, será que mesmo as mocinhas super descoladas de Melissa ainda estão apenas esperando o príncipe encantado — apesar da faculdade, apesar do balé, apesar das viagens, apesar do caralho a quatro? Tudo isso era só matação de tempo enquanto o príncipe não vinha? Será que todo comercial que faça uma linha do tempo com a vida de uma mulher sempre tem de seguir o caminho namoro-casamento-filhos? É a única possibilidade? Não dava para modernizar a coisa, não?

A cereja do bolo fica por conta do complexo de vira-lata, ao final. “Massachussets, terra prometida!”. Way to go, bóra reforçar o estereótipo da brasileira que só quer arrumar um gringo, a fim de fazer um “upgrade” para o primeiro mundo. Mesmo que você tenha visto o gringo em questão pela última vez há séculos, ainda na infância. Tanto faz. O que importa é o green card.

CLICHÊ # 3 – Mulher não é gente, é enfeite. E não pode envelhecer

Depois do concurso besta da revista Pix e do lingerie day, acho que já está mais do que clara a idéia da mulher como enfeite, como algo que deve estar ali para o deleite dos homens (agora não tô achando o e-mail, mas no dia 8 de março eu também me irritei um bom tanto com um site de empregos que me mandou um spam, parabenizando as mulheres pelo dia. Dizia algo como “obrigado por existir: por enfeitar o mundo e gerar a vida”. Pois é, né? Enfeitar e parir, é só para isso que a gente serve).

Este comercial só reproduz essa idéia. Se a vizinha é uma mulher, ora, ela não pode simplesmente existir. Tem de enfeitar. Tem de agradar aos olhos do cara nem que seja durante os cinco segundos em que ele dá bom dia para ela. Afinal, deus o livre de ter de olhar para uma mulher velha por cinco segundos todo dia, ew! E é isto o que eu acho mais ofensivo neste comercial: a velhice ser retratada como algo tão desagradável quanto uma pia de louça suja. É raríssimo ver mulheres depois de uma certa idade na TV. E, quando aparecem, aparecem como algo a ser eliminado? Ah, vá.

CLICHÊ #4 – Homens e mulheres são praticamente espécies diferentes

Este comercial é um exemplo perfeito do que eu falo no post “Divida e conquiste“. Pode reparar: a cultura pop sempre retrata os homens como mui amigos, fiéis para sempre. Este comercial é só mais um a fazer isso. Já a amizade entre mulheres quase nunca é retratada como algo verdadeiro e duradouro, mas sim uma competição disfarçada. Em que uma está esperando para enfiar o punhal nas costas da outra.

Mas e amizade entre homens e mulheres? Diz a Skol: “a velha pergunta: existe amizade entre homens e mulheres? Não. É a velha resposta”. E aí o cara olha para os peitos da moça, enquanto finge consolá-la num velório. De novo, temos o homem menosprezado, retratado como um imbecil que só pensa com a cabeça de baixo. Incapaz de esquecer do pinto no meio do velório. Incapaz de se solidarizar com o sofrimento alheio, pois o pinto urge. Porém, desde que seja com uma mulher, a falsidade no mundo masculino é válida. O consolo de mentirinha é um punchline, algo suuuuper bacana e engraçado. Enquanto, para as mulheres, a falsidade é a prova de que são cobras perigosas. Os homens jamais são falsos uns com os outros, mas repare que a amizade dos dois caras do comercial é reforçada a cada vez que eles enganam uma mulher.

A amizade entre homens e mulheres também é impossível porque os dois são praticamente espécies diferentes que nunca, absolutamente nunca, vão gostar das mesmas coisas ou pensar igual. Eles fazem sexo, elas fazem amor; eles gostam de futebol, elas choram assistindo balé clássico; os mano pô, as mina pá. Ah, sim, sem contar que elas não têm senso de humor, né?

Mas péra aí. Se as mulheres não conseguem fazer amizade com os homens e também não conseguem fazer amizades entre si… Então o problema está com elas (como sempre…)! São elas as incapazes. A não ser, claro, que a mulher se aproxime de um homem gay. De uns tempos para cá, tem havido cada vez mais personagens gays nos filmes blockbusters, porém eles quase sempre aparecem como o conselheiro sentimental de uma mulher heterossexual. Já reparou? Aí sim a amizade é possível porque, veja bem, não é bem um homem. Mas, como também não é uma mulher, ele vem desprovido do cerebrozinho competitivo e vingativo. O cromossomo Y mantém nele a generosidade e a fidelidade. Logo, o melhor amigo gay (que quase nunca tem vida própria, diga-se de passagem) vibra de felicidade com o casamento dos pombinhos heteros! Afinal, tá ali para isso. Foda-se que ele mesmo não possa casar. Desde que os heteros estejam felizes, ele também está feliz.

E é aí que tá a minha outra crítica ao chavão “homens e mulheres não podem ser amigos, porque a empatia e as coisas em comum vão despertar desejo, mais cedo ou mais tarde”: é heteronormativo. Ora, por que se considera que, na amizade entre homens e mulheres, a probabilidade de que as afinidades gerem atração sexual seja sempre alta… Mas não se pensa o mesmo para uma amizade entre pessoas do mesmo sexo? Levanta a mão quem já brincou (ou pensou em brincar) de médico com a amiguinha, please. Levanta a mão quem já fez troca-troca. Pois é.

OBS – Depois que eu assisti este comercial pela primeira vez, senti uma vontade enorme de mandar uma mensagem pra todos os amigos homens e dizer: “sorry, querido. Não podemos mais ser amigos. Acabo de descobrir, via comercial de Skol, que nossa amizade é uma farsa. A verdade é que você só está interessado nos meus peitos”.

Fonte: Blog do Marjorie Rodrigues

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Um comentário:

infinitoamanajé disse...

Isto não é novo e está por doutrinação pelas mídias devidamente invisível aos olhos dos teleguiados.
O sistema divide para governar, manter sob seu controle a massa aterrorizada e cada vez mais robótica pela propaganda amoral da competição de classes, se sexo, de cor, de tudo o que for possível alienar e dividir para a guerra, sua obsessão ideológica... É a New World Order adubando as terras da barbárie seu campo ideal para aimplantação do 4º Reich, já em curso acelerado.
Sinto muito, sou grato!