quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Trazendo o futuro a valor presente

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por Alon Feuerwerker

Trata-se de um método. Desenhar o futuro com cores vivas e belas, e depois trazê-lo a valor presente. Criando assim a ideia (ou ilusão) de que ele, o futuro, já existe

Os bons empresários sabem como é importante, em certas situações, escapar à tentação de fazer um pouco de tudo. Sabem quando é melhor colocar o foco de suas empresas no que, em inglês, é o core business, a atividade principal. Os líderes inteligentes também agem assim, exibindo a face mais eficiente de seus governos, minimizando o que expõe fragilidade. Conforme a máxima daquele célebre ministro da Fazenda, caído em desgraça quando, sem saber que estava sendo captado pelas parabólicas, gabou-se de só mostrar o bom, escondendo sistematicamente o ruim.

O ministro caiu, mas o hábito continua. Quais os dois maiores méritos deste presidente da República? Um é ter enfiado a tacape na cabeça do país que o governo dar dinheiro para o pobre é coisa boa. A vitória definitiva de Luiz Inácio Lula da Silva no quesito está retratada nos jornais do fim de semana. Eles revelam a mudança radical de estratégia da oposição: finalmente, ela diz que vai parar de falar na “necessidade de portas de saída” para os programas sociais. Demorou. Mas antes tarde do que nunca. Êta curva de aprendizado comprida! Quantas qualis foram necessárias, pessoal?

A segunda grande realização de Lula é ter transformado o brasileiro num otimista. O assunto já foi tema da coluna em fevereiro do ano passado: “O otimismo é o grande eleitor”. Em parte por ele próprio, Lula, ser um exemplo admirável de superação e mobilidade social. E em parte por seu governo trazer dia sim outro também um desfile de projetos destinados, mais adiante, a mudar a face do país.

Trata-se de um método. Desenhar o futuro com cores vivas e belas, e depois trazê-lo a valor presente. Criando assim a ideia (ou ilusão) de que ele, o futuro, já existe. Tem um mérito, por não deixar que o porvir flutue só ao sabor da correnteza. E cria também um problema: quando os projetos apresentados por Lula são confrontados com as realizações efetivas, pode haver alguma decepção. Só que aí não será mais um problema do presidente, pois o mandato está no fim e ele sempre poderá se gabar de ter lançado os fundamentos do que virá, de ter sido o arquiteto do Brasil novo. Mas, e a construção? Ora, os engenheiros que se virem.

Ontem foi o pré-sal. Como antes tinha sido o biodiesel. E depois o etanol. A diferença é que o pré-sal de fato tem boas chances de ser um dia o que dele se espera. Se deixarem a Petrobras trabalhar. Até agora, por exemplo, ninguém conseguiu explicar direito a serventia da estatal que o Planalto propõe criar para cuidar dos novos depósitos. Aliás, Lula é mesmo um gênio da prestidigitação. Ataca, com a voz, os adversários políticos, por supostamente estarem contra a Petrobras. Enquanto com as mãos assina o projeto que ajuda na prática a debilitar o monopólio da empresa sobre o petróleo brasileiro.

Não deve haver esperança de que o Congresso Nacional faça um debate decente sobre o tema. PT e PMDB parecem estar de acordo na repartição dos dividendos, inclusive políticos, o que reduz a chance de uma contribuição substancial do mais democrático dos poderes a essa discussão tão importante. Infelizmente. Mais provável é que o governismo tente emplacar suas teses na base do rolo compressor, classificando como “inimigos do Brasil” os que tenham alguma restrição ao produto saído das conversas palacianas, comandadas pela ministra Dilma Rousseff e pelo ministro Edison Lobão.

O que vai restar para o Legislativo? Engalfinhar-se em torno de quanto da receita do novo petróleo irá para os estados e municípios produtores. Estes, especialmente o Rio de Janeiro, terão que atravessar o deserto na Câmara dos Deputados e no Senado, guerreando para evitar que os recursos se diluam por todo o país. Sobrou para o governador Sérgio Cabral.

Ironias da política. Foi o suplente de Cabral no Senado, Paulo Duque (PMDB-RJ), quem comandou o arquivamento das ações contra o presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP). O que interessava a Lula. Agora, de mãos dadas, Lula e Sarney (por meio de seu aliado Lobão) oferecem as costas às dificuldades políticas de Cabral, cujo patrimônio no Rio assenta-se na parceria com Brasília. Mas Lula sempre pode, se quiser, dar um jeito de ajudar a salvar a face de Cabral, nem que só para aumentar a dívida deste com o príncipe.

Coluna (Nas entrelinhas) publicada hoje no Correio Braziliense

Fonte: Blog do Alon

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