terça-feira, 15 de setembro de 2009

O primeiro 11 de setembro sem Bush e Cheney

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O primeiro 11 de setembro sem Bush e Cheney

Duas guerras sem final à vista e milhões de cadáveres depois (entre eles os de mais de 5 mil soldados americanos mortos, 4343 no Iraque e 824 no Afeganistão), os Estados Unidos de Barack Obama tentam distanciar-se ao menos da histeria belicista disseminada pela dupla Bush-Cheney. Como desta vez o ritual anual na área do WTC foi bem comportado, pode-se ainda fingir que não persistem as teimosas especulações paranóicas sobre suposta cumplicidade do governo anterior. O artigo é de Argemiro Ferreira.



Apesar de marcar o 8º aniversário das ações terroristas de 2001, o 11/9 de 2009 baixou a bola. Pela 1ª vez a data foi lembrada sem as presenças nefastas, na Casa Branca, de George Bush e Dick Cheney - notórios beneficiários políticos dela, obstinados em manipular o episódio para extremar sua agenda neoconservadora exorcizada atualmente dentro e fora dos EUA.

Duas guerras sem final à vista e milhões de cadáveres depois (entre eles os de mais de 5 mil soldados americanos mortos, 4343 no Iraque e 824 no Afeganistão), os EUA de Barack Obama tentam distanciar-se ao menos da histeria belicista disseminada pela dupla Bush-Cheney. Neste ano 8 do 11 de setembro conformaram-se com menos exagero nas homenagens às vítimas das ações terroristas.

De Nova York o jornalista Sérgio Dávila enviou para a Folha de S.Paulo um texto que refletiu bem o novo clima, mais civilizado, mesmo com a repetição parcial do ritual cumprido a cada setembro desde 2001. Oito anos depois, explicou ele, “ninguém sabe o que fazer com o evento histórico, tanto de maneira literal como figurada”.

O presidente Barack Obama, depois de avisar que não iria ao World Trade Center de Nova York, ficou na capital e participou de ato em homenagem às vítimas do avião lançado sobre o Pentágono. Como desta vez o ritual anual na área do WTC foi bem comportado, pode-se ainda fingir que não persistem as teimosas especulações paranóicas sobre suposta cumplicidade do governo anterior.

Os equívocos da guerra ao terror

De tal forma Bush e Cheney exploraram em benefício próprio - e da agenda deles - o episódio traumático de 2001 que ficou difícil convencer críticos mais radicais (do governo, das guerras e da arrogância militar) de que nada tiveram a ver com as ações terroristas - simplesmente as abraçaram como pretexto para impor aquilo que em condições normais o país teria rejeitado.

Outra acusação relacionada ao 11/9 poderia sim - e ainda pode - ser feita ao governo Bush e à facção neoconservadora nele empoleirada graças ao papel preponderante do vice Cheney. Ou por negligência, ou ainda por arrogância, não teria deixado o país vulnerável ao subestimar o aviso grave do governo Clinton sobre a ameaça representada por Osama Bin Laden?

Já havia indícios disso antes mas na véspera deste último 11/9 surgiu mais um depoimento capaz de reforçar a suspeita: a entrevista à rede ABC de televisão de Elie Assaad, libanês de nascimento e informante durante 13 anos do FBI (Bureau Federal de Investigações). Sua história de sucesso foi a infiltração em pequena mesquita na periferia de Miami, que em 2006 levou à prisão de sete supostos terroristas.

Assaad relatou o episódio, tido como meritório, ao repórter Brian Ross da ABC. Oficialmente, uma operação sting contra “célula terrorista”. Mas contou ainda que o FBI, cultor de tais operações (armadilhas para apanhar muçulmanos ingênuos), o impedira no início de 2001, em Miami, de ir atrás da estrela maior do terrorismo - Mohammed Atta, o saudita que meses depois lideraria o ataque de 11/9.

“Podíamos ter impedido os ataques”

Assaad queixou-se agora de que teve a chance de desbaratar o complô para seqüestrar quatro aviões e lançá-los contra o World Trade Center de Nova York e o Pentágono na capital, sendo impedido pela política equivocada do FBI, que preferia concentrar-se em operações encobertas (sting), nas quais seus agentes empurravam gente despreparada para o extremismo.

No princípio de 2001 Assaad queria aceitar um convite para ir à casa de Adnan Shukrujumah, cujo pai dirigia a mesquita de Miami. Ali teria conhecido o plano do 11/9. Mas a idéia foi vetada pelo FBI, que o mandou evitar a visita e se limitar a alvos menores, meros terroristas potenciais (ironicamente, hoje o bureau oferece recompensa de US$5 milhões pela captura de Shukrujumah).

Durante a reportagem da ABC o repórter Brian Ross ouviu ainda Richard Clarke, que à época era o especialista em contra-terrorismo do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca. “Aquilo foi mais um exemplo da maneira como o sistema, antes do 11/9, tinha entrado em colapso”, observou Clarke, autor de Against All Enemies, o livro que expôs o colapso.

Se o sistema tivesse funcionado, disse o especialista em contra-terrorismo, “teríamos sido capazes de identificar aquelas pessoas antes dos ataques”. Mas o FBI preferia que Assaad, usando o nome “Mohammed”, atraisse gente simples e oferecesse dinheiro, dizendo-se representante pessoal de Bin Laden, para tarefas específicas em favor da causa islâmica - como explodir bomba na própria sede do bureau em Miami.

Os terroristas que o FBI produz

Assaad contou que ao ser solicitado, logo após o 11/9, a examinar fotos dos 19 sequestradores do avião, reconheceu o líder Mohammed Atta. “Era a prova de que eu estava 100% certo, tinha de ter ido atrás de Shukrujumah e Atta, como queria. E não dos outros, menores, como mandou o FBI. Fiquei tão enlouquecido que, num acesso, destruí os móveis em minha casa”, contou.

Na queixa de agora o espião disse que o FBI insistia no seu modelo sting. A partir de 1996 Assaad operou em 10 estados do país e no exterior. Os alvos, apanhados em armadilhas, eram sem importância, mas com aquilo o bureau de investigações acreditava que podia mostrar serviços - êxitos aparentes. Só que nos julgamentos os advogados às vezes provavam ao júri que os réus eram na verdade vítimas do FBI.

Para a defesa, os réus, desinformados e ingênuos, tinham sido convencidos pelo próprio governo (o FBI), em troca de dinheiro, a cometer crimes. No caso célebre de Assaad, em 2006, os julgamentos de dois réus deram em nada (mistrial) enquanto cinco foram condenados por terrorismo nos demais. Mas Alberto González, Procurador Geral no governo Bush (e defensor da tortura), fez elogio público a Assaad pelas sete prisões.

Refere-se a esse caso conspícuo um vídeo obtido pela ABC e mostrado na entrevista do espião do FBI. Ali aparecem os sete fazendo juramentos de lealdade a Bin Laden e recebendo as boas vindas de Assaad à al-Qaeda. Em outro vídeo Assaad conta o dinheiro e o entrega a um do grupo. Obcecado em prolongar a histeria pos-11/9 o governo Bush festejava coisas assim, que prolongavam o estado de medo no país.

E hoje o ex-vice Cheney ainda defende a insanidade das políticas do governo Bush, como se coisas assim, juntamente com as torturas, fossem receita infalível contra o terrorismo.

Blog de Argemiro Ferreira


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