terça-feira, 1 de setembro de 2009

O petróleo vai acabar?

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por Luiz Carlos Azenha

Uma das balelas daqueles que querem entregar o petróleo é de que falta tanto tempo para o pré-sal entrar em produção que não devemos nos preocupar com isso agora. Além disso, procurar petróleo é caro e a Petrobras não tem dinheiro para furar poço em alto mar. E mais: o petróleo é sujo, polui muito e devemos procurar fontes alternativas de energia.

Enquanto isso, no mundo real, a idéia de que o petróleo "acabou" vem sendo crescentemente contestada. Leiam esse artigo, publicado recentemente no New York Times:


"Pico do petróleo" é desperdício de energia


por MICHAEL LYNCH*


Lembram-se do "pico do petróleo"? É a teoria de que a escassez geológica a certa altura tornará inevitável a queda da produção global de petróleo, causando o fim da idade do petróleo e, potencialmente, catástrofe econômica. Bem, justamente quando pensamos que o colapso dos preços do petróleo no verão passado tinha acabado com essa conversa, lá vem Fatih Birol, o economista mais importante da Agência Internacional de Energia, insistir que vamos atingir o pico em algum momento dos próximos 10 anos, uma década antes da maioria das previsões (embora um grupo de pessimistas ardentes acredite que o momento sem volta já tenha acontecido).

Como muitas crenças malthusianas, a teoria do pico do petróleo tem sido promovida por um grupo motivado de cientistas e leigos que baseiam suas conclusões em análises pobres e distorção de material técnico. Mas, como a mídia e figuras proeminentes como James Schlesinger, um ex-secretário de energia, e o explorador T. Boone Pickens levam a sério o "pico do petróleo", o público fica alarmado.

Um exame cuidadoso dos fatos demonstra que a maioria dos argumentos sobre o pico do petróleo é baseado em informação anedótica, referências vagas e ignorância sobre como a indústria do petróleo trabalha para buscar novos campos e extrair petróleo. E isso tem sido demonstrado repetidamente: o fundador da Associação para o Estudo do Pico do Petróleo primeiro disse que ele já tinha sido atingido em 1989 e o sr. Schlesinger argumentava uma década mais cedo que a produção não cresceria muito mais.

O sr. Birol não é o único que se preocupa. Um dos proponentes do pico do petróleo, o escritor Paul Roberts, recentemente expressou choque ao descobrir que o líquido que sai dos campos de Ghawar, na Arábia Saudita, o maior depósito conhecido do mundo, tem 35% de água. Mas isso não é uma preocupação -- o aumento da água é causado pelo fato de que os sauditas bombam água do mar no campo para manter a pressão e tornar a extração mais fácil. A média global para o uso de água nos campos de petróleo é estimada em até 75%.

Outro crítico, um consultor e investidor importante chamado Matthew Simmons, já demonstrou preocupação com a "lógica obscura" de engenheiros de petróleo para fazer as estimativas dos reservatórios. Mas essa lógica obscura é um método que tem sido usado desde quando eu estava no ginásio, em situações nas quais os fatores a serem calculados são incertos e variáveis -- incluem desde a ciência física até relações internacionais -- e esse método tem uma história de dar bons resultados.

Mas estes são apenas os argumentos mais recentes -- na maior parte, a turma do "pico do petróleo" se baseia em três dados: que o mundo está descobrindo apenas um barril para três ou quatro produzidos; que a instabilidade política em países produtores nos coloca diante do risco sem precedentes de ter as torneiras fechadas; e que já usamos metade dos 2 trilhões de barris existentes na terra.

Vamos examinar o argumento sobre as novas descobertas, primeiro: é uma afirmação que reflete ignorância da terminologia da indústria. Quando um novo campo é descoberto, é feita uma estimativa sobre quanto de petróleo poderá ser recuperado dele num dado período. Mas, com a passagem dos anos, as estimativas quase sempre aumentam, ou porque novos bolsões de petróleo são encontrados ou porque novas tecnologias tornam possível extrair petróleo antes inalcançável.

Mas, como os geologistas não tratam do petróleo que passa a ser recuperável como "novas descobertas", os que advogam a teoria do "pico do petróleo" tendem a ignorá-lo. Na verdade, a combinação de novas descobertas e revisões no tamanho das estimativas do petróleo recuperável tem mantido a produção mundial estável há muitos anos.

Um argumento relacionado a esse -- de que o "petróleo fácil" acabou e que a produção só pode se tornar mais difícil e de baixo custo-benefício -- deveria ser reconhecido como vago e irrelevante. Os que buscavam petróleo na Pérsia, há um século, não consideravam seu trabalho fácil e a indústria de hoje, computadorizada e mecanizada, está muito longe das sondas puxadas por mulas da metade do século 19. Centenas de campos que hoje produzem "petróleo fácil" já foram considerados tecnologicamente inalcançáveis no passado.

O mais recente contencioso no debate é a estimativa de que a produção está em declínio nos grandes campos de petróleo do mundo. Isso é atribuído às tecnologias do "supercanudo", que se tornaram dominantes na última década, que podem secar poços mais rapidamente do que nunca.

É verdade, porque uma extração mais rápida causa a queda na pressão e os poços se tornam menos e menos produtivos com a passagem de tempo. Mas esse declínio de alguns poços não significa necessariamente que todos os campos de petróleo estão sendo "limpos". [Um campo de petróleo pode conter dezenas de poços perfurados]. Como os sauditas provaram em anos recentes, no campo de Ghawar [o maior do mundo], investimento adicional -- para achar novos depósitos e furar novos poços -- pode evitar a queda de produção.

Quando essa argumentação frágil em geologia é exposta, os advogados do "pico do petróleo" tendem a argumentar que a instabilidade geopolítica de hoje precisa ser levada em consideração. Mas o risco político não é novo: um sindicalista comunista que trabalhava na indústria do petróleo no início dos 1900 mais tarde seria conhecido pelo mundo como Josef Stalin.

Quando as grandes quedas de oferta de 1973 e 1979 causaram aumento de preço, quase todos os especialistas em petróleo disseram que a causa subjacente era a escassez e que os preços só aumentariam no futuro. As companhias de petróleo diversificaram seus investimentos -- a Mobil até mesmo comprou shopping centers! -- e o presidente Jimmy Carter impulsionou a produção de combustíveis sintéticos, argumentando que os mercados eram muito míopes para se dar conta da necessidade iminente de substitutos. Todo tipo de especialista, consultor de energia e economista ganhador do Nobel pulou nesse bonde para explicar que os preços do petróleo só iriam subir -- ainda que isso nunca tivesse acontecido antes. Os preços, por sua vez, começaram a cair incessantemente pelas duas décadas seguintes.

Assim como nos anos 70 foi o embargo de petróleo dos árabes e a Revolução no Irã, hoje é a invasão do Iraque e a instabilidade na Venezuela e na Nigéria. Mas a solução, como sempre, é a indústria mudar seus investimentos para novas regiões, e é isso o que vai acontecer. Ainda assim, os advogados do "pico do petróleo" usam esse período que precede nova produção para argumentar que a produção global de petróleo está em declínio irreversível.

No fim, talvez a mais enganosa argumentação dos defensores da teoria do "pico do petróleo" é de que a terra tem apenas 2 trilhões de barris "recuperáveis". Na verdade, o consenso entre geologistas é de que existem 10 trilhões de barris por aí. Uma século atrás, só 10% eram considerados recuperáveis, mas a melhoria da tecnologia pode fazer com que 35% o sejam -- outros 2,5 trilhões de barris -- de uma forma economicamente viável. E isso nem considera o potencial das areias betuminosas, que em algum tempo talvez possamos explorar de forma eficiente.

O petróleo continua abundante e o preço deverá ficar mais próximo de seu valor histórico de 30 dólares o barril com a chegada de novos suprimentos das águas profundas da África Ocidental e da América Latina, da África Oriental e talvez dos campos de Bakken em Montana e Dakota do Norte. Mas isso não deve evitar que os políticos de Washington sejam convencidos de que o petróleo, sendo finito, ficará cada vez mais caro. (Essa é a lógica que levou o governo Carter a criar a Corporação de Combustíveis Sintéticos, uma empresa de 3 bilhões de dólares que nunca produziu um litro sequer de combustível utilizável).

Isso não significa que não devamos buscar outras fontes de energia eficientes e não poluidoras -- por que não aumentar as opções? Mas não podemos deixar que a falsa ameaça do desparecimento do petróleo faça com que o governo jogue dinheiro fora em esquemas de energia renovável ou que imponha medidas de conservação caras em um público que já enfrenta tempos econômicos difíceis.

*Michael Lynch é ex-diretor para a Ásia do Center for International Studies do Massachusetts Institute of Technology e é consultor de energia.

Nota do Viomundo: O jornal não diz se ele ganha dinheiro de alguma petroleira.

Fonte: Vi o Mundo

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