por Leonardo Sakamoto
Toda vez que bater o ponto, o trabalhador terá de receber um comprovante impresso com o horário em que iniciou ou encerrou a sua jornada de trabalho. A mudança faz parte da regulamentação definida pelo governo federal para o ponto eletrônico, aquela maquininha que registra quando alguém entra e sai de mais um dia de trabalho, e está no cotidiano de milhares de empresas e de milhões de empregados.
Aqui na Repórter Brasil, Maurício Hashizume e Bianca Pyl se debruçaram por um longo tempo sobre os problemas relacionados ao ponto eletrônico – que muita gente achava a salvo de fraudes. Mas saiba que você, que bate seu cartãozinho todo santo dia, pode estar sendo enganado por ele. Em muitos casos, tempo de trabalho tem sido comido pelo patrão, que regula a máquina para que ela registre menos do que o trabalhado. E, até agora, quem já tinha percebido isso não conseguia comprovar.
O Ministério do Trabalho e Emprego e o Ministério Público do Trabalho recebeu muitas denúncias relacionadas a fraudes nos sistemas de ponto eletrônico utilizados por grandes empresas como magazines varejistas e redes de supermercados. São denúncias formuladas por trabalhadores e sindicatos, que revelam fraudes, em especial com a finalidade de reduzir as horas extras.
Foram encontrados programas de controle de ponto eletrônico que permitem que o empregador, por meio de senhas, tenha acesso posterior às marcações dos empregados e possa - inclusive - alterar horários de entrada e de saída, além dos intervalos para repouso e alimentação. Ou seja, depois que você bateu o cartão, alguém vai lá e diminui o seu tempo de trabalho.
Outros sistemas propiciam ao empregador configurar o sistema para a marcação de ponto somente em horários pré-determinados. Com isso, o empregado fica impedido de registrar o horário real de entrada e saída. “É possível desbloquear o sistema ao teclar determinada letra do teclado, o que é feito geralmente quando da chegada de fiscais na empresa para realizar ação fiscal”, explica o auditor fiscal do trabalho José Tadeu de Medeiros Lima.
Alguns fabricantes desenvolvem sistemas que geram batidas automáticas, mesmo sem que o ponto seja batido. Esses sistemas fazem a marcação automática do horário com minutos a mais ou a menos (17h04 e 16h58, para jornadas que terminam às 17h, por exemplo), de forma aleatória, para parecer mais “real” e não configurar o chamado “ponto britânico”.
Uma rede de supermercado confessou a um juiz no Rio Grande do Norte que alterava “para o bem” as marcações. Há! Faz-me rir.
A nova regulamentação divulgada pelo Ministério do Trabalho e Emprego impõe regras a empresas especializadas na maquininha. Antes da portaria, várias faziam anúncios das “vantagens” sem nenhum constrangimento. Uma das fabricantes enumerava perguntas para demonstrar os benefícios do produto: “O funcionário pode contestar a marcação do ponto? Não, uma vez que o funcionário assinou o espelho do cartão não mais poderá contestar a validade de suas marcações”, prometia. “É possível alterar a marcação feita pelo funcionário? Sim, é possível. Existe uma função destinada ao administrador do ponto que através de uma senha faz as correções e abonos necessários em todas as marcações efetuadas por seus funcionários”.
Outra destacava a marcação de ponto somente em horários pré-determinados como um ponto forte do seu produto e tinha até manual de como fazer as alterações. “Basta ter a senha de acesso para adicionar ou modificar horário e até excluir marcações”. Havia fabricantes que preferiam recorrer à questão das ações trabalhistas para chamar atenção no mercado. “Custa menos que uma ação trabalhista, geralmente movida pela falta de controle efetivo de seu funcionário. O sistema permite o desconto de horas extras de forma total ou parcial”, advertia a empresa, sem receio de punições.
O universo de afetados pela portaria do MTE, apesar de impreciso, é imenso. “Em uma investigação preliminar, sem instauração de procedimento, mas apenas para verificar a abrangência desta lesão trabalhista, foram verificados 26 programas atualmente comercializados no Brasil. Cada um desses programas possui mais de cinco mil usuários, isto é, mais de cinco mil empresas compradoras. Não é possível mensurar exatamente esse número. Mas considerando que são milhares de empresas com milhares de empregados, imaginamos que esse universo seja muito grande”, acrescenta o procurador Geraldo Emediato de Souza, do Ministério Público do Trabalho (MPT) de Minas Gerais.
Fonte: Blog do Sakamoto
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