segunda-feira, 14 de setembro de 2009

2010 - O Congresso quer domar a quimera

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O Parlamento tenta regular o debate e a propaganda eleitoral na internet.


2010 - O Congresso quer domar a quimera

Por Gilberto Nascimento - na Carta Capital

Incapazes e desinteressados em discutir uma reforma política ampla e eficiente, o Congresso Nacional optou por se dedicar a uma tarefa quase impossível: regulamentar a propaganda e o debate eleitoral na internet. Não fosse a inútil tentativa de fiscalizar um conteúdo que pode ser postado em qualquer parte do mundo, os parlamentares ainda esbarrariam em outro problema.

Faz sentido engessar uma mídia que não é estabelecida por concessão pública?

O deputado federal Flávio Dino (PCdoB-MA) acha necessário impor regras. “Estão tratando essa mídia como se fosse algo extraterrestre”, critica o parlamentar, relator da proposta na Câmara. Para o senador paulista Aloizio Mercadante, líder do PT no Senado, é perda de tempo buscar algum tipo de controle. “Não há como controlar o incontrolável. Essas medidas não vão ter eficiência alguma e só vão causar desgaste ao Senado”, avalia. “A internet é o que foi a praça pública na Grécia antiga. O político que tem medo de ouvir crítica na rede é igual ao guarda noturno que tem medo de trabalhar à noite. Tem de mudar de atividade”, diz o petista.

O deputado Dino ressalta que a intenção da Câmara e do Senado foi regulamentar a atuação apenas das empresas comerciais na internet durante as campanhas eleitorais a fim de impedir o abuso do poder econômico. “Isso ocorreu em razão do princípio de uma certa igualdade durante os 90 dias da campanha eleitoral, para que as minorias possam se manifestar”, afirma o parlamentar.

O deputado defendeu a criação de normas para que os candidatos com maior poder aquisitivo não passem a adquirir espaços na internet, de forma indiscriminada, e levem grande vantagem sobre os demais concorrentes. A regra da igualdade e proporcionalidade, esclarece, valerá para os debates eleitorais em portais das grandes empresas de comunicação.

Serão proibidos nesses portais os eventuais abusos e condutas que possam ser caracterizadas como campanha política em favor de um candidato, como já ocorre nos demais veículos. Em discussões de propostas políticas, será assegurada a participação de um número determinado de concorrentes. Quem fizer propaganda de candidato, partido político ou coligação ou der tratamento privilegiado a concorrentes nesses sites comerciais (“sem motivo jornalístico que justifique”), pagará multa de 5 mil reais a 30 mil reais.

Nenhum blogueiro ou articulista político será impedido de manifestar a sua opinião ou de entrevistar um candidato em sites e blogs, inclusive os hospedados em portais comerciais. “O texto diz claramente que os blogs, os sites de relacionamento (como o Orkut) e de mensagens instantâneas (como o twitter) vão poder expressar claramente sua opinião”, reforça Dino. “Essa questão foi flexibilizada no texto no Senado”, explica Mercadante.

A proposta proíbe, porém, o anonimato nos blogs e na rede social e garante o direito de resposta a quem se sentir prejudicado. Propaganda paga em sites poderá existir, mas somente para os concorrentes à Presidência da República. Os demais candidatos terão de se contentar com a divulgação de suas idéias políticas em seus próprios blogs, sites e comunidades. Todos deverão ser registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

A minirreforma acabou por criar brechas para o contrabando de medidas e propostas. Na noite da quarta-feira 9, foi aprovada uma emenda do senador Marcelo Crivella (PRB-RJ) que obriga os institutos de pesquisa a utilizarem em seus levantamentos de voto os dados socioeconômicos, como sexo, grau de instrução e nível econômico, baseados nas informações oficiais do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

Segundo Márcia Cavallari, diretora de planejamento do Ibope Inteligência, essa exigência pode atrapalhar muito mais do que ajudar e, inclusive, aumentar a margem de erro. “O último Censo foi em 2000. Como vamos usar esses dados defasados? Podem até recomendar o uso dos dados do IBGE, mas não ser uma exigência única e exclusiva”, afirma.

A discussão sobre o uso da internet já havia sido realizada na Câmara dos Deputados. No início do mês, essas propostas foram aprovadas por unanimidade em uma sessão conjunta das comissões de Constituição e Justiça (CCJ) e de Ciência e Tecnologia do Senado. A Câmara negociou um texto com os dois relatores da proposta no Senado, Eduardo Azeredo (PSDB-MG) e Marco Maciel (DEM-PE) e, a partir daí, foi fechado um acordo entre as duas Casas.

Essa costura não seduziu o conjunto dos senadores. Boa parte defende a liberação total da internet. Estão incluídos aí Mercadante e a maioria dos senadores petistas, o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), o líder do governo, Romero Jucá (PMDB-RR), o líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM), e a provável candidata à presidência pelo PV, Marina Silva (AC).

Mercadante, Jucá e o senador Álvaro Dias (PSDB-PR) apresentaram emendas para derrubar as restrições. “Há outra questão: o maior problema na internet não está nos portais comerciais. A questão mais séria é a calúnia, a difamação. E quem quiser fazer isso pode utilizar site instalado no Exterior”, afirma Mercadante. Sarney também se mostrou descrente quanto a qualquer tentativa de controle. “Acho que nem devem ser estabelecidas normas nesse sentido porque não vai ter nenhuma condição de fiscalização”, sentencia.

Após a votação final no Senado – prevista para terça-feira 15 – a proposta terá de voltar à Câmara, antes de seguir à sanção presidencial. Para entrar em vigor na próxima eleição, a regulamentação terá de ser publicada no Diário Oficial da União até 3 de outubro.

Fonte: Carta Capital

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